Respirar ar puro não é apenas uma aspiração idílica de quem sonha com uma vida longe dos poluídos centros urbanos. Poucos sabem que essa pode ser uma das saídas para garantir uma vida mais longeva e saudável. Uma pesquisa inédita realizada no Estado indica que a poluição tem efeitos desastrosos para o organismo e pode estar na origem de doenças neurodegenerativas das quais até agora não havia suspeita de sua colaboração.
Ao reproduzir em laboratório os efeitos da exposição a poluentes na saúde humana, a farmacêutica Ana Claudia Tedesco Zanchi descobriu que as partículas ultrafinas, oriundas da queima de combustíveis fósseis da Capital, penetraram pelo nariz de ratos e causaram danos ao cérebro. Após 30 dias, os animais estavam mais lentos do que aqueles que não inalaram poluentes.
- Já se sabia que a poluição era capaz de alcançar os pulmões, prejudicando principalmente alérgicos e asmáticos. Nossa dúvida era se os agentes poluentes conseguiriam penetrar mais profundamente. Agora, sabemos que sim - explica Ana Claudia, que realizou o estudo com a supervisão dos pesquisadores da Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre Claudia Rhoden e Paulo Saldiva, da Universidade de São Paulo (USP).
Durante a análise do que poderia ter influenciado o comportamento dos ratos, Ana Claudia descobriu que as células de duas regiões cerebrais - o estriado (responsável pela motricidade) e o hipocampo (envolvido com a memória) - tinham sofrido um processo chamado de lipoperoxidação, semelhante ao que ocorre quando uma manteiga fica rançosa.
A poluição causou um aumento dos radicais livres, moléculas que se formam naturalmente no organismo mas que, quando em excesso, danificam e matam as células, acelerando o envelhecimento e abrindo o flanco para o aparecimento de doenças. Há décadas, a ciência sabe que o tabagismo, a radiação e os raios solares provocam esse desequilíbrio na produção de radicais livres. A poluição das grandes metrópoles é a mais nova a integrar o ranking dos vilões.
Na próxima parte do estudo, ainda em andamento, a pesquisadora gaúcha está interessada em saber quais danos sofre o cérebro de ratos que nasceram e foram criados em ambientes poluídos. A hipótese é a de que os metais presentes nas partículas poluentes de grandes cidades - como ferro e cobre, entre outros - estejam relacionados a problemas comportamentais em crianças. No ano passado, um estudo realizado pelo professor de Medicina da USP Paulo Saldiva, orientador de doutorado de Ana Claudia, mostrou que, em ambientes poluídos, nasciam mais fêmeas do que machos.
- O verdadeiro agressor é o estilo de vida moderno. Estamos todo o tempo expostos aos fatores de risco que geram um desequilíbrio no organismo e dão origem a doenças. A sociedade vai precisar encontrar saídas - avalia a professora de Nutrição da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Cileide Cunha Moulin, doutora em bioquímica.
(Por Sílvia Lisboa,
Zero Hora, 27/10/2007)