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imprensa e meio ambiente hidrelétricas do rio madeira amazônia
2007-10-15
Após uma brilhante palestra em que mostrou trechos de documentários sobre a destruição da Amazônia desde os anos 80, o documentarista britânico Adrian Cowell concedeu uma rápida entrevista ao AmbienteJÁ na noite de abertura do 2º Congresso de Jornalismo Ambiental, em Porto Alegre, na última Quarta-feira (10/10). Falou sobre as diferentes estratégias dos governos federal e do Estado do Amazonas para o combate ao desmatamento e sobre os programas de construção de hidrelétricas que se espalham por todo o país, especialmente sobre os impactos das usinas de Santo Antônio e Jirau, do Rio Madeira, licenciadas neste ano pelo Ibama. Cowell não quis criticar a ação da imprensa quanto à cobertura da mudança climática.

AmbienteJÁ – Qual a sua avaliação do programa de biocombustíveis brasileiro, considerando que o governo o está divulgando no Exterior como uma das saídas para os problemas climáticos?
Cowell – É melhor que o biopetróleo americano porque este é feito com milho, que é muito menos eficiente do que o açúcar da cana. Você gasta mais energia para fazer o etanol, no caso americano. Então, o sistema brasileiro é mais eficiente.

AmbienteJÁ – Mas para a questão ambiental brasileira, há alguma vantagem neste programa?
Cowell – (...) A vantagem do álcool [brasileiro] é que ele pode também ser feito para se beber. Então esta é a grande vantagem: a mesma fábrica fazer álcool para beber e para o carro andar.

AmbienteJÁ – Há quem diga que a cultura em tabuleiros, da cana-de-açúcar, evitaria impactos ambientais significativos... O Sr. tem opinião a respeito?
Cowell – Não tenho.

AmbienteJÁ – Que lições o Sr. aprendeu após esses anos todos gravando a destruição da floresta amazônica brasileira?
Cowell – A situação é bem melhor do que na década de 80. Naquela época, era bem pior. Eu apresentei estudos que mostram isto. É bom para avaliar a situação agora porque esta um pouco mais balanceado. Eu acho que o Brasil não está muito longe de uma solução, mas isto depende de se fazerem mais coisas e também das negociações. Se o Brasil ganhar créditos de carbono, colocará muito dinheiro dentro da sua proposta e vai mudar a razão para desmatar. A razão para desmatar, hoje, é ganhar dinheiro. E se você quer ganhar mais dinheiro deixando a floresta em pé, ninguém vai cortar. O desmatamento custa dinheiro, você precisa pagar uma equipe. Então, eu acho que está muito diferente agora, que está muito melhor.

AmbienteJÁ – O Sr. acha que o governo brasileiro tem capacidade de levar adiante essa negociação para que as florestas mantidas em pé gerem créditos de carbono, ou ele ainda está muito reticente?
Cowell – Depende da posição...o governo federal tem diferente posição do governo estadual do Amazonas. O governo estadual do Amazonas tem muito mais apoio dentro de outros países, mas o Brasil é forte e talvez vá ganhar a posição do governo federal. Quem sabe? Vocês [jornalistas] é que vão saber... o fim do debate vai ser dentro da imprensa.

AmbienteJÁ – O Brasil está divulgando bem as suas possibilidades dentro do MDL, Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Kyoto, como oportunidade de captação de recursos?
Cowell – Essas duas posições, que o governo estadual do Amazonas e o governo federal, claro, são diferentes uma da outra. A posição do governo federal é de estar um pouco com medo de tratar desse tipo de negociação com estrangeiros, de perder um pouco da soberania. Então é justo, você pode se preocupar, mas, por exemplo, a outra proposta, do Virgílio Viana [secretário de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas], não se preocupa com isto, ele quer resolver o problema com dinheiro. Também é outra posição. Vocês vão passar isso nos jornais, e alguma solução vai sair.

AmbienteJÁ – O Sr. considera que os R$ 50,00 pagos pelo Bolsa Floresta [programa instituído em junho deste ano pelo Governo do Estado do Amazonas como compensação a famílias que realizam ações efetivas para manter áreas florestais estaduais em pé] são suficientes para manter uma família ou mesmo pessoa trabalhando na floresta sem buscar meios mais rentáveis que levem á destruição dos recursos naturais?
Cowell – Eu acho que não, não é? Não em manter a pessoa, porque eles ganham dinheiro com a borracha, com a castanha, com óleos, esses tipos de coisas, mas também eles se alimentam da floresta, e das posses deles. É um início. E é claro, o Virgílio Viana estava falando [no documentário apresentado na abertura do congresso] que esse é um processo, que eles podem juntar com outro dinheiro de fora [do Exterior], e ele está tentando negar. É um processo já feito...

