Qualquer viajante que sobrevoe a Sibéria de helicóptero verá de vez em quando clarões cor-de-laranja na imensa planície branca: é o gás que sai junto com o petróleo cru e que simplesmente é queimado. Esse mesmo viajante, ao hospedar-se em Moscou no inverno, poderá descobrir que em seu quarto faz um calor infernal e será obrigado a abrir as janelas, já que a maioria dos aquecedores não é regulável.
Essas imagens ilustram o principal problema que a Rússia enfrenta: a falta de economia e eficiência na hora de consumir energia, que é aguçada pelo aquecimento que estão experimentando algumas regiões do país. As chamas vistas do ar e as janelas abertas são as expressões por excelência do desperdício, que é a atitude russa diante do consumo de energia.
Sendo assim, não é de estranhar que o potencial de economia energética nesse país seja enorme, afirma Igor Podgorni, do Greenpeace Rússia. Das 900 toneladas de combustível convencional consumidas anualmente, se desperdiçam entre 360 e 430 toneladas. Traduzido em petróleo, são cerca de 250 milhões de toneladas, cifra equivalente às exportações de petróleo cru da Rússia.
Os progressos para um consumo eficiente são mínimos: há apenas três anos se permitiu que as pessoas ponham medidores de água em seus apartamentos, mas os medidores de calefação são inexistentes. O uso de combustíveis é culpado por 81% das emissões de gases do efeito estufa na Rússia. "Só melhorando a eficácia no uso da energia poderíamos diminuir quase pela metade essas emissões. Infelizmente, isso não acontece", lamenta Podgorni.
Uma das coisas que explica a atitude russa e a passividade das autoridades é que até agora a Rússia não chega nem à metade das emissões de 1990. Isto, somado ao fato de que até maio deste ano não existia legislação sobre os mecanismos para utilizar as possibilidades que dá o Protocolo de Kyoto, se traduziu em uma falta de incentivos para diminuir o volume de emissões.
Hoje a Rússia emite 1,5 bilhão de toneladas de CO2, o que a situa em terceiro lugar no mundo, atrás dos EUA e da China. E se as emissões per capita da Rússia são comparáveis às de outros países desenvolvidos, não acontece assim por unidade de PIB. "Aqui esse índice é de 1,2, enquanto nos países desenvolvidos não supera 0,5, isto é, nós gastamos entre 2,5 e três vezes mais energia para produzir uma unidade de PIB. Produzimos menos que eles, mas emitimos mais", explica Podgorni.
A Rússia olha para o futuro de maneira equivocada, segundo o Greenpeace. "Infelizmente, nos planos governamentais se dá importância primordial às centrais de carvão, o principal poluente; e também se insiste nas grandes usinas hidrelétricas e na energia atômica, com todos os riscos que esta representa."
Enquanto isso, a energia renovável é subestimada. Ainda não há leis a respeito, por isso ninguém embarcará em um grande projeto para utilizar a energia eólica ou solar, já que não há lei que obrigue a incluir a eletricidade assim gerada nas redes de distribuição.
Outro fator que contribui para não dar a devida importância às emissões de gases do efeito estufa é a opinião, difundida inclusive no mais alto nível político, de que o aquecimento beneficiará a Rússia. Até o presidente Vladimir Putin disse que "se a temperatura subir 2 ou 3 graus nada terrível acontecerá; ao contrário, talvez seja bom: gastaremos menos em casacos de pele". Por sua parte, Konstantin Pulikovski, chefe do Serviço Federal de Controle Ecológico, Tecnológico e Nuclear, declarou em maio que nos próximos cem anos não vê qualquer ameaça para a Rússia causada pela mudança climática.
(Por Rodrigo Fernández, El País, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves,
UOL, 19/12/2007)