Lançada em setembro de 2006, a sonda espacial japonesa Hinode (“nascer do sol” em português) tem a missão de desvendar vários dos mistérios do Sol. Os primeiros resultados da missão foram publicados em seção especial na edição de sexta-feira (07/12) da revista Science.
Os primeiros resultados estão descritos em dez artigos, de cientistas do Japão, Europa e Estados Unidos, e ajudam a explicar, por exemplo, a gigantesca diferença de temperatura entre a superfície relativamente fria do Sol e sua quente atmosfera, além das origens dos ventos solares que varrem o sistema solar e atingem as atmosferas dos planetas.
Vários dos objetivos principais da Hinode envolvem a compreensão da física básica que opera no Sol, fornecendo à Terra o calor e a energia que mantêm a vida.
As descobertas também têm um aspecto prático, uma vez que as erupções de energia magnética do Sol são responsáveis pelos eventos do “clima espacial”, que podem ameaçar telecomunicações, sistemas de navegação e redes de energia elétrica na Terra.
Um melhor entendimento dessas erupções e do vento solar – imenso volume de material ionizado que o Sol despeja no espaço interplanetário – pode ajudar a prever e planejar ações adequadas para tais eventos.
“O Sol foi objeto de algumas das primeiras observações científicas feitas na história, mas vários dos processos que ocorrem no astro permanecem em mistério”, disse Brook Hanson, editor de Ciências Físicas da Science.
A missão Hinode está em órbita em torno da Terra em um padrão que permite visão constante do Sol. A missão é liderada pela Agência de Exploração Aerospacial Japonesa (Jaxa), com colaboração do Observatório Astronômico Nacional do Japão, da agência espacial norte-americana (Nasa), do Conselho de Instalações Científicas e Tecnológicas do Reino Unido e da Agência Espacial Européia (ESA).
A sonda é equipada com espectrômetros que podem observar o Sol em diferentes registros: óptico, raios-X ou ultravioleta extremo. Os aparelhos permitem captar imagens – inclusive em vídeo – com resolução especialmente alta no tempo e no espaço, mostrando as estruturas e os campos magnéticos existentes no plasma de alta energia do Sol.
Um dos principais resultados revelados pela edição da Science é a descoberta de um tipo de onda magnética, conhecida como onda alfvén, que ondula pelo plasma da atmosfera solar, ou “coroa”. O físico sueco Hannes Alfvén previu teoricamente essas ondas, o que lhe rendeu um Prêmio Nobel, mas até agora elas não haviam sido definitivamente detectadas.
Várias equipes de pesquisa reportam evidências de ondas alfvén, que poderiam potencialmente esquentar a coroa até temperaturas extremas ao liberar energia em sua trajetória para fora do Sol ao longo de linhas de campos magnéticos.
Tais achados podem ajudar a resolver um antigo problema relacionado à coroa solar: a superfície solar, ou fotosfera, chega a 6 mil graus kelvin, enquanto na coroa a temperatura chega a pelo menos 1 milhão de graus kelvin.
Ventos solares
Os artigos escritos pelas equipes de Jonathan Cirtain, da Universidade de Memphis (Estados Unidos), Takenori Okamoto, da Universidade de Kyoto (Japão), e Bart De Pontieu, do Laboratório de Astrofísica Solar Lockheed Martin (Estados Unidos), também destacam que a energia associada com as ondas é suficiente para esquentar a coroa e acelerar o vento solar.
Outro possível processo de aquecimento da coroa é a liberação de energia que ocorre quando as linhas de campos magnéticos se cruzam e se reconectam. Os eventos de reconexão são responsáveis primários pelas violentas explosões conhecidas como erupções solares. A Hinode observou uma variedade de jatos em alta velocidade de material ejetado desses locais de reconexão.
Estudando os dados da Hinode, o grupo liderar por Kazunari Shibata relata um número maior do que o esperado de “jatos anêmona” (com a forma de um Y invertido) em regiões de manchas solares ativas, que são áreas relativamente frias com intensa atividade magnética.
A equipe de Yukio Katsukawa também detectou vários jatos de pequena escala e curta duração associados com as manchas solares, enquanto o grupo de De Pontieu encontrou jatos na cromosfera. A equipe de Cirtain também identificou jatos muito maiores – de até 20 mil quilômetros de largura por 100 mil quilômetros de comprimento –, que podem contribuir para o vento solar.
Outra possível fonte dos ventos solares foi destacada pelo grupo de Taro Sakao, que identificou uma região na qual o plasma que emite raios-X flui continuamente para a coroa superior. Os cientistas avaliaram temperatura e densidade desse plasma e estimam que ele possa ser responsável por um quatro da massa dos ventos solares.
O artigo de Robertus Erdelyi discute essas e outras descobertas relatadas na edição especial, concluindo que a Hinode “abriu novas avenidas para a observação e a teoria solar”.
Os títulos e autores dos dez artigos que podem ser lidos por assinantes da Science em www.sciencemag.org:
Are There Alfvén Waves in the Solar Atmosphere, de Robert Erdélyi e Viktor Fedun
Chromospheric Alfvénic Waves Strong Enough to Power the Solar Wind, de Bart De Pontieu e outros
Detection of Coronal Alfvén Waves in a Solar Prominence with the Hinode Solar Optical Telescope, de Takenori Okamoto e outros.
Evidence for Alfvén Waves in Solar X-ray Jets, de Jonathan Cirtain e outros
Fine Thermal Structure of a Coronal Active Region, de Fabio Reale e outros
Continuous Plasma Outflows from the Edge of a Solar Active Region as a Possible Source of Solar Wind, de Taro Sakao e outros.
Slipping Magnetic Reconnection in Coronal Loops, de Guillaume Aulanier e outros.
Chromospheric Anemone Jets as Evidence of Ubiquitous Reconnection, de Kazunari Shibata e outros.
Small-Scale Jetlike Features in Penumbral Chromospheres, de Yukio Katsukawa e outros.
Twisting Motions of Sunspot Penumbral Filaments, de Kiyioshi Ichimoto e outros.
(Agência Fapesp, 07/12/2007)