O Pleno do Tribunal de Justiça deferiu, no dia 22 de outubro, o pedido de liminar requerido pelo Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) para suspender a aplicação da Lei Municipal nº 542/2007, de Governador Celso Ramos, que regulamentou a "brincadeira do boi" no município. A lei previa que os grupos organizadores deveriam cadastrarem-se junto ao órgão competente da Prefeitura, para que pudessem ser responsabilizados civil e penalmente caso ocorresse dano à integridade física do animal.
"Apesar de o legislador municipal ter se preocupado com a integridade física dos animais, constata-se que a chamada 'brincadeira do boi' pode resultar em efetiva violência contra os animais", sustentou o relator da ação, Desembargador Nelson Schaefer Martins, acolhendo entendimento do MPSC. O magistrado considerou que, se a lei não fosse suspensa, estaria aberta a possibilidade de submissão dos animais a tratamento cruel.
A liminar foi deferida em ação direta de inconstitucionalidade (ADI) proposta em junho de 2007 pela Promotora de Justiça Cristina Costa da Luz Bertoncini, da Comarca de Biguaçu. Ela sustentou na ação que a lei municipal afronta o preceito estabelecido pelo artigo 182, inciso 3, da Constituição Estadual, que versa sobre o dever do Estado de defender e preservar o meio ambiente e a vedação de práticas que submetem os animais a crueldades. "Mesmo com o respeito às limitações impostas pela lei, o fato de soltar o boi e persegui-lo em grupo, incitando-o durante um longo espaço de tempo, inevitavelmente caracterizará a crueldade, o sofrimento desnecessário", afirmou a Promotora na ação.
A lei previa ainda que o evento ocorresse em local aberto, porém delimitado, e com percurso demarcado, de modo a evitar que o animal invada casas e estabelecimentos comerciais. Veículos motorizados estariam proibidos de participar da brincadeira. Outros aspectos regulamentados na lei municipal agora suspensa foram o tempo máximo de duração da brincadeira, que deveria ser de duas horas, e a exigência de atestado de aptidão do animal para a corrida emitido por médico veterinário.
Na ação, o Ministério Público recordou ainda que a deflagração de processo legislativo para normatizar a farra do boi não é novidade. A lei estadual nº 11.365, de 4 de abril de 2000, foi promulgada nos mesmos moldes da lei municipal de Governador Celso Ramos. No artigo 1º da norma estava expressamente prevista a vedação de tratamento cruel com o animal e de perturbação da ordem pública. Apesar da preocupação demonstrada pelo legislador estadual, a lei n° 11.365/00 foi declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF) também já se manifestou sobre o tema e julgou inconstitucional a farra do boi. "A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da Constituição Federal, que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade", sustentou o ministro Marco Aurélio de Mello em julgamento ocorrido em 1997. (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2007.024362-5)
(Ascom MP-SC, 22/10/2007)