Embaixador defende que conferência sobre tratado para o clima em Bali isente países pobres de redução obrigatória"É uma visão míope querer comparar responsabilidades da Índia e da China nas emissões com as dos EUA e da Europa", diz Vargas
O Itamaraty voltou a avisar ontem que o Brasil não aceitará metas internacionais de redução de emissões de gases causadores do aquecimento global para países em desenvolvimento. O recado foi transmitido pelo subsecretário de assuntos políticos do Ministério das Relações Exteriores, Everton Vieira Vargas, às vésperas da 13ª Conferência das Partes sobre a Convenção das Nações Unidas sobre o Clima e da 3ª Reunião das Partes do Protocolo de Kyoto, que começam dia 3 em Bali (Indonésia).
As reuniões começam a definir metas a serem cumpridas após 2012, quando expira o prazo dado pelo Protocolo de Kyoto para que 36 países desenvolvidos reduzam suas emissões de gases-estufa em 5% em relação aos índices de 1990.
Encarregado pelo Itamaraty de falar sobre a posição que o Brasil levará aos encontros, o diplomata rejeitou a proposta do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) de fixar em 20% a redução de emissões dos gases-estufa até 2050 pelos países em desenvolvimento -a meta a ser alcançada pelos países desenvolvidos seria de 80%.
Responsabilidade variada
"Não somos a favor de metas para os países em desenvolvimento", afirmou Vargas. "Nossa idéia é que esses países adotem políticas públicas de redução das emissões de gases do efeito estufa em âmbito nacional que possam ser quantificadas e verificadas."
O embaixador justificou a posição brasileira pelo princípio das "responsabilidades comuns, porém diferenciadas" que os países ricos devem ter em relação aos desenvolvidos.
Ele citou as "responsabilidades históricas" dos ricos pelo aquecimento global e o "perfil distinto das emissões" de gases-estufa entre os dois grupos de países -para ele, levar energia elétrica produzida por carvão a vilarejos na China é algo "muito distinto" das emissões geradas por "SUV" nos países desenvolvidos, que poderiam rodar a etanol. Os SUV (veículo utilitário esportivo, na sigla em inglês), ou picapes, são apontados como recordistas em emissões de gás carbônico.
"É uma visão injusta e míope querer comparar responsabilidades da Índia e da China nas emissões com as dos EUA e da Europa", disse. Ele afirmou que, embora seja um dos maiores poluidores do mundo, a China não aumentou suas emissões considerando o número de habitantes.
O Itamaraty argumenta que o Brasil e outros países em desenvolvimento já vêm adotando políticas para minimizar os efeitos do aquecimento global. "A meta não é o único instrumento", afirmou o embaixador, para depois citar que, com a redução do desmatamento, o Brasil diminuiu as emissões em 400 mil toneladas de dióxido de carbono desde 2004.
Segundo ele, o Brasil vai levar a Bali duas propostas: o estabelecimento, na conferência que acontecerá em 2009 em Copenhague (Dinamarca), de um segundo prazo de emissões para os países industrializados após 2012, e a criação de um órgão para negociar o apoio, em financiamento e transferência de tecnologia para a produção de energia limpa, a países em desenvolvimento que adotarem políticas para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa.
Ele admitiu que vai ser difícil chegar a um consenso sobre as propostas dentro do próprio G-77, grupo dos países em desenvolvimento mais a China. De um lado, lembra ele, há os membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), que resistem a medidas de estímulo à redução das emissões. Do outro, os países insulares ou com áreas abaixo do nível do mar, que correm o risco de submergir com o aumento da temperatura no planeta e a conseqüente elevação do nível do mar e, por isso, defendem medidas drásticas.
Ninguém vai barrar o debate, diz Pachauri
Na opinião do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), a conferência que se inicia em Bali (Indonésia) na segunda-feira não deve conseguir definir tantos pontos quanto poderia.
Segundo Rajendra Pachauri, presidente do IPCC, já será uma vitória se os países conseguirem elaborar um "mapa" que os guie para estabelecer novas metas para reduzir as emissões de gases-estufa depois que o Protocolo de Kyoto expirar, em 2012.
É provável que o novo acordo só comece a nascer de fato em 2008, mas a expectativa é que nenhum país "obstrua" as negociações agora, afirma o cientista indiano.
"Há um nível sem precedentes de consciência sobre as mudanças climáticas entre pessoas e líderes do mundo", diz. "O que terá importância crítica é que todos os países se dêem conta de que estamos juntos nessa."
(Angela Pinho,
Folha de São Paulo, 29/11/2007)