Substituir a gasolina por bioetanol produzido a partir do milho é uma solução cara e com impactos ambientais significativos devido às suas emissões, de acordo com um estudo liderado por um investigador do Instituto Superior Técnico (IST). A "Análise Energética e Ambiental da Produção de Bioetanol a partir do Milho em Portugal" - da autoria de Tiago Domingos, Tatiana Valada e Ricardo Teixeira - mostra que o uso deste biocombustível pode ter um balanço negativo em termos de emissões de gases com efeito de estufa, comparativamente à gasolina, quando analisado num cenário que envolve a afectação de solo usado para pastagens.
O trabalho envolveu a análise do ciclo de vida do bioetanol produzido a partir do milho, a cultura actualmente mais viável em Portugal, desde o seu cultivo à utilização do combustível, em dois cenários diferentes. "Fomos ver todos os impactes, incluindo o fabrico dos adubos e fertilizantes, processo de extracção do milho e transportes, para ver o que acontece até à queima do combustível no motor", disse Tiago Domingos, professor do Departamento de Engenharia Mecânica do IST e investigador na área de Economia Ecológica.
Num cenário que não contabilize a afectação do solo para pastagens, o balanço é favorável ao bioetanol, embora dispendioso, já que por cada tonelada poupada, o Estado despende 100 euros. Esta análise compara as emissões de dióxido de carbono (CO2) libertadas pelo bioetanol e pela gasolina, considerando apenas factores como "ocupação do solo", "DDG" (um sub-produto do bioetanol usado para alimentar animais), "produção de combustível" e "queima de combustível".
O bioetanol leva vantagem já que recupera parte do CO2 durante o processo de cultivo do milho e tem ainda um impacte positivo devido à produção de DDG. No lado negativo, contam-se a ocupação do solo, devido ao cultivo intensivo, e a produção de combustíveis fósseis. "Este cenário cria a ideia de que o bioetanol é neutro em termos de emissões porque o CO2 produzido com a queima de combustível é capturado no cultivo agrícola. Mas os biocombustíveis também consomem muitas energias fósseis", sublinhou Tiago Domingos Quanto à gasolina, perde claramente na análise relativa às emissões.
O balanço final revela que, neste cenário, cada tonelada de bioetanol poupa duas toneladas de CO2. Mas cada tonelada de CO2 que se evita custa aos contribuintes 100 euros, segundo estimativas que incorporam o Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP). "São valores indicativos porque ainda não saiu a portaria final que define as quotas de produção e isenções relativas aos biocombustíveis", adiantou o especialista, frisando que "este valor [100 euros] é muito alto", tendo em conta que cada tonelada de carbono é actualmente transaccionada a 20 euros.
Embora se esperasse que a transição para os biocombustíveis fosse cara, Tiago Domingos considera que é preciso pesar os prós e os contras. "A questão é saber se se justifica. Trata-se de uma decisão política e não técnica. Usar biocombustíveis sai caro para o contribuinte, mas pode ser encarado também como um investimento, tendo em conta que é preciso adquirir know-how". Este estudo alerta para outras consequências "que não têm sido ponderadas", como o facto de os terrenos usados para o milho não poderem ser ocupados, por exemplo, com pastagens.
"Existe uma diferença entre produzir animais no estábulo ou em pastagem. É preciso contabilizar as emissões de metano e azoto associadas aos animais e que são muito superiores no primeiro caso", salientou o investigador. Neste cenário, que contabiliza a alimentação animal e as emissões animais, além dos factores incluídos na análise anterior, a gasolina conta com um impacto positivo - o sequestro de carbono nas pastagens - e surge com um balanço claramente favorável: cinco toneladas de CO2 poupadas.
"Tendo em conta a produção de milho na situação actual em Portugal, o balanço em termos de emissões de gases com efeito de estufa é desfavorável ao bioteanol (aumenta, num cenário de afectação do solo envolvendo animais ou reduz, mas de forma muito cara)", resumiu o engenheiro ressalvando que "as coisas podem ser diferentes daqui a dois ou três anos".
(Lusa,
Ecosfera, 04/12/2007)