A maioria das famílias que até o último dia 11 viviam em barracos erguidos à beira da Marginal Pinheiros, na favela Real Parque, zona sul da cidade de São Paulo, continua no local. Agora, sob acomodações itinerantes.
"Tem gente dormindo na rua ou em garagens [das casas de alvenaria, na própria favela] e alguns ficam um dia na casa de um, outro dia na casa de outro”, contou uma das líderes da comunidade Karina Santos da Silva, do Grupo Favela Atitude.
Na última terça-feira (12/12), a Polícia Militar de São Paulo despejou os moradores, em uma ação para recuperar o terreno de propriedade da Empresa Metropolitana de Águas e Energia (Emae), do governo do estado.
Os moradores protestaram e chegaram a fechar a avenida, o que provocou um congestionamento de cerca de 30 quilômetros na avenida.
Por meio de nota, a Emae informou que recebeu, no último dia 13, uma comissão de representantes dos moradores. E que foi encaminhado para análise da diretoria da empresa a solicitação deles de suspender a liminar de reintegração de posse “até que se encontre uma solução de moradia para as famílias”.
“A Emae vem adotando todos os cuidados para que a reintegração de posse ocorra de forma mais humana possível”, diz o comunicado.
A empresa informa que os moradores recebem apoio de assistentes sociais da prefeitura e orientação do Conselho Tutelar. Além de providências para alojar e dar alimentação às famílias, conforme a nota, a empresa está fornecendo bilhetes aos moradores para suas cidade de origem.
Segundo a líder comunitária, apenas 30 das 70 famílias aceitaram ficar por 30 dias nos hotéis oferecidos e pagos pela prefeitura após a reintegração de posse.
A mãe de Karina, uma senhora de corpo franzino, natural de Sergipe, disse que não concordou em ir para o hotel porque iria ficar longe da favela, onde trabalha vendendo cafezinho nas ruas.
A líder comunitária disse, ainda, que o processo de retirada dos moradores não atingiu os 17 mil metros quadrados do terreno reivindicado judicialmente. De acordo com ela, uma nova ação pode acontecer na próxima sexta-feira (21/12).
O clima entre os moradores, acrescenta Karina, é de apreensão. “Desde o dia que a polícia chegou de surpresa para colocar o pessoal para fora tem sido constante a vinda de viaturas e batidas na favela”, disse, classificando a ação de "uma forma de intimidação".
Ela calcula que na área vivem cerca de 5 mil pessoas. No local, existem pequenas casas de comércio e até um ginásio de esportes.
A favela está localizada em uma área nobre da cidade. Do outro lado da marginal Pinheiros, destacam-se os modernos e luxuosos prédios comerciais, localizados na avenida Luiz Berrini.
Segundo Karina, bem antes os edifícios existirem, nasceu o núcleo de moradias da favela. Ela afirmou que no Plano Diretor da cidade, a comunidade está em área da Zona Especial de Interesse Social (ZEIS-1) e que o fato de ser ocupação antiga lhes confere o direito de usucapião. Hoje durante o dia estava sendo feita a terraplenagem no lugar onde ficavam os barracos. Alguns objetos das famílias se espalhavam em meio à terra, como sofás, pedaços de cadeira e cacos de telhado de amianto.
Maria Auxiliadora Santana - empregada doméstica, 51 anos de idade e há dois na favela - apontou para o ponto mais baixo do terreno em declive.
“Lá ficava o meu barraco. Logo depois das seis da manhã, os policiais chegaram sem que a gente soubesse de nada. Nem adiantou pedir para que não destruíssem o cadeado do vizinho. Eu falei que ele [o vizinho] tinha acabo de sair para trabalhar”, disse Auxiliadora, que está morando na casa de sua irmã no conjunto de prédios do Cingapura, erguidos na gestão do então prefeito Paulo Maluf.
(Por Marli Moreira, Agência Brasil, 15/12/2007)