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movimento social camponês
2007-10-15

Os pobres das zonas rurais do mundo são os mais prejudicados pela mudança climática, mas suas preocupações não estão no centro do debate público, disse em Roma o sueco Lennart Bage, presidente do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA). Porém, Bage mostra otimismo quanto a 13ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre mudança climática, que acontecerá em dezembro na ilha de Bali, na Indonésia, enviar “uma forte mensagem dizendo que nos preocupamos pela difícil situação dos pobres nas áreas rurais”.

 

Aparentemente, sua esperança não carece de fundamento. O secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, pediu a Bage e a altos representes de outras agências da ONU que fornecessem material para as discussões intergovernamentais sobre mudança climática. Bagé conversou com a IPS durante uma visita que fez a Berlim.

 

P- A mudança climática esteve no centro da reunião de alto nível convocada por Ban no final de setembro na sede da ONU e em uma conferência organizada pelo presidente norte-americano, George W. Bush. O senhor considera que a situação dos pobres das áreas rurais foi abordado de maneira adequada?
R-
Não.

 

P- Então, como vê as preocupações desse setor da população?
R-
Temos cerca de três bilhões de pessoas vivendo em áreas rurais de países em desenvolvimento. Isso é quase a metade da população do mundo. Dois bilhões e meio estão envolvidos na agricultura e um bilhão e meio são agricultores de pequena escala. Porém, um bilhão vivem com menos de um dólar por dia. Dentre o bilhão de pessoas que vivem na pobreza absoluta, 800 milhões residem em zonas rurais.
 
Isto retrata a magnitude do desafio do desenvolvimento no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Isso requer muito mais atenção, muito mais recursos e muito mais investimentos. Mas, em termos de mudança climática é preciso considerar que estas pessoas – as mais pobres, mais vulneráveis, que vivem em áreas muito vulneráveis à mudança climática – serão as que mais sofrerão. Elas terão o maior desafio para serem mais resistentes e manejar uma mudança climática profunda.

 

P- Isso significa que a brecha entre os países em desenvolvimento e industrializados aumentará mais?
R-
Espero que a comunidade mundial veja não apenas a necessidade de erradicar a pobreza para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (Estabelecidos em 2000 e tendo 2015 como prazo), mas também para investir muito mais nas áreas rurais. Esse imperativo esteve ali durante muito tempo. Mas o fato é que a ajuda oficial para o desenvolvimento (ODA) proporcionada ao setor agrícola diminuiu de modo constante. (desde o final dos anos 80 e durante a década seguinte, equivaleu a apenas US$ 7,5 bilhões, ou 14% da ODA total, comparada com quase US$ 15 bilhões, ou 25%, da ODA de 10 anos antes).

 

P- A que se deve essa queda acentuada?
R-
Essa é uma boa pergunta. Para a FIDA, temos 100% de nosso mandato envolvidos no desenvolvimento da agricultura. Também nos perguntamos por que o mundo não vê a terrível situação de um bilhão de pessoas. Provavelmente porque elas não vivem em áreas urbanas.

 

P- A FIDA tem feito o suficiente para atrair a atenção da comunidade internacional para os pobres rurais?
R-
Certamente deveríamos ter feito mais por eles. Tentamos. Mas não foram vistos, nem ouvidos, nem se investiu neles.

 

P- Os pobres que vivem em áreas rurais são os mais vulneráveis aos efeitos da mudança climática. São os menos capazes para se adaptar e enfrentá-la. Vivem em terra ecologicamente frágil: desertos, montanhas e áreas costeiras. Dependem de setores vulneráveis, como a agricultura, a pesca e a silvicultura. Também carecem de capacidade institucional e financeira para se proteger. O que se deveria fazer?
R-
Temos de compreender que, até agora, os esforços para ajudar os pobres se centraram em ajudá-los a se adaptarem à inevitável mudança climática. Mas, também que os pobres das áreas rurais podem ser sócios da comunidade mundial nos esforços para a mitigação do fenômeno. Podem prestar enormes serviços na administração dos recursos, no desenvolvimento da agricultura e no manejo das florestas. Devemos habilitá-los para serem parte da solução. Este é o grande desafio.
 
