Cintas-largas exigem que a Polícia Federal seja retirada dos acessos às aldeiasMunicipalização da saúde também é contestada; polícia diz que Ministério Público Federal deverá assumir as negociações.
Um representante da ONU, um procurador da República e mais duas pessoas estavam sendo mantidas reféns por índios cintas-largas, desde anteontem, em uma aldeia da reserva Roosevelt, em Rondônia.
As lideranças cintas-largas diziam ontem que só liberariam as autoridades se o governo federal retirasse a Polícia Federal das barreiras de acesso às aldeias e revogasse a portaria do Ministério da Saúde, que repassa aos municípios a responsabilidade da prestação dos serviços de saúde indígena, entre outras seis reivindicações.
Segundo a PF, estavam como reféns o representante da ONU para Direitos Humanos, o suíço David Martins, o procurador regional da República Reginaldo Trindade, a esposa dele, cujo nome não foi divulgado, e o administrador da Funai (Fundação Nacional do Índio) em Ji-Paraná, Vicente Batista.
Em comunicado ontem, as lideranças cintas-largas afirmavam que o grupo retido na aldeia Roosevelt (que tem o mesmo nome da reserva) estava participando de uma reunião para buscar soluções para problemas que a comunidade enfrenta há sete anos, quando foi descoberta uma jazida de diamantes na terra dos índios.
A disputa pela pedra causou, em abril de 2004, um conflito que acabou com a morte de 29 garimpeiros por cintas-largas.
O grupo retido pelos índios entrou na reserva pela cidade de Espigão D'Oeste (534 km de Porto Velho). A aldeia em que eles estão é chefiada pelo cacique Nacoça Pio Cinta-Larga. Ontem, o cacique Henrique Suruí, que apoia a ação dos cintas-largas, disse que os quatro reféns não enfrentam constrangimentos. "O protesto é pacífico. A noiva do procurador saiu da aldeia acompanhada pelos índios, pegou roupas e entrou na reserva, está tudo bem com eles", disse.
As lideranças cintas-largas afirmam que decidiram reter o grupo para chamar a atenção para "a gravíssima situação pela qual estamos passando".
"Estamos mantendo detidos o procurador e o representante da ONU com a firme decisão de não liberá-los enquanto as autoridades responsáveis não atenderem nossas reivindicações", diz o comunicado.
NegociaçãoOntem à tarde, a PF estava montando um gabinete de emergência para o início das negociações na cidade de Pimenta Bueno (70 km de Espigão D'Oeste). Mas, segundo o coordenador de Operações Especiais, delegado Mauro Sposito, como a polícia é parte das reivindicações dos índios, o Ministério Público Federal deverá ficar à frente das negociações.
Sposito estranhou o fato de o procurador regional não ter avisado à PF de que iria entrar na reserva. O delegado disse que todos os órgãos foram informados dos riscos de prisões e até mesmo seqüestro no local.
"Não podemos impedir a entrada do procurador de Direitos Indígenas, nem questionar o que ele ia fazer lá dentro, mas ele sabia dos riscos", disse.
A Funai disse que o presidente Márcio Meira estava em terra indígena no Amazonas, incomunicável. Os representantes da Ministério Público Federal, em Rondônia, nem da ONU, no Rio, foram localizados.
(Kátia Brasil,
Folha de São Paulo, 10/12/2007)