Às vésperas da conferência de cúpula da ONU sobre mudanças climáticas, governo forma um comitê interministerial que elaborará até abril do ano que vem um projeto de lei para a criação da Política Nacional sobre Mudança do Clima.RIO DE JANEIRO – A menos de um mês da realização da conferência de cúpula da ONU que tentará construir uma agenda comum para a segunda fase do Protocolo de Quioto (pós-2012), o Brasil sinaliza que poderá assumir uma nova postura no cenário multilateral de discussões sobre o aquecimento global. O governo brasileiro continua determinado a não assumir metas obrigatórias de corte para suas emissões de gases provocadores do efeito estufa, mas a novidade na reunião que acontecerá em Bali (Indonésia) entre os dias 3 e 14 de dezembro poderá ser o anúncio de metas internas voluntárias de redução.
Esse quadro começou a se desenhar na quarta-feira (21/11), durante a reunião em Brasília do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, quando foi apresentada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a proposta de que o governo estabeleça internamente metas de redução do desmatamento e das queimadas como forma de diminuir suas emissões de gases que contribuem para o aquecimento global. A idéia, que conta com a simpatia de Lula, é aproveitar o bom momento provocado por três anos consecutivos de queda no desmatamento da Amazônia para anunciar metas internas em Bali e mostrar ao mundo que o Brasil está fazendo a sua parte no enfrentamento das mudanças climáticas.
Na visão do governo, ao assumir metas internas contra o desmatamento e as queimadas, responsáveis por cerca de 75% de suas emissões, o Brasil terá maior capital político para reapresentar em Bali a proposta, inicialmente rechaçada pelos países ricos, de que os países em desenvolvimento recebam incentivos econômicos pelo desmatamento evitado.
Como prova do “dever de casa” bem feito, o governo vai anunciar oficialmente dias antes do evento na Indonésia os dados relativos ao desmatamento no período entre julho de 2006 e junho de 2007. Estes indicarão a terceira redução anual consecutiva e o menor índice de desflorestamento da Amazônia já registrado desde que essa medição começou a ser feita pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em 1998.
“O principal ponto da proposta apresentada ao presidente Lula é o combate ao desmatamento. O governo sabe que tem que priorizar isso e acreditamos que seja possível estabelecer metas já para 2008”, disse Luiz Pinguelli Rosa, que é secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. Também presente à reunião, o ministro interino do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, se manifestou favoravelmente à adoção de metas internas: “O Brasil pode internamente definir políticas estratégicas e até objetivos quantificáveis para estimular a redução do desmatamento e, conseqüentemente, a redução das emissões”, disse.
Plano Nacional a caminhoDurante a reunião do Fórum, o presidente Lula confirmou que o governo pretende lançar no ano que vem o Plano Nacional de Combate às Mudanças Climáticas, além de enviar ao Congresso o projeto de lei que instituirá a Política Nacional sobre Mudança do Clima. Para coordenar os trabalhos do governo nessas duas frentes, Lula assinou na quarta-feira (21) o decreto que criou o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM).
Coordenado pela Casa Civil, o CIM terá caráter permanente e será formado por 16 ministérios e pelo Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. Suas ações serão operacionalizadas por um grupo executivo, composto pelo Ministério do Meio Ambiente e por outros seis ministérios. De acordo com o cronograma estabelecido pelo governo, o comitê interministerial deverá elaborar uma primeira minuta do projeto de lei que definirá a Política Nacional sobre Mudança do Clima até 11 de janeiro de 2008, bem como a versão preliminar do Plano Nacional, que deverá ser concluída até 30 de abril do ano que vem.
Segundo o que foi apresentado durante a reunião do Fórum, o Plano Nacional de Combate às Mudanças Climáticas estará apoiado em quatro eixos: mitigação, adaptação aos efeitos da mudança do clima, pesquisa e desenvolvimento, e capacitação e divulgação. O CIM ficará responsável por propor ações prioritárias de curto prazo, promover a articulação internacional para a troca de experiências e transferência de tecnologia e ainda identificar fontes de recursos para a implementação da iniciativa, entre outras responsabilidades.
Desmatamento e etanolApesar dos trunfos políticos, o governo brasileiro certamente terá que responder a pelo menos duas grandes críticas internacionais durante o encontro de cúpula da ONU em Bali. A primeira delas diz respeito à retomada da intensidade do desmatamento registrada em quase todos os estados da Amazônia no segundo semestre deste ano. A segunda é sobre a pressão que a expansão dos cultivos destinados à produção de etanol ou biodiesel já estaria exercendo sobre a floresta.
O governo reconhece a retomada do desmatamento, mas afirma acreditar na reversão do quadro: “Até nesse sentido será importante a implementação do Plano Nacional de Combate às Mudanças Climáticas”, afirma João Paulo Capobianco. Sobre a ameaça do etanol e do biodiesel, o governo segue firme na promessa de que a expansão da cana-de-açúcar e das oleaginosas não contribuirá ainda mais para a destruição da floresta: “Não vamos permitir a introdução dos biocombustíveis na Amazônia. Não tem nenhum sentido produzir cana-de-açúcar lá”, disse Lula, em recente encontro com empresários alemães.
(Por Maurício Thuswohl,
Agencia Carta Maior, 25/11/2007)