O prefeito Marlon Santos está dando hoje um dos passos mais corajosos da história de Cachoeira do Sul na tentativa de retomar os serviços de água e esgoto para o Município. Com um decreto de intervenção, a Prefeitura está tirando da Companhia Rio-grandense de Saneamento (Corsan) o poder de administração dos serviços e o dinheiro recebido mensalmente nas mais de 22 mil faturas de contas de água, o que rende mensalmente mais de R$ 1,3 milhão.
Na prática, a Corsan está perdendo a concessão e passando a ser uma mera prestadora dos serviços, já que poderá dar continuidade ao trabalho respeitando a intervenção do Município. “Se a Corsan quiser bater em retirada, tudo bem. Existem 400 empresas no Brasil que estão dispostas a vir imediatamente para Cachoeira dar continuidade a este serviço”, exagera Julio Mahfus, procurador jurídico do Município. Para o consumidor, a qualidade na prestação do serviço não será alterada.
Como já estava previsto, o secretário municipal de Obras, Hélio Mercadante, será o interventor. Ontem ele disse que irá esperar 24 horas para que a Corsan seja notificada do decreto e depois fará a primeira visita, tendo o poder de delegar ordens e requerer documentos. O chefe do gabinete de relações da Corsan com os municípios, Júlio César Fagan Faccin, ainda sem conhecer os termos do decreto de intervenção, disse na noite de ontem que a documentação será analisada muito bem antes de ser aceita ou não. “O combinado era um interventor para buscar dados. Não tratamos nada sobre entregar a administração ou recursos. Se isso for constatado, provavelmente vamos buscar nosso direito na Justiça”, ponderou Faccin, lembrando que a decisão será tomada pelo presidente da estatal, Mário Freitas.
OBJETIVO Os planos do prefeito Marlon Santos de tomar o poder que está com a Corsan estão sendo alimentados desde o início de sua administração. O objetivo é fazer com que uma maior parte dos lucros obtidos com os serviços de água e esgoto fique em Cachoeira do Sul. A indignação do prefeito Marlon Santos é justamente na forma de investimentos da companhia, onde os lucros de uma cidade são usados para obras em outras, o chamado subsídio cruzado. Para assumir os serviços, o primeiro passo oficial da Prefeitura no Governo Marlon foi tomado no início de 2005, quando um interventor foi nomeado para montar um dossiê revelando os números do sistema. Sustentando a denúncia de que a Corsan maquiou os números, revelando faturamento menor do que realmente ocorre, Marlon afirma que o superávit da estatal em Cachoeira do Sul gira na casa de R$ 500 mil.
ImportanteNa briga pelos lucros do serviço de água e esgoto de Cachoeira do Sul, o passo seguinte deverá ser dado pela Corsan, que poderá entrar na Justiça para anular a intervenção da Prefeitura. Caso confirmado esse procedimento e ele tenha êxito para a Corsan, o Município terá que recorrer. A briga judicial poderá demorar anos, onde a vantagem poderá mudar de lado conforme a vontade da Justiça.
ATENÇÃOO decreto de intervenção da Prefeitura na Corsan está na página 17 desta edição. Simultâneo ao processo de intervenção, a Prefeitura está com uma comissão de advogados trabalhando para fundamentar a anulação do contrato de concessão que foi assinado no dia 24 de dezembro de 2004 pelo então prefeito Pipa Germanos. O argumento mais forte é de que o documento clandestino foi assinado sem a abertura de licitação para entrega de concessão e sem o aval da Câmara Municipal.
UMA PERGUNTAComo a Prefeitura pretende gerenciar o dinheiro das contas de água?A Corsan continuará cobrando as tarifas, mas obrigatoriamente terá que depositar os valores em uma conta aberta pela Prefeitura no Banrisul. Com exclusividade, o Município irá administrar o recebimento das receitas. Além de contar e usar o dinheiro, a Prefeitura terá como listar os bens e instaurar uma auditoria contábil para verificação de débitos e créditos. A prestação de contas será mensal para o prefeito e para o Tribunal de Contas do Estado (TCE).
O que diz o decreto de intervenção> A Prefeitura irá assumir e administrar a partir de hoje o sistema de água e esgoto de Cachoeira do Sul, passando a controlar o pessoal, o material, os equipamentos, os bens e as operações necessárias à prestação dos serviços aos usuários.
> A intervenção não suspende a concessão, permanecendo em poder da Corsan todos os direitos e obrigações, sendo que a administração temporária e a fiscalização passam a ser feitas pela Prefeitura. Com isso, a Corsan fica afastada do exercício das funções administrativas da unidade de Cachoeira do Sul.
> A Corsan poderá permanecer nos serviços de operação técnica das áreas das estações de coleta e tratamento de água e estação de tratamento de esgoto. A intervenção será pelo prazo máximo de 180 dias.
> A Prefeitura poderá interferir para assegurar que os recursos arrecadados com as tarifas cobradas dos cachoeirenses sejam direcionados para suportar custos e investimentos exclusivamente no sistema de Cachoeira do Sul, sem que ocorra evasão de valores para outros municípios.
> Além do interventor, Hélio Mercadante, a Prefeitura está nomeando uma comissão processante que irá auxiliar no processo administrativo. A comissão é composta pelo contador Gilson Bolsin (secretário municipal da Fazenda), pelo administrador de empresas Nícolas Furlan e pelo técnico em contabilidade Ademar Scherer Lopes, que também são funcionários da Prefeitura.
> As considerações sobre o serviço da Corsan em Cachoeira do Sul e a concessão que ela alega ser válida no Município são colocadas em xeque pelo Município no decreto de intervenção. Além da legalidade do contrato, que foi assinado clandestinamente sem o processo de licitação, o Município aponta possíveis falhas no tratamento da água.
> A Prefeitura denuncia que a Corsan não conta com responsáveis técnicos habilitados na área de química para fiscalização permanente da qualidade da água tratada e distribuída à população. A falta desses responsáveis é encarada como uma grande deficiência no controle de qualidade, causando risco de contaminação de consumidores e do meio ambiente.
> A tarifa cobrada dos usuários de Cachoeira do Sul, segundo estipulação contratual, foi implementada pela Corsan de forma universal em todos os municípios do Rio Grande do Sul. Esse procedimento é considerado ilegal, pois vem prejudicando a população cachoeirense, visto que o sistema local não recebe investimentos, atualizações ou melhorias significativas há vários anos.
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Jornal do Povo, 23/10/2007)