Ecossistema da região está adaptado a eventos climáticos extremos, diz pesquisador alemãoEcossistema da região está adaptado a eventos climáticos extremos, diz pesquisador alemão
WWF vê metade da Floresta Amazônica ameaçada. Pesquisadores dizem que é difícil medir os efeitos da mudança climática sobre a região, mas não deixam dúvidas a respeito dos danos causados pelo desmatamento.
Mais da metade da Floresta Amazônica encontra-se ameaçada de destruição. Isso não só põe em jogo a biodiversidade da região como também libera enormes volumes de CO2. E a mudança climática agrava a destruição da Amazônia, visto que a redução das chuvas aumenta o risco de incêndios florestais.
Essa é a síntese de um novo estudo que o Fundo Mundial para a Natureza (WWF) apresentará em Berlim, na próxima quinta-feira (06/12). O relatório fala de um "círculo vicioso" entre a mudança climática e o desmatamento do "pulmão verde do planeta".
Estima-se que as emissões por desflorestamento sejam de 150 milhões a 400 milhões de toneladas de CO2 por ano. Ao mesmo tempo, a Floresta Amazônica teria a capacidade de absorver por fotossíntese entre 300 milhões e 600 milhões de toneladas de CO2 – um volume modesto em comparação com o que os oceanos são capazes de absorver: 2 bilhões de toneladas.
Peritos ouvidos pela DW-WORLD.DE dizem que é difícil estabelecer relações causais entre o que acontece na Amazônia e os efeitos globais da mudança climática. "Vários estudos matemáticos do clima partem do princípio de que o desmatamento da Floresta Amazônica pode influenciar a precipitação no norte da África, na Europa e até na América do Norte", diz Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Ele defende uma avaliação diferenciada. "Não confere que isso influenciará o clima em cada quilômetro quadrado da Terra, como é feito pelo aquecimento global. O aquecimento global influencia toda a superfície da Terra. Já o desmatamento da Amazônia influenciará o clima em regiões distantes, mas de uma forma isolada."
Modelos climáticos imperfeitosNa opinião de Paulo Artaxo, físico da Universidade de São Paulo que participou da elaboração do último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), "é impossível atribuir eventos climáticos individuais, como a seca de 2005, de modo inequívoco à questão das mudanças globais".
O processo de mudanças globais não se dá em eventos individuais e em prazos temporais curtos, explica. "Embora seja possível que a Amazônia já esteja sentindo os efeitos das mudanças globais, a falta de um sistema de monitoramento ambiental e a complexidade dos possíveis impactos fazem com que seja impossível estabelecer uma clara relação causa-efeito", diz Artaxo.
Segundo ele, "não há dúvida hoje de que o ecossistema amazônico é muito mais frágil do que imaginávamos, e que um processo de savanização de parte da floresta pode se estabelecer em 30–50 anos. É esperado que na parte leste da Amazônia haverá uma redução da taxa de precipitação (da ordem de 30%) e um aumento significativo de temperatura (da ordem de 3–4 graus)".
Artaxo, no entanto, faz questão de lembrar que os modelos climáticos ainda não são perfeitos e que surpresas no efeito do ecossistema podem ocorrer. "A ciência tem que continuar estudando processos básicos de funcionamento do ecossistema para que possamos ter um cenário mais realista e com maior grau de confiabilidade do que os cenários que temos hoje para a Amazônia."
O físico explica também que as geleiras na região andina estão se retraindo, "o que afeta o ciclo hidrológico na região amazônica. A chuva na parte central do Brasil também está se reduzindo. Mas, de novo, é impossível atribuir univocamente estas mudanças às mudanças climáticas globais. Localmente a Amazônia pode estar sofrendo efeitos da forte alteração no uso do solo, que também afeta fortemente o ciclo hidrológico".
Ecossistema adaptadoSegundo o pesquisador alemão Wolfgang Junk, diretor do grupo de trabalho Ecologia Tropical do Instituto Max Planck de Limnologia (estudo da águas), "as informações sobre a mudança climática na Amazônia atualmente ainda são muito imprecisas e, em parte, contraditórias, para fazer previsões concretas. Mas pode-se presumir que os períodos extremamente secos e os extremamente úmidos se tornarão mais freqüentes".
O escritório do Instituto Max Planck em Manaus analisou dados coletados desde 1902 sobre o nível das águas na Bacia Amazônica. Junk explica que os organismos nas regiões inundáveis dos grandes rios estão relativamente bem adaptados a essas condições e sobreviverão às fases extremas em habitats apropriados.
Diferente é, segundo Junk, a situação em regiões úmidas não ligadas aos grandes rios, cuja flora e fauna são mais atingidas por acontecimentos extremos. "As enchentes e as secas extremas na Amazônia, de alguns anos atrás, não são nada de especial para a natureza. Tais fenômenos já ocorreram meia dúzia de vezes nos últimos 50 anos”, afirma o pesquisador alemão.
Perigo de incêndiosAssim como o WWF, também Junk vê um crescente risco de incêndios florestais nos período de extrema seca na Amazônia, uma vez que os ecossistemas não estariam adaptados ao fogo. "No futuro teremos de lutar em maior dimensão contra incêndios descontrolados, iniciados pelo ser humano através de queimadas", prevê.
Segundo Junk, como ocorre na Alemanha, também na Amazônia se nota que, bem antes de os efeitos da mudança climática global se tornarem perceptíveis, os danos causados pela atual ação humana se tornam evidentes. "Essa tendência provavelmente será fortalecida pelo grito politicamente motivado por biocombustíveis."
Isso, na opinião de Junk, fará com que, para reduzir as emissões de CO2, enormes áreas naturais com sua fauna e flora sejam destruídas para a produção de álcool, óleo vegetal e outros combustíveis.
"A natureza será irreversivelmente destruída, mas é muito questionável até que ponto isso ajudará o clima. Tais ponderações, porém, são relegadas a segundo plano diante do forte lobby agroindustrial, que vê as chances de um enorme negócio nos países industrializados, nos emergentes e nos em desenvolvimento sob o manto da proteção ao clima. E os políticos finalmente podem mostrar ação internacional e desviar a atenção da negligência nacional na proteção ao meio ambiente", conclui Junk.
(Por Geraldo Hoffmann,
DW World, 05/12/2007)