Os contratos entre as organizações da sociedade civil (ONGs) e os governos não são construídos com base em regras claras. São burocráticos, atrapalham a atuação das entidades idôneas e possibilitam fraudes com a conivência dos próprios governos (estaduais, municipais e federal).
“As ONGs, muitas vezes, são utilizadas como laranjas, para fazer caixa dois em campanhas políticas”, afirma Tatiana Dahmer, assistente social e diretora da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), que conta com cerca de 280 membros.
Para ela, a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), no início deste mês, é importante para investigar irregularidades na aplicação de recursos públicos. “A malversação de dinheiro público está em diversos campos”. Porém, ela espera que a iniciativa também sirva para dar visibilidade a entidades “sérias”, que “não podem ser prejudicadas com a generalização da corrupção”.
A falta de fiscalização por parte governo federal é apontada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) como uma das justificativas para irregularidades no repasse de recursos pelos ministérios às ONGs. Embora, Dahmer concorde com o argumento, destaca que o problema está no modelo de convênio. “São as coisas mais soltas e burocráticas que existem”.
As incoerências segundo ela, estão nas regras de repasse e nas formas de atuação das ONGs, “que funcionam como parte da administração direta”. “Elas [ONGs] atuam onde o Estado não está presente, quando deveriam fortalecer a formação para cidadania e ajudar a mobilizar pela garantia dos direitos”, afirma Dahmer.
Como exemplo de burocratização, cita procedimentos como a criação de Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) por instituições no interior do país e a exigência de documentos “desnecessários” para prestação de contas. “Deveria ser analisado o produto final e não se cobrar um recibo do cara que, de burro sem rabo, carregou um determinado equipamento”, disse.
Segundo Dahmer, no atual modelo de prestação de contas, “o Estado não consegue provar a roubalheira”. Por outro lado, quando a entidade é realiza as atividades conforme o previsto “têm dificuldade apresentar os resultados e os balanços”, completa.
Além da revisão das normas dos convênios, Dahmer defende que o governo divida com a sociedade a função de fiscalizar, monitorar e avaliar as entidades. “O dinheiro não é do governo mas de toda a sociedade, que deve saber como ele é utilizado”. Com isso, a corrupção por parte dos governos também ficaria evidente.
Na terça-feira (23/10), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das ONGs do Senado decidiu investigar as entidades que tenham recebido acima de R$ 200 mil por ano entre 1999 e 2006. Segundo o presidente da CPI, senador Raimundo Colombo (DEM-SC), cerca de 250 organizações não-governamentais (ONGs) estão nessa situação.
(Por Isabela Vieira,
Agência Brasil, 24/10/2007)