A finlandesa Kaarin Taipale, conselheira da ONU, participou da Ecolatina na capital mineira e percebeu que o transporte público é problemáticoA sétima edição da Ecolatina, realizada em Belo Horizonte na última semana, reuniu cerca de 5.200 pessoas, entre palestrantes e autoridades públicas de 31 países da América Latina e Europa. Entre os especialistas no tema meio ambiente estava a finlandesa Kaarin Taipale, uma das maiores especialistas mundiais em construção e desenvolvimento sustentável. Além de ser conselheira da Organizações das Nações Unidas (ONU) sobre os assuntos, Kaarin Taipale é pesquisadora em urbanismo e professora do Centro de Pesquisa em Conhecimento e Inovação da Escola de Economia de Helsinki, capital da Finlândia.
Com a experiência de quem já conheceu 55 países no mundo, ela falou a O TEMPO uma característica de Belo Horizonte que a impressionou: a quantidade de carros. Na entrevista abaixo, a especialista critica o excesso de veículos da capital mineira - uma média de um carro por cada 2,4 habitantes -, avalia o que viu de certo e errado por aqui sob a ótica do desenvolvimento sustentável e também fala de suas experiências.
O TEMPO - O que mais lhe chamou a atenção em Belo Horizonte frente ao preocupante problema do aquecimento global?
Kaarin Taipale - Sem dúvida foi a quantidade imensa de carros e também de ônibus circulando na cidade. Os veículos são um dos grandes emissores de gases nocivos à atmosfera. Pude perceber que o transporte público de vocês é um grande problema a ser resolvido. Se ele não funciona bem, a tendência é de que mais pessoas optem por usar o carro.
Qual sugestão você daria à administração pública para minimizar esse problema?
É preciso investir em outros meios de transporte como o metrô, mais rápido, menos poluente. Essa talvez seria a melhor solução.
O metrô existe em Belo Horizonte, mas é um serviço precário. O governo federal tem projetos, mas ainda faltam recursos financeiros para ampliá-lo. Ainda assim é possível reduzir o número de carros nas ruas da cidade?
Perfeitamente possível. Se não há dinheiro para tocar obras do metrô, é preciso agir com inovação. Um bom exemplo no transporte público do Brasil é o de Curitiba, creio. Lá introduziram no sistema ônibus mais longos e pontos de embarque com calçadas mais altas, além de haver pistas completamente exclusivas para o tráfego deles. Sem contar nas rotas ampliadas. Aqui em Belo Horizonte, vi algumas dessas faixas, mas com o tráfego compartilhado com carros, o que não resolve nada. Devia se dar mais prioridade aos ônibus. Onde fosse possível até proibir o trânsito de carros pequenos em algumas vias em determinados horários.
Na sua avaliação, que outros aspectos, além do excesso de veículos na cidade, contribuem para a degradação do meio ambiente?
A pobreza. Porque prejuízos ao meio ambiente e os problemas sociais andam juntos. Onde geralmente há miséria também existe algum tipo de problema com o meio ambiente. Seja em Belo Horizonte ou em outros locais do Brasil, assim como em outros países subdesenvolvidos, esse é o grande agravante. Um exemplo drástico disso, que pude observar aqui, são famílias vivendo sem saneamento básico às margens de córregos. O pior que não é um problema exclusivo daqui, basta lembrar que quase 2 bilhões de pessoas em todo mundo ainda vivem sem tratamento de esgoto e um bilhão sofrem com a falta de água potável sobretudo na África.
Dentro do conceito de sustentabilidade e de fontes renováveis de energia, em que o Brasil deveria passar a investir mais ?
Vocês moram num país tropical, ensolarado na maioria do ano, mas o aproveitamento da energia solar aqui ainda é muito pouco difundido. Os governantes precisam criar mais políticas públicas de incentivo ao uso dela. Em Barcelona, por exemplo, que não tem o mesmo clima ideal daqui, 60% das casas já contam com aquecedor solar.
Em Belo Horizonte, estamos em época de chuvas e uma das preocupações da prefeitura é com a ocorrência de enchentes. Na cidade, muitas pessoas infelizmente ainda têm o hábito de jogar lixo em qualquer lugar. Como resolver esse problema?
É uma resposta difícil. Isso é um problema de atitude, cultura e de educação também. Um assunto para as escolas tratarem junto das crianças desde cedo. Quanto aos adultos, posso citar o exemplo da cidade de Cingapura. Lá, quem joga até um chiclete no chão é multado. Acho extremista demais essa solução, mas um caminho para inibir os sujões.
(
O Tempo, 22/10/2007)