É necessário buscar outras soluções para não construir as cinco grandes hidrelétricas projetadas pela companhia HidroAysén na Patagônia chilena, diz nesta entrevista ao Terramérica o diretor-executivo da Associação de Empresas e Profissionais para o Meio Ambiente (AEPA), Fernando Ávila. Este advogado está convencido de que as empresas podem “compatibilizar” a rentabilidade econômica com a proteção do entorno. Por isso, se entusiasma ao falar das novidades em matéria de produção limpa apresentadas em Santiago durante a primeira Reunião para o Meio Ambiente da América Latina, realizada de 17 a 20 deste mês, pela AEPA e outras duas instituições.
Fundada em 1999 e integrada por 70 empresas prestadoras de serviços ambientais e oito embaixadas, a AEPA é “uma ponte entre a autoridade e as companhias produtivas”, segundo Ávila. Seu interesse pelo desenvolvimento sustentável surgiu quando foi diretor de Projetos do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa, com sede em Lisboa. Após 22 anos nesse continente, retornou ao país em 1997, quando já havia sido aprovada a Lei de Bases do Meio Ambiente, que a seu ver marcou “um antes e um depois” no Chile, porque obrigou as empresas a apresentarem estudos de impacto ambiental (EIA). Hoje é necessário criar um “centro público-privado de tecnologias do meio ambiente, que tenha autoridade técnica para dirimir conflitos”, afirmou.
A seguir, um extrato do diálogo mantido em Santiago.
Terramérica - Que grau de conflito o senhor vê hoje entre as empresas e as comunidades por questões ambientais?
Ávila - Alto, mas não porque a situação esteja pior do que antes, mas porque agora há responsabilidade na cidadania e existe o sistema de EIA. Antes de 1994 não sabíamos qual era o impacto da atividade da empresa. Não é que agora haja mais conflitos, e sim que agora são conhecidos. Por um lado é preocupante. Por outro, é bom que sejam conhecidos, porque podemos resolvê-los.
- O senhor vê algumas empresas deliberadamente atuando mal?
- Não, não. Uma ou duas em cem. Antes, alguns agiam mal por ignorância, mas agora há capacitação, vão a feiras no exterior, sabem como solucionar os problemas. Ainda há muitas coisas a fazer, mas estamos avançando. Tampouco se deve dizer que no Chile não se respeita o meio ambiente, que no Chile tudo está sendo destruído.
- Por que a sociedade civil deveria confiar nos EIA se, uma vez aprovados, ainda ocorrem desastres ecológicos? Por exemplo, em 2004 morreram centenas de cisnes no Rio Cruces, resultado de dejetos lançados pela fabrica de celulose Arauco e Constitución.
- Aí há um déficit de fiscalização do Estado. Deve-se buscar um sistema para fiscalizar. Não se trata de contratar três mil ou cinco mil inspetores que se convertam em funcionários. Pode-se buscar soluções modernas ou alternativas, que existem na Europa. Por exemplo, validar ou certificar consultores que se convertam em fiscalizadores para o Estado, cujo trabalho dure determinado período.
- A ministra de Meio Ambiente, Ana Lya Uriarte, reconhece que a fiscalização sempre é perfeccionista, mas sugere que a primeira responsabilidade é da empresa.
- Não digo que o problema seja de apenas um lado, mas se o inspetor do colégio não existisse, na hora do recreio as crianças fariam o que bem entendessem. Saber que o fiscalizador existe, é real e faz seu trabalho, ajudaria. Mas, é verdade que fazer um EIA é fazer um contrato, e aí eu falaria de bons e maus, ou seja, falaria dos que cumprem, que são a maioria, e dos que não cumprem, que são dos que mais se fala.
- O que pensa do questionado projeto da companhia HidroAysén de construir cinco represas na Patagônia?
- Não vou falar pela AEPA. Considero que há outras soluções possíveis para não construir as centrais. Se fosse para alimentar o sul, talvez estivesse tudo bem, mas fazer uma rede de cabos cruzando dois mil quilômetros para trazer mais energia a este monstro que é a Região Metropolitana, é uma falta de respeito com o país.
- O que pensa da Estratégia Nacional de Bacias em preparação pelo governo e que delimitaria os projetos empresariais a determinadas áreas?
- Ficamos sabendo que existiria um Conselho de Bacias, onde estariam representados os setores público e privado. Como você bem disse, se restringiria os projetos porque a gestão das bacias não é apenas o recurso natural da água, mas também o ordenamento territorial, o fomento produtivo, a vocação do território. Portanto, haverá algumas atividades que poderão ser realizadas de acordo com estes parâmetros e outras que não. Isso permitirá o desenvolvimento das regiões. É uma oportunidade de ordenar os cômodos desta casa chamada Chile.
(Por Daniela Estrada,
IPS, 22/10/2007)