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crueldade com animais
2007-12-15

Qualquer pessoa que já tenha tomado um remédio sintético ou passado por uma cirurgia do coração, por exemplo, indiretamente se beneficiou do uso de cobaias. Por essa razão, para cientistas da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a polêmica jurídica sobre o uso de animais em pesquisa parte de premissa errada. Não é possível deixar de usá-los: o que importa é discutir como fazer isso dentro de uma conduta ética.

A reportagem da Folha esteve nesta semana no Cedeme (Centro de Desenvolvimento de Modelos Experimentais para Biologia e Medicina), o antigo biotério central da Unifesp, uma das referências nacionais na produção de cobaias.

Só neste ano foram produzidos no local 27 mil camundongos e 14 mil ratos. Estes animais respondem por aproximadamente 90% da demanda da instituição. Os outros 10% são formados por porquinhos-da-índia, coelhos, rãs e cães.

Em todos os cinco níveis do edifício Professor Aron Jurkiewicz (homenagem ao primeiro diretor do centro) as prateleiras estão repletas de animais. As salas são climatizadas --a temperatura não pode passar dos 24C e a umidade do ar dos 55%. A ração é totalmente esterilizada e a água, purificada.

"Aqui tudo é para os animais, depois para os seres humanos", afirma Débora de Oliveira Rosa. A médica veterinária é coordenadora de produção animal do Cedeme. Ela conta que apenas quatro pessoas são autorizadas a atravessar as barreiras de proteção microbiológica existentes no prédio para cuidar dos animais.

Isso é feito todos os dias, com rigor, conta Rosa, que fala com brilho nos olhos do trabalho feito ali.

Ao todo, 47 modelos diferentes de roedores, entre ratos e camundongos, são preparados no centro. Dali seguem para laboratórios da própria instituição ou de outros centros de pesquisa animais obesos, diabéticos e assim por diante. Eles são preparados a partir de modificações genéticas feitas pelos cientistas. Depois de pronto, o modelo é replicado, por meio de cruzamentos normais, no próprio centro, que fica na Vila Mariana, em São Paulo.

"Todo pesquisador tem que ter em mente que o uso do animal não é um direito, é um privilégio", diz João Bosco Pesquero, diretor geral do Cedeme. Várias medidas, explica o químico, foram feitas nos últimos anos, dentro da Unifesp, para tentar aprimorar o uso ético dos animais nos laboratórios da universidade. "Esse uso é imprescindível."

Uma medida que surtiu efeito, por exemplo, é a cobrança pelo uso do animal, informa Pesquero. Hoje, cada pesquisador precisa pagar R$ 3 por um camundongo e R$ 5 por um rato. Segundo o pesquisador, nos últimos cinco anos, os pedidos para o uso dos animais do Cedeme caiu 50%. "A cobrança ajudou a coibir o desperdício", afirma Pesquero.

Conselho de ética

Dentro da Unifesp nenhum animal sai do viveiro de animais sem que o conselho aprove, explica Miriam Ghiraldini, coordenadora de Ensino e membro do Conselho de Ética da universidade. "Temos reuniões semanais. Somos um grupo de 42 pessoas, temos representantes da sociedade civil, inclusive um padre", explica.

Apesar de todo o esforço para que se crie um cultura ética no uso de animais, o que não é algo trivial, ela mesmo reconhece, ainda existe muito por fazer.

"É verdade que o uso de animais nas salas de aula [algo diferente de levar os animais para testes no laboratório] pode ser bastante reduzido." Hoje, pelo menos neste caso, pode-se usar desde programas de computador até manequins, no caso das aulas de anatomia de vertebrados, segundo Ghiraldini.

"Aqui na Unifesp, sem esses recursos, mas com uma política de coibir os abusos, já conseguimos diminuir em 50% também o uso de animais em sala de aula." Para a representante da Unifesp, a busca pela ética na utilização de cobaias em pesquisa é realmente um exercício para todos os dias.

"É difícil ser ético com um ser [o animal] que não pode reclamar", afirma Ghiraldini.

Por isso, além do Cedeme e do conselho de ética, as cobaias também precisam ser bem tratadas dentro dos diversos laboratórios para onde elas costuma ser levadas.

(Por Eduardo Geraque, Folha de S. Paulo, 15/12/2007)


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