É injusto retratar a China e a Índia como as vilãs responsáveis pela mudança climática enquanto os países industrializados escampam das sanções apesar de emitirem cada vez mais gases causadores do efeito estufa, disse o Centro para a Ciência e o Meio Ambiente, organização não-governamental com sede em Nova Délhi. Citando as projeções do Grupo Intergovernamental sobre a Mudança Climática (IPCC), a diretora do Centro, Sunita Narain, disse à IPS que nos últimos cinco anos as emissões desses gases aumentaram na maioria dos países ricos, com exceção de Grã-Bretanha e Alemanha.
Entre 1990 e 2004, as emissões totais nos Estados Unidos cresceram 1,2 bilhão de toneladas, calculando-se um aumento por pessoa de 1,3 toneladas por ano. Nesse período, as emissões totais da Índia aumentaram 400 milhões de toneladas, e o aumento por pessoa foi de apenas 0,4 tonelada ao ano, destacou Narain. Dados divulgados no site do IPCC mostram uma clara divisão das liberações de gases. As emissões por pessoa de dióxido de carbono, o principal gás causador do efeito estufa, a partir da queima de combustíveis fósseis são de 20 toenladas por ano nos Estados Unidos, contra quatro toneladas na China e 1,1 tonelada na Índia.
“Como repentinamente a Índia se converteu na nova vilã?”, perguntou Narain, acrescentando que não há ponto de comparação entre as emissões de países como Índia e China e as nações ricas. “Há existências de gases causadores do efeito estufa na atmosfera, construídas ao longo dos séculos, enquanto estes países se industrializavam”, acrescentou. os gases gerados por um cidadão norte-americano equivalem aos de 107 habitantes de Bangladesh, 134 do Butao, 269 do Nepal e de 19 indianos, disse Narain.
Em novembro, um informe da Organização das Nações Unidas que estabelecia objetivos de redução das emissões para países industrializados e em desenvolvimento foi duramente atacado pelo governo indiano. Montek Singh Ahluwalia, vice-presidente da Comissão de Planejamento da Índia, que desenvolve os planos qüinqüenais de crescimento do país, enquanto o informe era divulgado se voltou para atacá-lo, chamando-o de “injusto e “fundamentalmente mal concebido”.
O Informe sobre Desenvolvimento Humano 2007, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) estabeleceu objetivos de redução em 80% para nações industrializadas e de 20% os países em desenvolvimento até 2050. Narain também qualificou o informe da ONU de “inaceitável”, já que significa que os Estados Unidos reduzem de 19,3 toneladas por pessoa para quatro, enquanto a Índia reduzi de 0,8 para 0,6 e a China de 2,1 para 1,7. Ahluwalia disse que o informe do Pnud não se baseava no principio da igualdade e que por uma vez o governo e uma importante organização não-governamental falavam a mesma língua.
Para Narain, uma das principais razões pelas quais os países não foram capazes de reduzir suas emissões de dióxido de carbono é que isto está vinculado tanto ao uso de energia quanto ao crescimento econômico. “Ninguém ainda construiu uma economia de baixo carbono”, afirmou. Embora existam opções para reinventar o crescimento (como as tecnologias livres de carbono e as renováveis), houve poucas iniciativas genuínas nestas frentes. As opções de energias renováveis, como a eólica, a solar, a geotérmica e a biomassa, representaram somente 0,5% dos principais fornecimentos energéticos do mundo em 2005.
Entre 1990 e 2005, as emissões dos países ricos aumentaram 11% e as do setor energético subiram 15%. As emissões de dióxido de carbono da Austrália cresceram 37%, as do Canadá 15% e as dos Estados Unidos 20%. Narain disse que as nações industrializadas se aproveitam dos defeitos existentes no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) previsto no Protocolo de Kyoto (assinado em 12997 e em vigor desde 2005).
O MDL permite que governos e empresas das nações ricas obrigados a reduzir suas emissões de gases que provocam o efeito estufa cumpram em parte investindo em projetos limpos em países em desenvolvimento para obter reduções certificadas de emissões a custos mais baixos. Os países industrializados se voltam, então, para o ganho de créditos de carbono através do MDL no prazo mais curto possível, com as tecnologias mais baratas, em lugar de optar por uma transição para tecnologias menos contaminantes e mais caras.
Narain atacou o MDL por considerá-lo complicado e corrupto. Em novembro de 2007 o portfólio global de MDL mostrava que 2,290 bilhões de toneladas de equivalentes a dióxido de carbono serão acreditadas nos próximos 10 anos. Isto compensará muito pouco (menos de 1%) as emissões totais de carbono nos próximos 10 anos, afirmou. “Não houve nenhuma transferência de altas tecnologias dos países ricos para os pobres, nem investimentos em tecnologias livres de carbono”, acrescentou.
Para Narain, países como Índia e China deveriam desenvolver uma estratégia de baixo carbono para reduzir as emissões, sem comprometer seu direito ao desenvolvimento. Também sugeriu criar um sistema de igualdade em matéria de emissões por pessoa, para que os ricos reduzam suas emissões e os pobres não passem sua cota climática. Nesse sistema, proposto pela primeira vez pelo Centro para a Ciência e o Meio Ambiente em 1991, os países teriam direitos com base em sua população. Segundo a diretora deste centro, os sistemas deveriam operar em dois níveis: igualdade entre as nações e igualdade dentro de cada uma.
“Os ricos da Índia emitem como os ricos de outras partes. São os pobres da Índia, sem acesso à energia, os que nos proporcionam o espaço para respirar. Um sistema por pessoa significa que os ricos pagam pelo excesso no uso de energia”, explicou Narain. Para ela, uma das principais tarefas da Conferência das partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (que começou em Bali, na Indonésia, no último dia 3 e vai até sexta-feira) deveria ser “reformar e reinventar” o MDL para torná-lo mais efetivo.
(Por T. V. Padma,
IPS, 11/12/2007)