O presidente alemão adverte países industrializados quanto à exploração de monoculturas para biocombustíveis, enquanto ONGs alertam para o aumento da miséria e da fome em países africanos. "O Direito à Alimentação" é o lema deste ano do Dia Mundial da Alimentação, que se realiza a cada 16 de outubro. A data celebra a criação da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), sediada em Roma.
Na ocasião, o presidente alemão Horst Köhler advertiu os países industrializados quanto à resolução de seus problemas energéticos à custa dos países subdesenvolvidos. "Monoculturas para a fabricação de biocombustíveis não são a resposta adequada ao problema das mudanças climáticas", afirmou Köhler em Roma.
Aproveitando o ensejo, a ONG Ação Agrária Alemã e o Instituto Nacional de Pesquisas sobre Políticas Alimentares (IFPRI), com sede em Washington, divulgaram o Índice da Fome Global e advertiram, na última sexta-feira (12/10) em Berlim, quanto a um aumento dramático da miséria e da fome, principalmente em países africanos.
Esforço político e maiores investimentosPela segunda vez, a ONG alemã e o instituto norte-americano divulgaram o índice que mede a evolução de cada país quanto à "Redução da miséria e da fome pela metade" e à "Diminuição da Mortalidade Infantil", que constam das Metas do Milênio da ONU. Segundo Ingeborg Schäuble, presidente da ONG, o índice deste ano mostra que, em 36 países, a fome assumiu proporções alarmantes e que as metas não serão atingidas sem enorme esforço político e sem disposição para maiores investimentos.
Em pior situação estão os países ao Sul do Saara, explica Doris Wiesmann, especialista do IFPRI. "Ali, segundo as atuais tendências, somente seis dos 42 países poderão cumprir as metas programadas para 2015."
Em último lugar, aparece o Congo (antigo Zaire). Burundi e Libéria estão também longe de atingir as metas. "Guerras e empobrecimento fizeram com que o Índice da Fome Global nestes países subisse às alturas", explica Wiesmann. Moçambique, Gana e Malawi seriam, no entanto, "uma luz no fim do túnel", tendo conseguido diminuir consideravelmente este índice desde 1990.
Bom caminhoO Índice da Fome Global aponta que os países do Sudeste Asiático não conseguirão estar "a caminho de atingir as Metas do Milênio" antes de 2025. Apesar do intenso crescimento econômico de muitos países, principalmente na Índia, as melhorias ali realizadas não seriam proporcionais ao imenso crescimento econômico, do qual não se beneficiam as classes menos privilegiadas.
Em países como Índia, Nepal, Bangladesh e Paquistão, costumes culturais e o baixo status social das mulheres levaram a uma taxa recorde de deficiência alimentar infantil. "Nestes países, 44% de todas as crianças abaixo dos cinco anos são mal nutridas, mais do que em qualquer outra região do mundo", explica Wiesmann.
Segundo os resultados da pesquisa, o leste da Ásia, Oceano Pacífico, Caribe e América Latina seriam as regiões que estariam "a caminho" da redução da fome pela metade e da diminuição da mortalidade infantil. No leste asiático, destacam-se a China, onde a taxa de pobreza caiu consideravelmente através de medidas de apoio à agricultura e de combate à deficiência alimentar, e a Coréia do Norte, país onde o Índice da Fome Global teria piorado devido ao extremo isolamento, má administração e altos gastos militares.
Argentina, Chile, Cuba, UruguaiAs pesquisas da Ação Agrária Alemã e do IFPRI constataram que a América Latina é a região do globo que está mais à frente quanto ao cumprimento das metas. Devido a seu excelente sistema de saúde e a acertadas reformas agrícolas, Cuba, em particular, estaria com certeza em um bom caminho. A Argentina aparece em primeiro lugar entre os países latino-americanos e em segundo entre os 119 países investigados pela pesquisa.
Apesar de haver melhorado consideravelmente sua posição, o Brasil ainda está atrás da Argentina, Chile, Cuba, Uruguai e quase empata com o México em seu Índice da Fome Global, que caiu pela metade desde a década de 1980. No discurso de abertura do Dia Mundial da Alimentação, Jacques Diouf, presidente da FAO, mencionou o Brasil como um dos países em que o compromisso governamental com o "Direito à Alimentação" tem sido implementado com sucesso.
Lula e KöhlerDiferentemente do presidente brasileiro, que afirmou há poucos meses em um jornal africano que a produção de biocombustíveis poderia gerar empregos, podendo assim vir a ajudar no combate à fome, o presidente alemão e antigo diretor geral do FMI, Horst Köhler, advertiu os países industrializados a não tentarem resolver seus problemas energéticos à custa dos países subdesenvolvidos.
Em seu discurso na FAO, em Roma, Köhler afirmou que monoculturas poderiam agravar a carência de água nas regiões de plantio e elevar o preço de produtos básicos como trigo e milho. "A bioenergia não deve prejudicar a segurança nutricional", apontou Köhler.
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Deutsche welle, 15/10/2007)