“O Conselho Indigenista Missionário... quero fazer essa denuncia aqui de pronto... quero que fique aqui nos anais e quero chamar o representante do Conselho Indigenista Missionário, que são terroristas, queria chamá-lo aqui para debater conosco... não tem coragem de vir debater conosco. Por quê? Estão fazendo sem-vergonhice. Quem sabe lá o que é o Cimi, para quem está nos assistindo. É o Conselho Indigenista Missionário. Tem um nome nesse negócio, chama-se Antonio Brand, que é o cara que fica inventando aldeia indígena pra tudo que é canto...”
A fala é do deputado Paulo Correa (PR), durante sessão da Assembléia Legislativa do Mato Grosso do Sul no último dia 2 de outubro. O deputado criticou a atuação do Cimi acusando a entidade de incitar os índios a tomarem atitudes violentas contra propriedades rurais que fazem divisa com aldeias ou que são alvos de processos de demarcação. O que o deputado esqueceu foi de relatar a verdadeira situação das populações indígenas no estado.
A recente declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas aprovada pela ONU, em setembro, deve ter estragado o sono de quem quer impor sua vontade aos habitantes do planeta. Afinal de contas ali está claramente reconhecido o direito dos mais de 370 milhões de nativos em mais de 70 países do mundo às terras-territórios e aos recursos naturais neles existentes, e à livre determinação, com autonomia e dignidade, conforme seus valores, costumes e organização social. O que, aliás, o Brasil já reconheceu em sua Constituição de 1988.
O Mato Grosso do Sul não está fora do planeta Terra, nem do Brasil. Portanto as leis e normas nacionais e internacionais deveriam ser cumpridas. Ou seja, os povos indígenas deveriam ter suas terras já demarcadas e garantidas há muito tempo, pois a Constituição determinou que isso fosse feito até 1993. Por que não se cumpriu a lei maior do país? As conseqüências estão aí. Entre os Kaiowá Guarani se instaurou um verdadeiro processo de genocídio.
E para piorar a situação agora vem a gigante onda verde da cana e do dólar para instalar mais de 50 novas usinas, plantar mais de 850 mil hectares de cana, quase tudo na região dos Guarani, e muitos em “tekoha”, ou seja, terras tradicionais Guarani. Para se ter uma idéia do descalabro da estrutura fundiária e suas conseqüências perversas, a Terra Indígena Dourados, com uma população de mais de 12 mil Kaiowá Guarani e Terena, tem uma população maior do que 32 municípios do estado, conforme publicação do IBGE no Diário Oficial de 5/10/2007. Portanto a terra do gado, da soja e agora da cana, não tem lugar para índios, quilombolas, trabalhadores rurais sem terra...
As estratégias e conseqüências estão claramente demonstradas no caso de Kurusu Ambá, no município de Coronel Sapucaia. Os índios foram brutalmente expulsos, lideranças assassinadas, outras presas e rapidamente condenadas a 17 anos e meio de prisão. Tudo isso por estarem buscando o que a Constituição, Convenção 169 da OIT e a Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas da ONU lhes garantem, que é sua terra para viver em paz.
Cabe então perguntarmos onde está o terrorismo? Quem são os verdadeiros terroristas?
(Por Egon Heck,
Cimi-MS, 18/10/2007)