Em vista disso, espero que as negociações sobre mudança climática aconteçam na mídia para compensar os agricultores por seus serviços, administrando os recursos naturais e a maneira como estes minimizam a mudança climática.

 

P- Compensar em que sentido?
R-
Há mecanismos financeiros que são provados e desenvolvidos para dar incentivos para mitigar a mudança climática. Assim, o ponto é encontrar um mecanismo que seja suficiente e recompense os esforços que eles fazem

 

P- Quais esforços?
R-
Para manter as florestas, para cultivar alimentos de maneira sustentável.

 

P- O senhor está no cargo há mais de seis anos. Há algo que tenha aprendido nesses anos intensos à frente da FIDA?
R-
primeiro, isto confirmou minha crença de que o ponto de início de todo acontecimento para a erradicação da pobreza são os próprios pobres – homens e mulheres pobres, comunidades pobres – que é onde as pessoas têm as energias, a dedicação e a determinação de trabalhar por uma vida melhor.
 
Também é onde se obtém o conhecimento das necessidades, para que comecem as soluções. O que deveríamos fazer é ajudar os pobres em suas aspirações. Um bilhão e meio de pequenos agricultores são um valor para o mundo, porque eles podem alimentar o mundo. Eles podem ser parte de uma solução com sua dedicação, com renda. Precisamos apoiá-los, investir em suas prioridades.

 

P- Isto é reconhecido pelas instituições internacionais e multilaterais?
R-
Talvez nos discursos. Freqüentemente nosso sistema se baseia em especialistas do Norte industrializado. Nós podemos contribuir. Mas o ponto de início tem de ser o conhecimento dos habitantes do Sul.

 

P- Isso significa que o desenvolvimento é um processo que ocorre no lugar. Mas as instituições multilaterais, os especialistas do Norte, realmente estão a par dos acontecimentos e processos nos locais onde ocorrem?
R-
Precisamos ajudar, não falar. Ouvir, compreender, sermos humildes quanto à nossa própria falta de conhecimento, para nos darmos conta de que o desenvolvimento não é simplesmente unidimensional. É complexo, está muito ancorado em sociedades ricas em cultura e patrimônio.
 
A nossa é uma ajuda onde são necessários investimentos, empréstimos, educação, financiamento, introduzindo novas ferramentas para abrir o potencial da produção através dos financiamentos rurais. Há muitas ferramenta, mas devem ser usadas, precisam ser desenhadas e reunidas em programas com os usuários.

 

P- O que significa a coordenação de doadores?
R-
Mas não se trata de uma coisa ou outra. O ponto de início não é a coordenação de doadores, mas a coordenação com os pobres que se beneficiarão. E depois temos que coordenar entre os doadores, para que haja coerência.

 

P- Em nível da União Européia costuma-se falar sobre a necessidade de melhor coordenação de doadores. Como funciona isso dentro das instituições multilaterais? O senhor está satisfeito com isso?
R-
Bom, a coordenação sempre pode ser melhor. Penso que melhorou significativamente nos últimos anos, através da Declaração de Paris (acertada em março de 2005 entre cem chefes de governo, presidentes de agências e outros altos funcionários).
No FIDA trabalhamos com uma ampla gama de sócios em países e comunidades incluem governos, organizações não-governamentais, organizações baseadas na comunidade e os próprios habitantes pobres das zonas rurais.

 

P- Que mensagem para os pobres o senhor espera que surja da conferência mundial sobre mudança climática que acontecerá em dezembro em Bali?
R-
Espero que haja uma forte mensagem dizendo que nos preocupamos com a difícil situação dos pobres das áreas rurais, que vemos suas necessidades não somente para a adaptação, mas que também os vemos como fortes sócios para a mitigação e que seu trabalho e seu potencial são reconhecidos.

(Por Ramesh Jaura, IPS, 10/10/2007)


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