Em uma reviravolta inesperada na reunião sobre mudança climática das Nações Unidas (ONU) em Bali, neste sábado (15/12), os EUA aceitaram as objeções da China e da Índia, que pediram "mais ação" dos países desenvolvidos no combate ao aquecimento global. A objeção sobre a introdução da decisão de Bali - baseada na percepção de que havia uma discrepância entre os fortes compromissos exigidos dos países em desenvolvimento e uma linguagem menos específica sobre as obrigações dos países industrializados - levou a um intervalo na plenária. O acordo marca o início de dois anos de negociações por um tratado climático global que substitua o Protocolo de Kyoto, que expira em 2012 - e do qual os EUA não participam, por discordarem das metas de redução de emissões para países ricos.
O encontro, que começou no dia 3 e terminou formalmente na sexta-feira (13/12), foi marcado por atritos entre os EUA, que se opunham a menções a metas específicas nesta etapa, e a União Européia, que defendia que se estabelecesse a proposta de redução de até 40% nas emissões até 2020. O ministro alemão do Meio Ambiente, Sigmar Gabriel, disse que o preâmbulo ao texto final deve conter uma referência às conclusões deste ano do Painel Intergovernamental da ONU sobre a Mudança Climática, segundo o qual os países ricos deveriam reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em 25-40% até 2020. Tanto Gabriel quanto o chefe da delegação dos EUA, Harlan Watson, afirmaram que seriam capazes de "conviver" com essa versão do texto.
A reunião ministerial encarregada de concluir o texto do encontro terminou na madrugada de sábado. O ndocumento final será levado à votação dos 189 países participantes numa sessão marcada para o final da manhã (15/12).
Os países em desenvolvimento disseram que vão resistir "à pressão e até às ameaças" de alguns países ricos para intensificarem seus esforços contra o aquecimento. O chamado G77, principal grupo de países em desenvolvimento, disse que seus membros não estão preparados para reduzir as emissões resultantes da queima de combustíveis fósseis, pois isso pode ter consequências para o crescimento econômico e o combate à pobreza.
- Estamos simplesmente muito desapontados a esta altura. [O texto final] é tão aguado que poderíamos tê-lo feito por email
- As pessoas estão negociando, estão fazendo pose, não estão se erguendo acima das posições nacionais entrincheiradas. Estamos simplesmente muito desapontados a esta altura. Estamos terminando com algo tão aguado que não havia necessidade de 12 mil pessoas se reunirem em Bali. Poderíamos ter feito isso por email - disse Angus Friday, embaixador de Granada na ONU e presidente da Aliança dos Pequenos Estados Insulares.
Fique por dentros dos principais avanços e lacunas do encontro de Bali
Dois anos de diálogo
Negociadores concordaram em iniciar dois anos de negociações para o novo acordo que vai suceder o Protocolo de Kyoto, o principal tratado para o combate às mudanças climáticas até 2012. O novo acordo vai incluir países como os Estados Unidos, China e Índia. As negociações vão começar com um encontro em abril de 2008 e terminar com a adoção de um novo tratado em Copenhage no fim de 2009.
Ambição para combater mudanças climáticas
Não era esperado que o encontro de Bali definisse metas de emissão de gases de efeito estufa, mas as conversações marcaram a intenção global de "profundos cortes em emissões globais" para evitar mudanças climáticas perigosas. O texto final faz distinção entre países ricos e pobres, pedindo que nações desenvolvidas considerem cortes de emissão "quantificados" e países em desenvolvimento "ações de mitigação".
Fundo de adaptação
O encontro de Bali concordou em lançar um fundo da ONU para ajudar nações pobres a lidar com os efeitos de mudanças climáticas como secas ou enchentes. O Fundo de Adaptação tem no momento apenas US$ 36 milhões, mas deve crescer para entre US$ 1 a 5 bilhões por ano até 2030, se os investimentos em tecnologias verdes em nações desenvolvidas crescerem. O acordo, permitindo que o fundo comece em 2008, eliminou os entraves de administração ao dividir a responsabilidade entre a Global Environment Facitity, que financia projetos de energia limpa, e o Banco Mundial. O fundo terá 16 membros com forte representação das nações em desenvolvimento.
Preservação de florestas tropicais
Um esquema pague-e-preserve conhecido por reduzir emissão advindas do desmatamento em países em desenvolvimento (REDD) quer permitir a venda por nações pobres de créditos de gás carbônico para países ricos a partir de 2013, em retorno por não destruir suas florestas. As nações reconheceram a necessidade urgente de ações para a redução das emissões de gás carbônico e metano das florestas tropicais. O esboço da decisão encoraja as partes a promover projetos-piloto contra as principais causas do desflorestamento.
Captura e armazenamento de gás carbônico
O encontro adiou até o próximo ano as considerações sobre um plano para financiar uma tecnologia ainda sem testes que captura e enterra o dióxido de carbono, emitido por usinas de energia que queimam combustíveis fósseis. Alguns países querem capturar e armazenar para se qualificar para crédito de carbono.
HFCs
Bali falhou em chegar a um acordo sobre a permissão às companhias para a venda de créditos de carbono da destruição de novas produções de poderosos gases de efeito estufa chamados de hirdrofluorcarbonetos (HFCs).
Transferência de tecnologia
O esboço final pede mais recursos financeiros e investimentos para países em desenvolvimento na adaptação, mitigação e cooperação tecnológica, especialmente para os mais vulneráveis. A transferência de tecnologia é uma exigência chave das nações em desenvolvimento. Elas afirmam que não devem ter que sacrificar crescimento para combater o aquecimento global, mas não podem arcar com os custos de tecnologias limpas que permitiriam a expansão da economia associada à redução das emissões.
(Por Globo online, 15/12/2007)