AmbienteJÁ – Que outras atividades econômicas podem ser sustentáveis para o desenvolvimento da Amazônia?
Cowell – Você sabe... o turismo tem coisas pró e contra... e há muitas outras coisas. Eles estão sempre abrindo o mercado. A cada ano, tem mostras da Amazônia no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. E tem várias mostras deste tipo, em outras eles colocam coisas para vender, por exemplo, chocolate de cupuaçu [fruto de árvore oringinária da Amazônia] já foi para a Alemanha... vamos ver se dá dinheiro ou não.

AmbienteJÁ – Na sua avaliação, o que a mídia está deixando de olhar com relação ao aquecimento global?
Cowell – Eu não sei disso, realmente. Quero evitar... [risos], eu não quero entrar fazendo queixas contra colegas. Então, deixa a mídia fazer o que ela quer...

AmbienteJÁ – O Sr. acha então que não cabe nenhuma crítica?
Cowell – Pode ser, mas esse é um país livre.

AmbienteJÁ – E a mídia internacional? Como o Sr. analisa a atuação da mídia internacional quanto fala em Amazônia brasileira?
Cowell – É um tipo de briga uns com os outros e com diferentes opiniões. Isso é democracia.

AmbienteJÁ – Na sua apresentação, o Sr. falou em presença maciça de ONGs na Amazônia. O Sr. avalia como positivo isto?
Cowell – Eu acho que é positivo. Porque a maioria deles... eu não conheci nenhuma que esteja em favor do desmatamento, mas talvez vá surgir algum louco, quem sabe? [risos] Tem ONGs de madeireiros feitas pelos próprios ex-madeireiros, então...

AmbienteJÁ – Nós tivemos as mortes de Chico Mendes em 1988, de Dorothy Stang, em 2005. O Sr. acha que, infelizmente, será preciso morrerem mais pessoas para se sustentarem os valores ambientais ou o governo pode fazer algo mais incisivo?
Cowell – Olha, o Darly [Alves da Silva] e o Darci [Alves Pereira, filho de Darly] ficaram chocados quando a Polícia veio atrás deles. E quando nós entrevistamos eles, o Darci se entregou como único jeito para deixar o pai dele fugir. E ao fim, a Polícia pegou eles. Eles não pensaram que era possível alguém pegar eles porque, naquela época, os fazendeiros mandantes sempre escapavam. Agora, eles todos sabem que é perigoso. Então, eles não pensam mais em matar. Veja aquela freira americana [Dorothy Stang]. O governo jogou lá [na Amazônia], eu acho que dois mil soldados. Nós filmamos isto. E todos eles [mandantes do crime] estão presos agora. O assassinato vai baixar.

AmbienteJÁ – O que o Sr. pensa das críticas contra estrangeiros na Amazônia, seja de ONGs ou de pesquisadores?
Cowell – Isso tem relação com o problema da biopirataria. Olha, não tinha um problema desses até a lei americana, eles estavam pegando alguma coisa para fazer o patenteamento [refere-se à TRIPS, Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights, ou Acordo sobre Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio, cuja aplicação encontra-se aos cuidados da Organização Mundial do Comércio, Anexo 1C ao Acordo de Marrakesh, que estabeleceu a Organização Mundial do Comércio, firmado em 15 de abril de 1994 e foi incorporado à legislação brasileira pelo Decreto 1.355, de 30 de dezembro de 1994]. Antes de existir o patenteamento, todas as plantas passavam livremente de um país para outro.

AmbienteJÁ – O governo brasileiro tem um programa de expansão hidrelétrica que está causando grande impacto ambiental. O Sr. avalia isto como positivo, mesmo sendo chamado por alguns como "energia limpa"?
Cowell – As barragens no Xingu, que o governo está querendo fazer, não funcionam o ano inteiro porque não tem bastante água. E lá em cima [desta barragem prevista] eles precisam criar outras barragens para dar mais água para os barcos abaixo poderem navegar no verão. Se a seca acontecer lá, toda a proposta para aquela barragem é ilógica, não tem defesa, porque a eletricidade vai ser menor. Então essa é uma crítica daquela proposta. Eu acho que a crítica não é contra o Brasil fazendo barragens, mas várias delas não vão agüentar secas.

AmbienteJÁ – O Sr. documentou algo a respeito da construção das hidrelétricas do Rio Madeira (Santo Antônio e Jirau)?
Cowell – Para mim, a grande pena é a pesca. Todo mundo vai pescar quando os peixes estão subindo o rio. Eu já fui lá, é uma festa bonita. Todo mundo vai e pega bastante peixe.

AmbienteJÁ – O Sr. acredita que a Bolívia, que pode ser prejudicada com as hidrelétricas do Rio Madeira, vai poder fazer alguma mudança significativa no projeto brasileiro?
Cowell – Olha, tem uma lei... não sei se é lei, mas um costume internacional para o povo em cima debater com o povo embaixo, que está bloqueando a água deles. E o Brasil dá bastante atenção às leis internacionais. Então talvez saia algum acordo ligado a isto.

(Por Cláudia Viegas e Carlos Matsubara, AmbienteJÁ, com a participação de Sérgio Pessôa Ribeiro, do Instituto Venturini para Estudos Ambientais, 15/10/2007)

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