O Espírito Santo volta ao coronelismo. Esse é o entendimento de diversas entidades capixabas sobre a carreata realizada contra os quilombolas por fazendeiros do norte do Estado na última sexta-feira (9). As entidades, que apóiam a política do governo federal sobre os quilombolas do país e sobre os indígenas no Estado, publicaram nota de repúdio ao racismo dos fazendeiros.
A carreata reuniu centenas de manifestantes entre fazendeiros e apoiadores. Os manifestantes foram prontamente recebidos pelo presidente da Assembléia Legislativa, Guerino Zanon (PMDB), a quem entregaram manifesto contra a titulação dos territórios quilombolas. Os fazendeiros contam com apoio da Aracruz Celulose, das empresas alcooleiras da região e do governador Paulo Hartung, além de parlamentares estaduais e federais.
As entidades que se manifestaram contra a carreata dos fazendeiros titularam sua nota como “Em defesa da vida e da dignidade humanas!” Nela, afirmam que “a política adotada pelo governo federal para a promoção da igualdade racial tem buscado fazer justiça com os quilombolas e também indígenas, que no Brasil sempre foram deixados à margem da sociedade e tratados como inferiores”.
Lembram que “existe uma dívida histórica com estes povos e que parte desta política tenta acertar: a demarcação de territórios. O reconhecimento oficial de territórios quilombolas e indígenas é uma demanda das comunidades e o que o governo federal tem buscado – demarcando áreas - é tão somente fazer justiça”.
Segue afirmando que “os negros e índios resistiram há séculos de massacres, escravização, preconceito, desrespeito à suas culturas e à condição de serem, como todos nós, humanos. À base de muitos sacrifícios, conseguem agora sonhar com a possibilidade de o Estado corrigir os erros do passado”.
E que “no Espírito Santo, entretanto, parece que voltamos no tempo e assistimos a um movimento reacionário e conservador de parte da elite do campo, movimento este que converge com os interesses de empresas multinacionais latifundiárias, que fazem da terra não um bem para produção de alimento e perpetuação da vida, mas um fim exclusivo de obtenção de lucro”.
As entidades afirmam que “ao contrário do capital privado, o que indígenas, quilombolas, camponeses e pequenos agricultores têm com a terra é uma relação sagrada e harmoniosa. Para eles, a terra é vida, é acolhimento, é sustentabilidade!”
Denunciam o governo Paulo Hartung apontando: “Apesar dos discursos oficiais do governo do estado que o Espírito Santo vive um novo momento, assistimos em pleno século 21 ao fortalecimento do coronelismo, um tempo de ameaças, de coerção e uso do poder contra os mais fracos”.
Seguem afirmando: “Os proprietários de terra no norte do Espírito Santo se uniram contra indígenas e quilombolas e têm promovido passeatas e atividades para protestar contra a demarcação oficial de terras para estas comunidades. Usam também o método de buscar apoio nos poderes Legislativo e Executivo, inclusive no Senado Federal, aonde têm respaldo de senadores capixabas”.
As entidades se reportam à carreata da sexta-feira (9), considerando a mobilização “mais uma tentativa de perpetuar o preconceito e a injustiça. Tudo com aval do governo do Estado, que oferece espaço para diálogo com estes proprietários, mas nunca aceitou sentar para conversar com as comunidades indígenas e quilombolas”.
Para finalizar: “As entidades dos movimentos sociais capixabas e seus simpatizantes repudiam qualquer discurso e prática racista que tentam jogar a sociedade contra os que de fato sempre foram injustiçados neste País”.
Assinam o documento o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra, o Movimento Nacional de Direitos Humanos/ES, o Centro de Apoio aos Direitos Humanos Valdício Barbosa dos Santos, a Pastoral Metodista de Convivência com o Povo Guarani, a Rede Alerta Contra o Deserto Verde, o Instituto Portas Abertas (IPA), além de pessoas físicas.
(Por Ubervalter Coimbra,
Século Diário, 12/11/2007)