O despejo do esgoto doméstico nas águas da Lagoa da Conceição, além de grave problema ambiental, é também resultado de outras sérias questões existentes na região. A principal é a ocupação desordenada - clandestina e irregular - que se intensificou nos últimos anos.
Segundo o presidente do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica da Lagoa da Conceição, Alécio dos Passos Santos, a degradação da região começou nos anos 1970, após as inaugurações da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), do Aeroporto Hercílio Luz e de melhores acessos rodoviários.
- Conheci a Lagoa com vida total, no final dos anos 1960. Em 1950, havia 3,5 mil habitantes, no final da década de 1960, 10 mil, e hoje são 35 mil. A Lagoa virou moda, a taxa de crescimento é de 10% ao ano. Um metro quadrado custa de R$ 700 a R$ 1 mil - comenta ele.
Um levantamento da Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram) indica que, entre janeiro e setembro deste ano, foram emitidos 63 autos de infração na Bacia da Lagoa da Conceição, a maioria por construções clandestinas em áreas de preservação permanente (APPs).
- Na Ilha (de Santa Catarina) toda, há uma pressão muito grande sobre essas áreas. Tanto por parte dos que têm poder quanto dos que não têm. O número de fiscais ainda não é suficiente para atender a essa demanda toda - afirma o gerente de fiscalização do órgão, Gilson de Oliveira.
Dos autos de infração, 29 foram na Costa da Lagoa, acessível apenas de barco, onde os fiscais têm mais dificuldade para apreender materiais de construção, devido à resistência da população e dos barqueiros.
- Os barcos são os mesmos alugados pelo pessoal que leva o material para construir. Há pessoas de bom poder aquisitivo construindo ilegalmente ali - acusa Oliveira.
Além das construções em APPs, outro problema são as obras irregulares - o que inclui projetos aprovados pela prefeitura e depois alterados e casas ampliadas sem autorização.
Acordo para despoluição é parcialmente cumprido
Para tentar resolver essas questões, em 2002 o município de Florianópolis, a Fatma e a Casan assinaram acordo que previa medidas para a despoluição e preservação da Lagoa.
O acordo foi resultado de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal. Segundo a procuradora da República Analúcia Hartmann, ele está sendo cumprido aos poucos. Um dos maiores problemas é a falta de fiscalização.
- A maior dificuldade que temos são com as ligações clandestinas. Há uma fragilidade da Vigilância Sanitária, dificuldade de conseguir os cadastros da prefeitura. Eles têm justificado o fato de não fazer vigilância nos restaurantes e bares dizendo que têm que cumprir liminares no Estreito, em Ponta das Canas, e que não têm pessoal - critica ela.
Para a procuradora, falta muito para que a situação seja resolvida.
- Estamos atacando, fazendo as reuniões no Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (sobre o novo plano diretor), tentando discutir as questões. Nessa região é muito difícil, estão tentando usar o plano para regularizar o que não é regular.
Ampliação da rede de esgoto seria necessária
O assessor da Vigilância em Saúde Ambiental da Secretaria municipal da Saúde, Naro Pereira Ramos, por sua vez, argumenta que o órgão atua, principalmente, mediante denúncia e que tem como questões prioritárias as que envolvam a saúde pública.
Ele defende a atuação conjunta dos órgãos ambientais e diz que a resolução do problema depende da ampliação da rede de coleta de esgoto.
- Fazemos ações no Canto da Lagoa, saímos, e o problema retorna. Existe a necessidade de ampliação e adaptação da rede. E de conscientização das pessoas, para que se liguem à rede ou desenvolvam sistemas individuais de tratamento.
Para o presidente da Associação dos Moradores da Lagoa (Amola), Aurélio Oliveira, a poluição envolve ainda outras questões.
- A inauguração (da ampliação da estação de tratamento da Casan) vai amenizar (o problema de esgoto), mas poluição não é só saneamento. Tem também detergente, fezes de animais, tinta de embarcações. Além do investimento da Casan, a Vigilância Sanitária e a população têm que ter respeito e fazer a cobrança.
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Diário Catarinense, 21/10/2007)