Medidas devem ser apresentadas antes da reunião da ONU em dezembro; plano de mudanças climáticas fica para 2008Ministério quer financiar mitigação, adaptação e pesquisa com R$ 500 mi ao ano vindos de fundo pago por empresas de petróleo
O Plano Nacional de Mudanças Climáticas, prometido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas Nações Unidas em setembro, não ficará pronto antes de meados de 2008. O governo corre agora para fechar um conjunto de medidas pontuais contra o aquecimento global a tempo de divulgá-las antes da conferência da ONU sobre o clima de Bali, em dezembro.
O pacote deve incluir a criação de uma rede de pesquisas em mudanças climáticas e um centro internacional de monitoramento por satélite de florestas tropicais, a ser coordenado pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
A principal novidade, no entanto, é uma proposta do MMA (Ministério do Meio Ambiente) para uma política nacional de mudanças climáticas. Um anteprojeto de lei que a estabelece será entregue a Lula na próxima terça-feira (13/11). Ele prevê a destinação de mais de R$ 500 milhões por ano para ações em quatro eixos: mitigação, adaptação, pesquisa e desenvolvimento e divulgação.
O dinheiro sairia do Fundo de Compensação do Petróleo, uma espécie de seguro-fiança ambiental pago por empresas petrolíferas ao governo. A verba é normalmente destinada a cobrir riscos decorrentes da exploração do óleo, como vazamentos. A idéia do ministério é destinar 70% desse fundo, que atualmente gira em torno de R$ 1 bilhão por ano, a ações contra o aquecimento global.
"Como a mudança climática é um risco do uso do petróleo, achamos que o Congresso concordará em alterar a lei para permitir usar esse recurso", disse à Folha o secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco. Ele afirma que algumas ações de controle do desmatamento na Amazônia, energia alternativa e estímulo à eficiência energética poderiam ser financiadas por esse fundo já no ano que vem.
Se a proposta for aprovada por Lula, afirma o secretário, ela poderá ser levada a consulta pública antes da reunião de Bali e então enviada ao Congresso Nacional para apreciação.
Marco adiadoO governo corre para evitar um vexame e ter o que exibir na reunião de Bali, daqui a quatro semanas. No encontro, representantes de 180 países começarão a decidir como o mundo combaterá o efeito estufa depois de 2012, quando o Protocolo de Kyoto expira.
O Brasil é um dos cinco maiores poluidores do planeta e peça fundamental nas negociações do regime pós-Kyoto. O país vem sendo criticado por não ter até agora se mexido para criar uma política nacional de combate ao efeito estufa.
A China, segundo maior emissor e geralmente vista como maior vilã do clima do Terceiro Mundo, já estabeleceu um plano de metas de eficiência energética e uso de energias renováveis. E até o minúsculo São Tomé e Príncipe, cujo PIB é menos de um centésimo do brasileiro, já elaborou sua estratégia de adaptação ao clima.
O plano nacional do Brasil, que incluiria medidas domésticas de redução do desmatamento -e cuja promessa de conclusão "para breve", em setembro, foi comemorada pelo secretariado da ONU como "um marco significativo"-, não pôde ser elaborado. Nas palavras de uma autoridade do governo, um plano demandaria antes uma política nacional. E isso o Brasil ainda não tem.
Grupo de trabalhoNo lugar do plano, Lula deve baixar um decreto que estabelece a estratégia para a elaboração de um plano, sob coordenação da Casa Civil.
Uma versão preliminar do documento foi obtida pela Folha e analisada, a pedido do jornal, por Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace. Ele a criticou.
"Gastar sete páginas de papel e o tempo investido nisso para marcar uma reunião mostra a seriedade com que o governo está tratando o tema."
Ele diz que o esboço de decreto é "um retrocesso". "A única coisa que está assegurada aqui é que o desenvolvimento econômico não será afetado", afirmou. "Essa era a posição brasileira em 1972 em Estocolmo [primeira conferência ambiental da ONU]. Isso indica que nós estaremos olhando para trás e não para a frente."
(
Folha, 10/11/2007)