Às vésperas do encerramento da Conferência da ONU sobre mudança climática em Bali vale a pena reexaminar algumas informações e documentos a respeito de um dos principais vilões do aquecimento global: o petróleo. "A melhor coisa que poderia acontecer agora seria o "pico da produção de petróleo" (Peak Oil)", disse Hartmut Grassl, diretor emérito do Instituto Max Planck e do Instituto Meteorológico da Universidade de Hamburgo na Alemanha, durante a última reunião preparatória ocorrida dia 23 de Novembro em Berlin. A teoria do "Peak Oil" prevê que a produção de petróleo chegará a um máximo e depois disto haverá um declínio, mas a demanda continuará alta e isto forçará a sociedade a buscar alternativas.
Como um dos especialistas mais respeitados no mundo e consultor do governo alemão para as discussões do Painel Intergovernamental para Mudança Climática (IPCC), Grassl lembrou que muitos países, incluindo Grã-Bretanha e Noruega, já apresentam declínio das reservas petróleo. "Mas isso não foi nem sequer mencionado aqui", completou.
Segundo o cientista, essa inferioridade do suprimento em relação à demanda forçaria uma rápida mudança tecnológica, visando manter o mesmo padrão de mobilidade da sociedade atual. Num primeiro momento, o vácuo provocado pela falta de petróleo seria preenchido por outros combustíveis fósseis. Somaria-se a isso o esquema de comércio de emissões, elevando o custo de produção da energia por fontes fósseis. "O pico do petróleo levará ao pico das emissões se houver a internalização pelas empresas de energia dos passivos provocados pela mudança climática e o fim dos subsídios", defendeu. "Atualmente são gastos 300 bilhões de Euros por ano em subsídios para a produção de combustíveis fósseis em todo o mundo". Ou seja, quando o custo da produção de energia deixar de ser subsidiada e considerar os prejuízos provocados pelas emissões de gases estufa, as fontes renováveis de geração se tornarão altamente competitivas.
A tese é interessante e controversa ao mesmo tempo. Principalmente pela resistência do setor em admitir o problema. A Agencia Internacional de Energia (IEA) tem projetado 30% de crescimento da produção de petróleo no mundo, chegando a 120 milhões de barrís/dia em 2030. A estimativa é parecida com os dados da Análise Estatística da Energia Mundial publicada pela BP, embora executivos de outras grandes petroleiras mundiais, como Total SA e ConocoPhillips, duvidem que a produção possa ultrapassar 100 milhões de barrís/dia.
A dúvida aumenta quando consideradas as previsões da Associação para Estudo do Pico do Petróleo (ASPO). Em setembro de 2004 o fundador da ASPO, Dr. Colin Campbell, declarou ao jornal The Guardian que a produção de óleo cru teria condições de atender o crescimento da demanda por no máximo três anos. Para ele, 2007 seria o ano em que o mundo atingiria o Peak Oil, o preço do barril ultrapassaria a marca de US$ 100,00, espalhando pânico nos mercados e marcando o início de uma recessão mundial.
Por enquanto, tal crise parece ter sido prorrogada por mais quatro anos. O próprio Campbell, um geologista que já esteve a frente de companhias como Shell, Chevron-Texaco, Exxon e da própria BP, reviu sua profecia em junho desse ano, mas ainda contrariando absolutamente as principais análises do setor. "Se eu ainda fosse o chefe de uma companhia de petróleo, eu jamais diria a verdade. Não é parte do jogo", argumentou ele.
O economista chefe da BP, Peter Davies, descartou completamente tais previsões. "Nós não acreditamos em uma falta iminente de recursos. Quando o pico do petróleo ocorrer será, provavelmente, por conta da redução do consumo, devido às políticas de combate à mudança climática", respondeu Davies.
Para a agência de notícias especializada Energy and Capital, o comportamento da indústria do petróleo é só jogo de cena. Isso tanto no debate sobre o pico do petróleo, quanto nas discussões a respeito da mudança climática. "O mundo está viciado em petróleo, e já estamos vivendo uma crise deste recurso. Basta ver a explosão dos preços e a guerra do Iraque, que é só o começo de uma guerra muito maior, a guerra do petróleo. Há investidores aproveitando essa situação para ter lucros imensos", escreveu o editor Keith Kohl no final de novembro. Na Energy and Capital o Peak Oil já tem até data marcada. Segundo o cronômetro digital, exibido na entrada do site, faltam 809 dias para ele.
A importância do ouro negro:
* Uma redução de apenas 10% a 15% na produção poderia arrebentar toda cadeia produtiva dependente do petróleo. Em 1970, uma redução de não mais que 5% na oferta causou um aumento no preço de 400%.
* A maioria dos equipamentos agrícolas, de máquinas a geradores de energia do meio rural, usam diesel como combustível. Praticamente todos os agrotóxicos e muitos fertilizantes são feitos a base de petróleo.
* A quase totalidade dos plásticos usados em tudo na sociedade, de computadores, e telefones celulares a dutos, roupas e carpetes são feitos a partir de substâncias petroquímicas
* A produção industrial de maneira geral precisa de quantidades enormes de derivados do petróleo. A construção de um único carro necessita de uma média de 20 barrís de petróleo.
* Equipamentos para geração renovável de energia dependem de grandes quantidades de combustível para serem produzidos.
* A produção metalúrgica, em especial a de alumínio, a fabricação de cosméticos e medicamentos dependem do ouro negro. (fonte: The Independent)
(Por Mariano Senna, Ambiente JÁ, 13/12/2007)