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gestão de florestas públicas
2007-11-05
Mudanças propostas para o Código Florestal quanto à recuperação de áreas degradadas da reserva legal colocam em risco a manutenção de serviços ambientais essenciais para a sociedade e os sistemas produtivos

A contribuição do plantio de espécies exóticas visando à restauração de ecossistemas naturais nos biomas brasileiros para compor as áreas de reserva legal é praticamente nula para a conservação da biodiversidade.  Essa é a conclusão de um estudo realizado por cientistas da Conservação Internacional (CI-Brasil) compilado na 5ª edição da revista eletrônica Política Ambiental.  Em “Áreas recuperadas com vegetação exótica contribuem para a conservação da biodiversidade?”, os pesquisadores avaliam uma série de trabalhos que mostram a incapacidade das culturas de plantas exóticas em proteger a biodiversidade.

A motivação da análise foi uma recente proposta de alteração do Código Florestal brasileiro que objetiva permitir, a proprietários rurais que não têm em suas terras a reserva legal exigida por lei, o uso de espécies exóticas para a recuperação de áreas degradadas.  Reserva legal é um instrumento incluído na legislação ambiental brasileira que diz que parte da propriedade rural não pode ser desmatada e dever ser mantida para proteção da vegetação nativa e, consequentemente, da biodiversidade.  O Código Florestal (Lei 4.771/65) define o tamanho da área de reserva legal conforme a região onde a propriedade se localiza.

Função social
De acordo com a constituição brasileira, toda propriedade rural no país tem que cumprir sua função social, destaca Ricardo Machado, diretor do programa Cerrado Pantanal da CI-Brasil e um dos autores do estudo.  Ele lembra que isso acontece a partir de um conjunto de fatores, que vão desde o aproveitamento racional da propriedade e o respeito às relações de trabalho visando ao bem-estar humano até a utilização correta dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente.  “A reserva legal é uma forma de garantir a sustentabilidade econômica, social e ambiental da propriedade.  Assim, a idéia é usar menos a terra para poder usá-la sempre”, explica.

A preservação ambiental nas propriedades rurais também é preconizada na Lei de Política Agrária, que em vários artigos menciona a necessidade de proteção do meio ambiente e recuperação ambiental de áreas degradadas.  Para Machado, a proposta de mudança no Código Florestal, que possibilitaria ao dono de uma propriedade rural com passivo ambiental lançar mão do plantio de espécies exóticas para a recuperação da área, vem dificultar que aspectos essenciais da função social da propriedade sejam cumpridos.  “A experiência mostra que áreas com exóticas pouco contribuem para a manutenção da biodiversidade.  Isso só faz sentido se o objetivo é recuperar áreas degradadas com finalidade puramente econômica”.

Literatura nacional e global
Ao longo do ensaio, os autores citam estudos que avaliaram a riqueza de espécies da fauna nativa comparando diferentes ambientes, segundo a presença ou ausência de vegetação exótica.  Em 1996, um trabalho sobre a ocorrência de aves na região do rio Doce em Minas Gerais em remanescentes nativos, eucaliptais com sub-bosque nativo e eucaliptais limpos revelou que poucas espécies da fauna nativa conseguem sobreviver em monoculturas de eucalipto.  Segundo o estudo, espécies mais exigentes e geralmente consideradas indicadoras da qualidade ambiental desaparecem dessas áreas, onde a perda de espécies chega a 67%.  Dois anos depois, estudo semelhante no Parque Estadual do Rio Doce apontou que apenas 22 das 149 espécies de insetos e aranhas presentes na mata nativa sobrevivem nos eucaliptais.

No Cerrado, pesquisa realizada em 2000 comparando o número de espécies de aves no cerrado nativo e em áreas de pastagens mostrou que 78% das espécies não ocorrem nos ambientes artificiais, que também registraram apenas três das 10 espécies endêmicas.  Estudos em plantios de cacau na Indonésia e no sul da Bahia indicam que a perda da biodiversidade nos cultivos – incluindo os sistemas agroflorestais – é significativa, com uma redução de cerca de 60% das plantas nativas.  “Uma menor riqueza de espécies em ambientes artificiais pode ser responsável por uma maior incidência de pragas, pois as populações de predadores também são reduzidas”, alerta Machado.  “Espécies que sobrevivem em monoculturas sem serem controladas pelos predadores naturais podem acarretar sérios prejuízos econômicos”.

Sustentabilidade ambiental
Os autores do estudo chamam a atenção para o fato de que a mudança proposta no Código Florestal não irá resolver o principal problema da agropecuária brasileira: a insustentabilidade ambiental.  “O Código Florestal é uma legislação completa e moderna.  Sabemos que ele ainda não é cumprido em muitas partes do país, mas não por isso devemos afrouxar a lei e ceder aos interesses puramente ruralistas, da produção a qualquer custo”, esclarece Paulo Gustavo do Prado Pereira, diretor de Política Ambiental da Conservação Internacional e também autor do estudo.  Para ele, a reserva legal cumpre os objetivos definidos na legislação brasileira quando é totalmente composta por ecossistemas originais.  “Sem fiscalização e monitoramento, entretanto, a propriedade deixa de cumprir sua função social e não garante o desenvolvimento sustentável brasileiro.  Para o melhor cumprimento da lei, o poder público tem que aprimorar esses processos e identificar mecanismos financeiros que estimulem o proprietário a enquadrar-se na lei, como por exemplo, via pagamento pelos serviços ambientais prestados à sociedade por meio da reserva legal”.

Para ver o texto na íntegra, clique aqui.

(Conservation International / Amazonia.org, 31/10/2007)

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