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2007-11-05

As substâncias biologicamente ativas das plantas medicinais são exploradas desde a origem da humanidade. No Brasil, estudos sobre química de produtos naturais chegaram com os portugueses e se consolidaram com os conhecimentos tradicionais dos indígenas.

Mas, nos últimos 20 anos, uma forte tendência da indústria farmacêutica mundial aponta para uma maior diversificação das fontes produtoras desses princípios ativos.

“O mar também abriga uma imensidão de biodiversidade que, mesmo ainda pouco explorada pelos cientistas, tem permitido que a riqueza biológica dos microrganismos seja transformada em diversidade química para o tratamento de doenças”, disse Vanderlan Bolzani, professora do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), à Agência FAPESP, durante o 58º Congresso Nacional de Botânica, realizado na semana passada em São Paulo.

Segundo ela, essa fonte marinha começou a ser explorada de forma sistemática há menos de 50 anos, em especial pelos Estados Unidos e países da Europa. Nas últimas duas décadas, surgiram mais protótipos de medicamentos elaborados a partir de microrganismos marinhos do que de espécies vegetais.

“Mas, se analisarmos historicamente, foram lançados no mercado muito mais fármacos a partir de plantas, ainda que a maior parte dessas substâncias ativas tenha sido isolada há muitos anos e suas estruturas moleculares tenham sido modificadas para a melhoria de medicamentos existentes”, explicou.

Para ela, é inegável que a química de produtos naturais no Brasil tem forte relação com as plantas, levando em conta o tamanho e a riqueza dos biomas do país. “Mas nosso mar também é uma Amazônia azul. A grande vantagem é que uma mesma espécie marinha, sob condições ambientais diversas e de estresse, pode produzir muitas substâncias diferentes dependendo do tipo de cultivo”, disse Vanderlan.

O estímulo à produção de fármacos a partir de microrganismos marinhos é feito ainda, segundo a pesquisadora do Núcleo de Bioensaios, Biossíntese e Ecofisiologia de Produtos Naturais da Unesp, por marcos regulatórios estabelecidos nos últimos anos em convenções internacionais de biodiversidade que limitam, com base em protocolos de extração, a coleta de espécies vegetais em florestas de todo o mundo.

Nesse cenário favorável à riqueza biodiversa dos oceanos, Vanderlan destacou um novo analgésico para dores crônicas desenvolvido em 2005 a partir da toxina do caracol marinho Conus magnus. Trata-se do ziconotide, cuja substância ativa, o ômega-conotoxina, é considerada a primeira inovação para o tratamento de dor crônica desde a descoberta da morfina, em 1804.

“Esse foi o primeiro produto marinho com atividade extremamente forte para o tratamento da dor. O resultado é que, depois de mais de 200 anos, temos um produto competitivo à analgesia pela morfina, demonstrando que esse novo nicho de mercado, ao lado dos produtos naturais, está ganhando seu espaço”, disse a professora da Unesp.

Força natural

Outro participante do congresso, Emerson Queiroz, gerente científico em pesquisa e desenvolvimento da Aché Laboratórios Farmacêuticos, citou dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) que indicam que mais de 80% da população mundial faz uso de plantas medicinais para o tratamento de enfermidades. “E mais de 30% das drogas prescritas por médicos de países desenvolvidos são de origem natural”, afirmou.

Segundo ele, há alguns anos a indústria farmacêutica mundial achava que tudo seria resolvido pela síntese química, ou seja, que novos medicamentos seriam produzidos apenas com a sintetização de moléculas para obtenção dos princípios ativos. Mas os modelos naturais voltaram a ter papel de destaque na corrida em busca de tratamentos.

“Os grandes laboratórios estão voltando atrás e reconsiderando o potencial farmacológico dos produtos naturais, a exemplo da pilocarpina, medicamento que teve origem na flora brasileira”, disse Queiroz. Extraído das folhas da planta jaborandi (Pilocarpus microphyllus), ele é usado principalmente no tratamento do glaucoma.

“É extremamente complicado sintetizar a molécula da pilocarpina e, por isso, dependemos da planta. A pilocarpina existe há 110 anos e conta hoje com diversas aplicações, como para o combate à xerostomia (boca seca), um dos efeitos colaterais enfrentados por pacientes em tratamento oncológico”, conta.

Os palestrantes mencionaram ainda a importância científica do 1º Congresso Internacional sobre Produtos Naturais, que, de 4 a 7 de novembro, em São Pedro (SP), discutirá e apresentará pesquisas que vão desde a fase de coleta de plantas na natureza até o lançamento de medicamentos no mercado.

O evento, organizado pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), reunirá pesquisadores do país e do exterior que desenvolvem estudos sobre potencial terapêutico das plantas, fármacos e conservação do meio ambiente. “Esse será um evento marcante para as pesquisas químicas sobre a biodiversidade brasileira”, disse Vanderlan Bolzani.

Mais informações: http://bcnp.ufscar.br

(Por Thiago Romero, Agência Fapesp, 05/11/2007)


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