Dois dados divulgados ontem mostram de maneira precisa o abismo que existe entre vontade e realidade quando o assunto é emissão de gases de efeito estufa. Um relatório das Nações Unidas indica que as emissões de gás carbônico de 40 países industrializados atingiram em 2005 seu segundo maior nível desde 1990. Ao mesmo tempo, uma pesquisa de opinião encomendada pela rede BBC diz que a maioria dos cidadãos de 21 países se dispõem a pagar mais impostos para reduzir o uso de petróleo e carvão.
O relatório sobre as emissões foi compilado pela Convenção do Clima das Nações Unidas e obtido pela agência de notícias Reuters. Ele mostra que as emissões dos chamados países do Anexo 1 (que têm metas obrigatórias de redução previstas pelo Protocolo de Kyoto) chegaram a 18,2 bilhões de toneladas de CO2 em 2005, contra 18,1 bilhões no ano anterior.
A cifra é apenas 2,8% menor que o recorde histórico de emissões, atingido em 1990: 18,7 bilhões de toneladas. Naquele ano, no entanto, nenhum dos mecanismos internacionais para combater o aquecimento global, como a própria convenção e o Protocolo de Kyoto, estava em vigor.
Puxando o bloco do Anexo 1 estão Estados Unidos e Rússia. O primeiro, maior poluidor do mundo (seguido de perto pela China), viu um aumento de 7,19 bilhões de toneladas de gás carbônico em 2004 para 7,24 bilhões em 2005. Washington afirma, no entanto, que em 2006 suas emissões caíram 1,3% apesar do crescimento econômico, sinal de que a chamada intensidade energética -ou o total de carbono emitido por dólar gerado no PIB- caiu no país. Na Rússia, o crescimento foi de 2,09 bilhões para 2,13 bilhões de toneladas de CO2.
Sacrifício pessoalQuem confronta esses dados com os de uma pesquisa de opinião cujo resultado foi divulgado ontem no Reino Unido pode ter a impressão de que está falando de planetas diferentes. A pesquisa ouviu 22.182 pessoas em 21 países (incluindo várias nações industrializadas e gigantes do Terceiro Mundo, como o Brasil) e concluiu que 83% delas acham que o combate ao aquecimento global exigirá sacrifícios pessoais. O mais impressionante: metade se dispõe a fazer esse sacrifício, pagando impostos adicionais sobre energias muito poluentes, como os combustíveis fósseis.
O apoio ao imposto do carbono como forma de reduzir o consumo de petróleo e carvão foi ainda maior (cresceu para 77%) quando os entrevistadores informavam que o dinheiro seria investido no desenvolvimento de energias mais limpas e/ou mais eficientes.
Sob encomenda da rede de notícias estatal britânica BBC, o instituto GlobalScan e a Universidade de Maryland ouviram pessoas nos cinco continentes, em países como EUA e Austrália, que rejeitam Kyoto, e Itália e França, que o apóiam.
Os maiores defensores de um imposto sobre os combustíveis fósseis foram justamente os cidadãos da China, país que mais cresce em emissões no planeta (e o que mais sofre com a poluição urbana): 85% dos chineses disseram que impostos sobre energias sujas são uma forma eficiente de desencorajar o seu uso e 97% deles os pagariam felizes caso as taxas fossem aplicadas em energia limpa. O Brasil, país dos biocombustíveis, foi um dos maiores opositores ao imposto do carbono: 55% dos brasileiros ouvidos se opuseram inicialmente à taxa, contra 51% dos americanos.
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Folha de São Paulo, com Reuters, 06/11/2007)