À disposição dos executivos da Duke Energy, multinacional de energia dos EUA, sempre esteve um minucioso relatório a respeito das atividades de sua filial no Brasil. Maior investimento do grupo fora do território americano, o que por si só já justificaria um acompanhamento mais de perto, o monitoramento também ganhou corpo com o racionamento de energia de 2001 e suas conseqüentes perdas. E o prejuízo foi tão forte que, por vezes, o mercado chegou a dizer que o desejo dos americanos era mesmo o de vender as oito usinas hidrelétricas, localizadas no Estado de São Paulo e geradoras de 2,2 mil megawatts (MW), e deixar o país. A Duke comprou os ativos no processo de privatização de 1999 por cerca de US$ 1 bilhão.
Só que o tempo de prejuízos ficou para trás. E com o azul de volta aos demonstrativos financeiros, a multinacional resolveu abrir o cofre novamente e adquirir duas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) junto à DEB, a detentora dos projetos. Mais que uma simples aquisição, contudo, a investida marca o retorno da Duke aos investimentos no Brasil, fato que não acontecia desde 1999.
Mario Silva, diretor de planejamento estratégico da Duke no Brasil, prefere manter o valor da transação em sigilo. No entanto, segundo fontes de mercado, somente a cessão do projeto dessas duas PCHs, que juntas vão gerar 32 MW, provavelmente custaram perto de R$ 13 milhões. E como a intenção é tirá-las do papel em breve, quem conhece o setor afirma que a Duke precisará desembolsar mais US$ 64 milhões.
Nossa intenção é receber o sinal verde da matriz, para iniciar a construção, até o fim deste ano. Com isso, acreditamos que levaremos dois anos para erguê-las, o que as fará entrar em operação em 2010, conta o executivo da Duke no país ao Valor.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já aprovou a operação, faltando apenas formalidades.
O prazo para conclusão do processo será de 90 dias a partir da publicação de resolução da Aneel, informa a assessoria de imprensa.
Contudo, este primeiro movimento da Duke pós-privatização não é isolado. Com foco claro na geração de energia no Brasil, Mario Silva conta que a empresa já começou a fazer um inventário de um rio localizado em Minas Gerais. Com isso, poderá saber se o rio em questão tem ou não potencial para gerar eletricidade.
Este inventário tem como foco as PCHs, conta.
Bem diferente da última iniciativa que a Duke fez, desta vez, ela optou pela parceria com a brasileira Cemig. Juntas, as companhias realizaram o inventário do rio Doce em Minas Gerais e concluíram que há quatro hidrelétricas, que juntas têm capacidade para gerar 520 MW.
Mas agora é necessário dar um passo adiante. Mesmo com o inventário debaixo de braço, é preciso iniciar o projeto básico, que vai determinar se as hidrelétricas têm ou não viabilidade econômica.
Essa etapa demora entre 18 e 24 meses, afirma Mario Silva.
Toda esta nova postura da Duke no país não foi obra do acaso. Foi resultado de uma política determinada pela matriz, que deu à área internacional a possibilidade de investir US$ 1 bilhão entre 2008 e 2012. Leia-se área internacional as filiais da multinacional na Argentina, Brasil, Peru, Guatemala e El Salvador.
Mas obter o recurso não é tão simples assim. Primeiro, porque ele sairá do próprio caixa da região. E depois, porque ele não será distribuído de forma igual entre todos.
Fica com o dinheiro quem tiver os melhores projetos. Portanto, caso o Brasil tenha as melhores propostas poderá inclusive ficar com tudo. E este raciocínio vale para os demais países da região, conta o executivo.
Para o Brasil, a estratégia é clara. A filial local pretende abocanhar os recursos com iniciativas voltadas à geração de energia alternativa (PCHs, eólica e bagaço de cana-de-açúcar), hidrelétricas de médio porte (até 500 MW) e térmicas a gás natural, caso o insumo esteja à disposição.
(Maurício Capela,
Valor Econômico, 15/10/2007)