(29214)
(13458)
(12648)
(10503)
(9080)
(5981)
(5047)
(4348)
(4172)
(3326)
(3249)
(2790)
(2388)
(2365)
cvrd
2007-11-28
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra já paralisou por três vezes neste ano o funcionamento da ferrovia de Carajás, pela qual trafega o maior trem de cargas do mundo. Cada dia de paralisação causa um prejuízo de 15 milhões de dólares, no mínimo, à Companhia Vale do Rio Doce. O bloqueio serve de instrumento para o MST pressionar o governo para cumprir compromissos ou atender reivindicações que nada têm a ver com a CVRD, conforme se pode constatar pela pauta que é apresentada pelos líderes do movimento para a negociação com representantes dos dois níveis da administração pública, a federal e a estadual, quando com eles se reúnem logo depois.

Mas a paralisação dos trens é também uma forma indireta de protestar contra a venda do controle acionário da estatal, em 1997. Não só porque o valor da transação foi baixo, quase vil (quase quatro vezes menos do que o lucro líquido da empresa só no ano passado), como porque significou a renúncia pelo Estado de um poder que não devia ter transferido a uma empresa privada. Há a convicção tácita nessa ofensiva de que a CVRD lucra muito, até demais, enquanto o Estado e o país lucram pouco, quando efetivamente lucram.

Não é sem razão, à sua maneira, que o presidente da Vale, o ex-banqueiro Roger Agnelli, classifica esses atos de meramente ideológicos. Ou, como disse à imprensa logo depois de sair de uma audiência com seu amigo, o presidente Lula, no Palácio do Planalto, em Brasília: "O caso da Vale do Rio Doce é, claramente, uma empresa que é bem sucedida, está gerando muitos resultados, está investindo, reinvestindo. Está num processo de crescimento muito forte. A gente acaba virando de alguma forma, vitrine, vidraça".

Se a ocupação dos trilhos para impedir a passagem dos 10 trens diários, que escoam minério de Carajás até o porto de embarque para o exterior (60% para China e Japão), se tornar rotineira, a CVRD poderá ajuizar uma ação para compelir o governo federal a garantir a concessão que lhe outorgou, de operar a ferrovia de Carajás por 50 anos, ou cobrar-lhe indenização pelos prejuízos sofridos. Afinal, é obrigação da União zelar pela concessão, enquanto poder concedente, se ela está sendo cumprida regularmente pelo concessionário. E a causa explícita ou direta dos atos é sua inércia, omissão ou incompetência no trato das questões agrárias e fundiárias, que constituem o móvel do MST.

O contencioso devia ser estabelecido exatamente no plano legal para se evitar as derivações e aproveitamentos paralelos, os lances de bastidores, os acertos intramuros. Mas não é assim que as coisas acontecem no Brasil. O presidente da empresa e o presidente da república acertaram suas contas no gabinete, inter pares. O que dizem para a imprensa, mantida lá fora, embora seja o que devia contar, não é o que efetivamente conta.

Da forma como as ocupações são feitas e, mais do que isso, da maneira como são inspiradas ou, às vezes, "sopradas", o ato pode ser classificado como ideológico por quem sofre suas conseqüências, mas cabe como rebelião primitiva no conceito de quem lida mais amplamente com a análise, sem interesse direto envolvido. Paralisações prolongadas ou amiudadas da linha férrea terão efeito negativo, do contra, mas não conduzirão a nada enquanto fato positivo, modificador, capaz de gerar conseqüências profundas. Até mesmo porque, à distância do teatro de operações, há espaço suficiente para acertos de cúpula, protegido da curiosidade pública.

Se não está na pauta de negociações do MST com os representantes do governo, a Companhia Vale do Rio Doce está dramaticamente na agenda nacional. O sr. Roger Agnelli não pode mais continuar a fazer de conta que a privatização, os lucros excessivos, a falta de correspondência entre os reajustes de preços das commodities internacionais e a falta de compensação ou participação da sociedade nos benefícios dessa renda extra, e tantos outros temas candentes, estão vencidos, superados, são passado. Não são, mesmo que legalmente fossem: estão aí, vivos, escancarados, exigindo novas reflexões e atitudes.

