Após quase 20 anos de discussão, chega à Câmara dos Deputados o projeto de lei que busca estabelecer uma Política Nacional de Gestão de Resíduos Sólidos. A nova diretriz Federal ditará as regras que deverão ser seguidas pelos demais níveis de governo e pela sociedade, trazendo grandes mudanças para o setor.
O documento é composto por 33 artigos, distribuídos em sete capítulos, que tratam de resíduos sólidos urbanos, industriais, rurais, de saúde e os chamados especiais, como entulhos da construção civil. O texto aborda questões polêmicas como a logística reversa, que exige das empresas o compromisso com o destino final de seus produtos pós-consumo. Segundo Luciano Zica, secretário de Recursos Hídricos e Ambientes Urbanos do Ministério do Meio Ambiente, este será o instrumento principal da nova política.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao enviar o projeto ao Congresso, convocou o sociedade brasileira a participar das discussões e conhecer as novidades contidas na lei. O envolvimento do cidadão é fundamental, pois a política nacional, apesar de parecer algo distante do dia a dia, poderá influenciar diretamente no cotidiano do consumidor, das empresas e das demais instâncias de governo. “O sucesso da aprovação do projeto e principalmente de sua implementação no futuro, depende da participação do cidadão comum e da sociedade organizada”, explicou Luciano Zica.
O documento apresentado pelo Poder Executivo vai passar agora pela sabatina do Congresso. “O Presidente da Câmara deverá montar um grupo de trabalho informal para analisar a proposta nos próximos meses”, explica o secretário. A idéia é promover a discussão sobre os diferentes aspectos do projeto e fazer as alterações que os deputados julgarem necessárias, após suas argumentações. A expectativa do secretário é que o texto final da nova lei seja aprovado até o final do ano.
Apesar do otimismo, no entanto, mesmo depois de aprovada a lei ainda precisará ser regulamentada. O projeto enviado à Câmara apresenta um texto bastante conciso, com diretrizes gerais. Se por um lado o texto simplificado facilita a compreensão da proposta, bem como a sua aprovação, por outro, deixa margem a dúvidas, além de amplo espaço para negociações. Por isso, as definições das formas de aplicação da Lei, que serão feitas após a sua aprovação, serão fundamentais para determinar a “cara” final do projeto, que ganhará as ruas.
“O cidadão precisa estar bem informado e atento durante todo o processo, pressionando o congressista que elegeu, principalmente durante a regulamentação da lei”, explica Elisabeth Grimberg, coordenadora da área de Ambiente Urbano do Instituto Pólis e coordenadora geral do Fórum Lixo e Cidadania da Cidade de São Paulo. “A chance desse projeto não virar uma lei só no ‘papel’, cresce com o conhecimento da sociedade”, concorda Luciano Zica.
O primeiro passo para garantir a participação do cidadão no processo político de aprovação e regulamentação da Nova Política é conhecer seu conteúdo e suas implicações.
O que muda com a nova lei
Somos todos produtores de lixo. Cada ato de consumo gera, por fim, um resíduo, cujo descarte precisa ser analisado com cuidado, de modo a evitar prejuízos à saúde e ao meio ambiente. A Política Nacional de Gestão de Resíduos Sólidos pretende agir justamente nesse ponto.
A proposta define responsabilidades ao longo da cadeia produtiva e de consumo, e tem como objetivo estimular a redução, reutilização, reciclagem, tratamento e destinação correta dos resíduos, ao estabelecer que o fabricante ou importador seja responsável pela retirada de seus produtos do meio ambiente, ao final de seu ciclo de vida. Essa é uma mudança radical na forma de gerenciar o lixo no país, onde até hoje o poder público é o maior responsável pela destinação do lixo.
A coleta seletiva, bem como o posterior tratamento dos recicláveis, deverá ser feita prioritariamente contratando associações ou cooperativas de catadores formadas por pessoas de baixa renda. Dessa maneira, o governo pretende estimular o trabalho dos catadores e ampliar seu leque de atividades.
Além da logística reversa, outro mecanismo importante da nova legislação é a análise do Ciclo de vida do produto, descrita em seu parágrafo 11. “A análise do ciclo de vida avalia o produto do berço ao túmulo, desde a coleta de matéria-prima até o resíduo final, pensando todo o processo” descreve Elisabeth. Segundo a Coordenadora do Instituo Polis, para que o conceito efetivamente funcione como instrumento de política pública, é preciso definir parâmetros e indicadores que permitam fazer comparações entre produtos, considerando todo o seu percurso, para então decidir o que é melhor para o ambiente e para as pessoas que nele vivem.
A análise, no entanto, só poderá ser feita se todos os setores da sociedade tiverem ao seu dispor informações suficientes sobre os impactos sociais, ambientais e econômicos de todo o processo produtivo de um determinado bem, assim como de seus equivalentes. Ou seja, é preciso avaliar diferentes alternativas de materiais e formas de produção e não só o produto final. “Para isso é preciso existir um diálogo mais profundo com o setor produtivo, se antecipando até mesmo à aprovação da lei”. Essa é uma contrapartida que precisa ser oferecida pelo setor produtivo para que a nova política possa atingir seus objetivos, acredita Elisabeth.
Outro ponto de discussão da nova política do governo é a distribuição de recursos financeiros para os investimentos em serviços de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos “Os municípios terão que estabelecer seus planos de gestão integrada para poder receber recursos federais”, explica o secretário Luciano Zica. Os pequenos municípios, cerca de 80% do total do país, poderão associar-se e elaborar programas de planejamento regional, baseados nos consórcios, para viabilizar a composição de seus programas. Por esse raciocínio, os planejadores regionais poderão se unir para a construção de um aterro sanitário que atenda vários municípios, por exemplo.
A lei define ainda a proibição da importação de produtos que prejudicam o meio ambiente, sem, no entanto, listar quais são esses artigos. “Quem conseguir provar que seu produto não é danoso poderá importá-lo”, diz Luciano Zica.
O projeto não determina punições específicas aos infratores em nenhum ponto do texto, mas vincula o descumprimento de suas regras às da rígida legislação ambiental vigente no país. “Quem cometer um crime contra essa lei será punido pela lei de crimes ambientais”, define o secretário.
O projeto da Nova Lei está disponível na íntegra para a consulta pública no site do Congresso Nacional – Projeto de lei 1991/2007 - e no do Ministério do Meio Ambiente. No site da Câmara o consumidor pode cadastrar-se e receber via e-mail as notícias sobre o desenrolar do Projeto. Os endereços são http://www2.camara.gov.br/proposicoes e www.mma.gov.br/port/conama/processos/44F758C5/Proposicaoo01Final.doc
Estar informado e acompanhando o desenrolar do processo de aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, separar o material reciclável e pensar em formas de diminuir a quantidade de lixo produzida diariamente – evitando jogar fora o que ainda está bom ou escolhendo produtos com embalagens recicláveis, por exemplo – são ações positivas, ao alcance do consumidor consciente, e que contribuem diretamente para melhorar o ambiente em que vivemos, no presente e para os que estão por vir.
(Envolverde/Instituto Akatu, 19/10/2007)