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amazônia imprensa e meio ambiente
2007-12-17
O Estado de S. Paulo encartou na sua última edição dominical de novembro uma caprichada revista, "Grandes Reportagens", com 124 páginas dedicadas à Amazônia. Deve ter sido o mais caro empreendimento editorial do jornal paulista nos últimos anos, em papel especial, com muitas cores, mobilizando alentada equipe de repórteres, com recursos para viagens ao interior da região.

O olho de uma coruja em close serviu de modelo para a foto no fundo da capa, com o título pretendendo o mesmo impacto: "Amazônia - Ainda é possível salvar?" E a chamada, logo abaixo, mandan uma mensagem: "Percorremos a floresta para revelar as tragédias e conhecer as experiências que poderão preservar a mais rica biodiversidade do planeta".

A edição constata os graves problemas amazônicos, mas aposta que eles já começam a ser enfrentados e logo poderão ser resolvidos, se houver investimentos em novos projetos, como os que apostam no desenvolvimento sustentável. Foi o bastante para mensagens de euforia e louvor circularem pela rede de computadores, principalmente entre os ambientalistas, aparentemente surpreendidos pela boa iniciativa do tradicional diário da capital paulista.

Um leitor mais atento e exigente observaria, de imediato, um esmagador desequilíbrio da edição em favor do Estado do Amazonas. Na mais caridosa das estimativas, o Amazonas ficou com 95% do espaço da revista do Estadão. Nada é capaz de abonar essa proporção. O Amazonas é a maior unidade federativa brasileira, mas o Pará é apenas 20% menor territorialmente.

A Zona Franca de Manaus responde pela maior geração de renda da Amazônia, mas causa um déficit cambial de mais de 3 bilhões de dólares, que o Pará compensa, com sobras, graças aos seus US$ 4,4 bilhões de superávit no seu comércio exterior, o terceiro maior do país (proporcionado por um Estado que é o sexto maior exportador nacional), 85% dele composto por minérios e derivados, maciçamente produzidos pela Companhia Vale do Rio Doce. O Pará tem mais do dobro da população do Amazonas, menos de um quarto dela concentrada na capital, enquanto Manaus absorve a metade dos habitantes amazonenses e 95% do PIB estadual (contra 30% de Belém).

Estes são apenas alguns dos muitos indicadores que imporiam a uma edição criteriosa sobre a Amazônia, que se propõe um diagnóstico e prognóstico geral sobre a região, não centralizar tão desproporcionalmente o enfoque no Amazonas, criando com isso uma irremediável distorção de abordagem.

Mas a razão desse absurdo logo se apresentou: enquanto o Estadão lançava sua revista, o Bradesco, o maior banco privado brasileiro, assinava em São Paulo, com o governo do Amazonas, um termo de criação da Fundação Amazonas Sustentável. A instituição terá sua sede em Manaus, mas com um escritório em São Paulo. Seu presidente é o ex-ministro de Desenvolvimento do governo Lula, o paulista Luiz Fernando Furlan.

O principal objetivo imediato da fundação é preservar uma área de 17 milhões de hectares no Amazonas, que serviria de modelo de sustentabilidade. Seu capital inicial será de R$ 40 milhões, que Bradesco e governo amazonense subscreverão, em partes iguais, durante os próximos cinco anos. Mas a fundação contará com muito mais recursos porque o Bradesco, que será o gestor desses fundos, investirá nos "negócios ambientais", incluindo o mercado de carbono e o lançamento de produtos "ecologicamente corretos" com a marca da fundação.

O Bradesco, não por mera coincidência, veiculou seu anúncio do "Banco do Planeta" em cinco páginas da revista do Estadão, incluindo as contracapas, que são das mais caras. Foi o maior anunciante da edição, que, também não por acaso, praticamente se restringiu ao abençoado Amazonas do governador Eduardo Braga. Com essa tacada, ele mostrou algumas de suas armas para fazer de Manaus uma das sedes da Copa do Mundo de Futebol, que será realizada em 2014 no Brasil. E muito mais.

Já o Estadão, contrariando uma regra de ouro da "casa" em anos passados, deixou de alertar ao prezado leitor que a Amazônia da sua edição foi desfigurada pelo vírus do comercialismo, contra o qual, antanho, possuía anticorpos invejáveis.

(Por Lúcio Flávio Pinto *, Adital, 14/12/2007)
* Jornalista


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