O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC em inglês), divulgado neste ano, não deixa dúvidas: o aquecimento da temperatura média da Terra e as mudanças ambientais globais são uma realidade que não poderemos evitar, pois é decorrente de emissões passadas de gases causadores do efeito estufa (GEE). Abordar esse assunto é um grande desafio, tendo em vista que a questão, até recentemente, estava restrita à comunidade científica, governos nacionais e ambientalistas. Agora é preciso traduzir a linguagem técnica dos especialistas para a sociedade civil, para que esta possa expor suas demandas e se posicionar frente às políticas públicas começam a ser implementadas nessa área.
No conjunto de desequilíbrios responsáveis pelo aquecimento global, as cidades figuram como consumidores de 75% do total de energia e produzem 80% dos GEE. Apesar da baixa qualidade de vida de regiões metropolitanas e grandes centros urbanos, as pessoas continuam migrando para as cidades, sendo hoje verdade que 50% da população mundial estão concentradas em centros urbanos. Estas populações ocupam apenas 2% da superfície da Terra. Apesar da controvérsia científica em relação às causas do aquecimento global, essa pressão antrópica sobre o planeta e seus recursos tem contribuído para o aumento da intensidade das mudanças globais. Dessa forma, a discussão sobre mudanças climáticas nas cidades é fundamental para discussão do que pode ser feito para minimizar o processo de mudanças globais, incluindo o aumento da temperatura média e as mudanças no clima.
Seguindo uma tendência internacional, alguns municípios e estados brasileiros já estão desenvolvendo ações para a mitigação das causas e dos impactos dessas mudanças. Entre as principais iniciativas de governos subnacionais podemos destacar o Estado do Amazonas, o Estado e o município de São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro, entre outras. Entre as principais medidas que estão sendo adotadas por essas cidades estão a criação de fóruns municipais (e/ou Estaduais) de mudanças climáticas, a elaboração de inventário de emissões de GEE, a discussão de plano de enfrentamento das mudanças climáticas, além de investimentos para a ampliação do transporte público e da arborização urbana, saneamento e tratamento de resíduos sólidos e melhoria da qualidade do ar e da água. Algumas ações são simples, tanto economicamente como estruturalmente. Porém, a maioria, envolve grandes investimentos para obras de infra-estrutura e equipamentos públicos.
A questão central é que as principais medidas para controlar o aquecimento global decorrem de articulações supranacionais que apresentam altos custos sociais, econômicos e financeiros, sendo mais caro para alguns do que para outros. As negociações serão demoradas, custosas e deverão ser feitas com cuidado já que estes custos irão alterar as condições de competitividade de regiões, países e/ou setores da economia no mercado internacional. Todavia, ainda há medidas simples que se baseiam fundamentalmente em ações educativas e de mudanças de comportamento. Todas, no entanto, precisam ser implantadas conjuntamente, unindo governos, setor privado e comunidade.
Portanto, no processo de sustentabilidade das cidades há muitas iniciativas importantes, mas parece que muitos governantes, políticos, empresários e investidores ainda não perceberam o grande potencial de desenvolvimento econômico e social oferecido pela necessidade de mudança dos padrões atuais de funcionamento das cidades. Há uma economia a ser movida, principalmente na produção de equipamentos adequados à produção de energia de fontes renováveis, à conservação e reúso da água, no manejo e reaproveitamento dos resíduos sólidos, na construção de vias e veículos para a mobilidade urbana, de forma a reconstruir as cidades em outros padrões de urbanismo condizentes com as necessidades dos novos tempos.
(Por Rafael D´Almeida Martins *, Envolverde, 21/11/2007)
* Rafael D´Almeida Martins é formado em Administração Pública (FGV-EAESP) e doutorando em Ambiente e Sociedade na Universidade Estadual de Campinas (NEPAM/IFCH/Unicamp). Diretor-executivo do Centro de Estudos e Pesquisas em Políticas Sociais e Qualidade de Vida (CEPPS).