O presidente do Equador, Rafael Correa, criticou os países que são principais causadores da mudança climática e se negam a reduzir o uso exagerado de combustíveis, durante sua intervenção, na semana passada, no Encontro Internacional Clima Latino. O mandatário afirmou que a Organização das Nações Unidas deveria apresentar uma lista das “nações que estão acabando com nosso planeta, desses terroristas ambientais que, por sua ambição e hiperconsumismo, vão acabar com a vida na Terra”. Correa lamentou que a injustiça “tenha se globalizado produto do aquecimento global porque os países pobres, não responsáveis pela tragédia, são afetados em maior grau por não terem a capacidade de responder a desafios de tais dimensões”.
O Encontro Internacional sobre Mudança Climática na América Latina, que terminou quinta-feira na capital equatoriana, fez 21 recomendações de manejo ambiental sobre os governos da região. Essas recomendações, elaboradas em painéis e mesas de debate por cientistas, técnicos, ativistas e autoridades, se referem a manejo de fontes de água, florestas, energia, lixo, transporte público e ordenamento urbano, entre outros temas. O secretário-geral da Comunidade Andina de Nações (CAN), Freddy Ehlers, disse à IPS que as sugestões que surgiram dos diferentes encontros serão expostas na Conferência das Partes da Convençao Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, que acontecerá em dezembro em Bali, na Indonésia.
“A idéia é que isto sirva para que a América Latina consolide uma posição conjunta na reunião de Bali e na cúpula de presidentes da região e da União Européia de maio próximo na cidade de Lima”, afirmou Ehlers. Uma das propostas que teve maior impacto nos mais de 1.500 presentes à reunião foi a apresentada pelo vice-presidente do Equador, Lênin Moreno, que é de não explorar o petróleo deste país em troca de compensações internacionais. Em junho, o governo equatoriano propôs renunciar à exploração petrolífera do bloco ITT, localizado na reserva ecológica do Parque Yasuní, no noroeste do país, em troca de uma compensação econômica da comunidade internacional de, pelo menos, 50% dos recursos que deixariam de ser recebidos.
O bloco ITT tem reservas provadas e prováveis de aproximadamente 920 milhões de barris de petróleo, que representam mais de 20% do total das reservas petrolíferas do país, estimadas em 4,2 bilhões de barris. Sua exploração significaria renda anual estimada em US$ 720 milhões. A proposta se concretizaria através de um fundo para a conservação que contemplaria várias fontes de financiamento, como doações de governo a governo, troca e perdão de dívida externa bilateral e multilateral, contribuições de organizações não-governamentais, colocação no mercado internacional de certificados de petróleo não explorado e contribuições da sociedade civil.
Um assunto que causou muita preocupação na reunião foi a revelação de que a agricultura andina está em risco pelo acelerado degelo das montanhas, provocado pelo aquecimento global. No Equador, Peru e na Bolívia desapareceram nos últimos 30 anos mais de 20% das geleiras, devido à mudança climática, segundo estudos apresentados no encontro. “Há um grave efeito devido a redução das geleiras das montanhas no Peru, Equador e na Bolívia, e isto tem conseqüência para a disponibilidade da água e, sobretudo, na agricultura da área andina”, afirmou Luisa Elena Guinand, coordenadora da Clima Latino.
Por causa deste fenômeno, em 25 ou 30 anos faltará água em várias regiões dos Andes, o que terá um efeito direto nas comunidades camponesas e indígenas que vivem da agricultura e nas cidades que consomem os produtos cultivados por elas. Em muitas regiões agrícolas e cidades andinas se obtém água de fontes de montanha. Paa Ehlers, não há solução para a mudança climática se não se conscientizar a população de que a responsabilidade é de todos. “Esta geração tem a grande oportunidade para um novo renascer se deixar de lado a cobiça e o interesse apenas pelo dinheiro”, afirmou.
Ehlers lamentou que a riqueza do mundo tenha triplicado, mas que as pessoas não sejam mais felizes porque a riqueza serviu para destruir o planeta. Correa exortou os governos do mundo, e particularmente da América Latina, a fazerem um “pacto universal de sobrevivência” para combater a mudança climática e os danos ao meio ambiente. O mandatário insistiu que é preciso modificar o conceito de desenvolvimento, porque o atual não é sustentável e destruiu o entorno, afirmou.
“Não precisamos apenas lutar contra a mudança climática, mas também buscar outro conceito, outra noção de desenvolvimento. O que hoje conhecemos como tal é simplesmente impossível de generalizar, não é sustentável”, afirmou Correa. Para enfrentar os danos, deve-se frear os “inusitados e arbitrários níveis de consumo de países do mal chamado maior desenvolvimento”, acrescentou. “Não podemos seguir a prática de uma economia baseada na pressão da competição e da rentabilidade no mais curto tempo possível, porque por trás dessa mascara se escondem os impactos ambientais de maior gravidade”, concluiu.
O encontro que começou na cidade costeira de Guayaquil na segunda-feira passada e continuou na quarta-feira e quinta-feira em Quito, foi organizado pelos dois municípios e pelo CAN, e terminou com um ritual de purificação da Terra.
(Por Kintto Lucas,
IPS, 22/10/2007)