O chefe da Agência Internacional de Energia (AIE), Nobuo Tanaka, pediu que os chefes de Estado ajam com mais ousadia para conter as emissões de CO2. A economia de energia por si só poderia gerar um terço das reduções de CO2 necessárias, ele disse a SPIEGEL.
Spiegel - Senhor Tanaka, o senhor não participou diretamente das negociações na conferência sobre o clima mundial em Bali...Nobuo Tanaka - Felizmente não. As discussões sobre as vírgulas deixaram muitos negociadores com esgotamento nervoso.
Spiegel - Mas o senhor apresentou aos ministros e delegados as conclusões de seus especialistas em energia. O que aconteceria se Bali não levar a um novo acordo efetivo de proteção climática até 2009?Tanaka - Se tudo continuar como está, a raça humana produzirá cerca de 42 bilhões de toneladas de CO2 por ano em 2030, em vez das atuais 27 bilhões -liderada pela China, com 11 bilhões de toneladas. A longo prazo enfrentaríamos um aumento de temperaturas de até 6 graus, com tudo o que isso representa. Chamamos esse cenário de "a mesma coisa de sempre". A Índia e a China, em particular, construiriam centenas de usinas de energia ineficazes, movidas a carvão, que ficariam em operação por 50 ou 60 anos. Mas esse é um cenário que não deve se tornar realidade.
Spiegel - O que o senhor propõe?Tanaka - Inicialmente, economia, economia, economia. Se os aparelhos elétricos como os refrigeradores e ar-condicionados da China funcionassem com a mesma eficácia que nos países ocidentais hoje, o país já poderia dispensar duas usinas elétricas do tamanho da barragem das Três Gargantas. Eles poderiam em vez disso aplicar o dinheiro em educação e pesquisa científica. Também há medidas muito eficazes que poderiam ser tomadas imediatamente. A simples proibição das lâmpadas elétricas que desperdiçam energia poderia poupar cerca de 500 milhões de toneladas de CO2 por ano em todo o mundo.
Spiegel - E isso é suficiente?Tanaka - Não, mas cerca de um terço das reduções necessárias podem ser alcançadas através da eficiência. Para estabilizar a concentração de dióxido de carbono na atmosfera em um nível aceitável, novas usinas de energia de baixa emissão com enormes capacidades devem entrar na rede elétrica a cada ano. E as antigas usinas de alta emissão de CO2 devem ser fechadas em ritmo acelerado.
Spiegel - Como essa mudança pode ser alcançada?Tanaka - Para conseguirmos avançar para tecnologias mais eficientes, deve-se colocar um preço nas emissões de CO2 em todo o mundo. E isso pode ser feito com um imposto sobre energia, negociando direitos de poluição ou outras medidas, mas sem um preço para as emissões as novas tecnologias não vão prevalecer em nenhum lugar. A separação e o armazenamento de CO2 das usinas só se tornarão econômicos se o preço de uma tonelada de emissões de CO2 for ao redor de US$ 50.
Spiegel - Mas mesmo em países ricos como a Alemanha os consumidores já pagam altos preços pela energia. Como novos aumentos podem ser impostos politicamente?Tanaka - Os políticos precisam de muita coragem para fazer isso. Eles têm de deixar claro para suas populações que essa é a maneira mais barata em médio e longo prazo e que ajuda a promover o crescimento econômico. É um risco para os políticos, mas ninguém pode fazer o trabalho por eles.
Spiegel - Há necessidade de pesquisas para encontrar tecnologias energéticas mais eficientes. Os cientistas têm dinheiro suficiente para isso?Tanaka - Os gastos em pesquisa energética aumentaram acentuadamente depois da crise do petróleo na década de 1970, chegando a US$ 18 bilhões por ano. Mas durante quase 20 anos os governos e as empresas investiram pouco mais da metade dessa quantia. Ainda não se entendeu a mensagem de que a pesquisa recompensa -especialmente quando os preços do petróleo tiverem subido permanentemente para mais de US$ 100 o barril, como acontecerá até 2030.
Spiegel - Em Bali, a Alemanha apresentou a idéia de definir uma meta de emissão de CO2 de não mais que 2 toneladas por ser humano a partir de 2050. Isso é cerca de o dobro do volume que um habitante da Índia produz hoje em média, mas para um alemão significaria uma redução de 80%. O que o senhor acha desse conceito?
Tanaka - É dinâmico e dramático ao mesmo tempo. Não é função da AIE emitir um julgamento a respeito, mas pessoalmente acho muito convincente que todo ser humano deva ter o mesmo direito de produzir CO2 e que o limite máximo seja definido por um consenso entre pesquisadores climáticos. Estou curioso para ver como a chanceler Angela Merkel vai convencer os grandes poluidores a apoiá-la.
Spiegel - Que argumentos ela poderia usar para convencer os chineses, por exemplo?Tanaka - Os chineses precisam perceber que só podem crescer se adotarem um caminho diferente do dos EUA. O alto nível de poluição atual e a baixa eficiência impõem limites rígidos ao crescimento econômico. Mas a China está no início de seu desenvolvimento, e portanto tem uma enorme oportunidade de desenvolver um novo modo de vida mais sustentável, um modelo de crescimento verde. Eletrônica de alta eficiência, transporte limpo, prédios eficientes em energia, megacidades ambientalmente amigáveis -se os chineses mostrarem aos americanos como fazer isso e se tornarem mais ecológicos que os EUA, terão uma vantagem competitiva incrivelmente forte. Talvez um empurrão de Merkel os acorde.
(Por Christian Schwägerl, Der Spiegel, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves,
UOL, 18/12/2007)