Se a ocupação da ferrovia é mentalidade que guarda correspondência com o início da industrialização, quando os operários destruíam as máquinas, vistas como a causa de sua exploração, o projeto de reestatização da CVRD não é menos problemático - e, provavelmente, não é o mais eficiente caminho a percorrer. Ainda que fosse possível fazer a Vale voltar à sua condição de estatal, é duvidoso imaginar que, com aquele status. ela realmente estaria fazendo significativamente melhor do que a empresa privatizada.

Claro que se deve tentar judicialmente anular a transação de venda, no valor acertado, por ser lesiva aos interesses nacionais e, na letra da lei, vil. Mas a partir daí talvez o melhor seria seguir um novo caminho (ao invés de voltar atrás) até que a CVRD se tornasse uma empresa pública, com capital pulverizado, sob efetivo controle da sociedade brasileira.

Uma empresa que pagasse imposto; que o imposto fosse calculado sobre uma pauta de valores decente (não na boca da mina); que o frete (no caso do mercado asiático mais compensador do que a própria venda de minério) fosse faturado pelo país; que o ganho de preço a partir de um limite de valor se destinasse a fundos de investimento para as regiões de influência da empresa; que os conselhos fossem formados com maior representatividade para não serem meros comitês executivos dos controladores; e assim por diante.

Mas para enfrentar o gigante é preciso ter a sua estatura. Continuamos a combater esse Golias com a presunção de que, sendo David, temos a garantia da intervenção divina nesse novo contencioso não-bíblico. O final da história não pode ser feliz, como não está sendo. Mas a Vale, apesar de toda a sua imensa relação pública, já não pode esconder a nudez desse rei pretensioso: ela própria.

(Por Lúcio Flávio Pinto *, Adital, 26/11/2007)
* Jornalista



desmatamento da amazônia (2116) emissões de gases-estufa (1872) emissões de co2 (1815) impactos mudança climática (1528) chuvas e inundações (1498) biocombustíveis (1416) direitos indígenas (1373) amazônia (1365) terras indígenas (1245) código florestal (1033) transgênicos (911) petrobras (908) desmatamento (906) cop/unfccc (891) etanol (891) hidrelétrica de belo monte (884) sustentabilidade (863) plano climático (836) mst (801) indústria do cigarro (752) extinção de espécies (740) hidrelétricas do rio madeira (727) celulose e papel (725) seca e estiagem (724) vazamento de petróleo (684) raposa serra do sol (683) gestão dos recursos hídricos (678) aracruz/vcp/fibria (678) silvicultura (675) impactos de hidrelétricas (673) gestão de resíduos (673) contaminação com agrotóxicos (627) educação e sustentabilidade (594) abastecimento de água (593) geração de energia (567) cvrd (563) tratamento de esgoto (561) passivos da mineração (555) política ambiental brasil (552) assentamentos reforma agrária (552) trabalho escravo (549) mata atlântica (537) biodiesel (527) conservação da biodiversidade (525) dengue (513) reservas brasileiras de petróleo (512) regularização fundiária (511) rio dos sinos (487) PAC (487) política ambiental dos eua (475) influenza gripe (472) incêndios florestais (471) plano diretor de porto alegre (466) conflito fundiário (452) cana-de-açúcar (451) agricultura familiar (447) transposição do são francisco (445) mercado de carbono (441) amianto (440) projeto orla do guaíba (436) sustentabilidade e capitalismo (429) eucalipto no pampa (427) emissões veiculares (422) zoneamento silvicultura (419) crueldade com animais (415) protocolo de kyoto (412) saúde pública (410) fontes alternativas (406) terremotos (406) agrotóxicos (398) demarcação de terras (394) segurança alimentar (388) exploração de petróleo (388) pesca industrial (388) danos ambientais (381) adaptação à mudança climática (379) passivos dos biocombustíveis (378) sacolas e embalagens plásticas (368) passivos de hidrelétricas (359) eucalipto (359)
- AmbienteJá desde 2001 -