Os efeitos socioeconômicos da mudança climática estão sendo tão devastadores que a única maneira de impedir a catástrofe é inventar uma nova sociedade, afirmou hoje o prêmio Nobel de Física de 1984, o italiano Carlo Rubbia. "Estamos de acordo com o diagnóstico: estamos em estado crítico. É preciso criar uma nova sociedade", afirmou Rubbia, um dos 15 Nobel reunidos em Potsdam para debater com 30 economistas e cientistas as conseqüências da mudança climática.
O encontro, aberto e apoiado pela chanceler alemã, Angela Merkel, chega ao fim amanhã com a adoção de um memorando para a Conferência sobre o Clima da ONU, a ser realizada em dezembro na Ilha de Bali, na Indonésia. Rubbia, que previu uma "revolução energética", argumentou que a solução para o problema criado pela mudança climática é econômica, política, moral e científica. Para ele, não basta somente reduzir as emissões nocivas, mas também desenvolver um modelo energético novo.
"Precisamos de novas fontes de energia abundantes e baratas. Eu, pessoalmente, só vejo duas: a energia solar e a nuclear", afirmou Rubbia, abrindo com isso um debate polêmico. Ele explicou que se trata de energia "sem proliferação e sem enriquecimento de urânio, já que as reservas de urânio são limitadas, e a energia nuclear, como sabemos, pode ser obtida por fusão ou fissão".
Tanto as usinas de energia nuclear existentes hoje em dia quanto as bombas atômicas utilizam o processo de fissão nuclear, que divide o núcleo de um átomo. Já o processo de fusão nuclear ainda está em fase experimental, e consiste na união de pelo menos dois núcleos atômicos para a produção de um novo e único núcleo. O professor de Economia Paul Klemperer, da Universidade de Oxford, discordou de Rubbia em favor de outros modelos, como o mercado internacional de emissões e a criação de depósitos de dióxido de carbono (CO2).
Rubbia respondeu dizendo que a criação de um sistema transnacional de redes subterrâneas de armazenamento de CO2 duplicaria o custo da energia. Além disso, segundo ele, tal sistema traria sérios problemas de segurança porque "a quantidade de CO2 liberada em um simples vazamento seria suficiente para matar uma pessoa em quatro minutos". O italiano acrescentou que as energias renováveis desempenharão um papel importante, mas serão insuficientes porque "a demanda de energia avança em um ritmo frenético" e o desenvolvimento das mesmas é muito caro.
"Tenho 73 anos. Nesse tempo, a população mundial se multiplicou por quatro e o consumo de energia, por 16. Nada leva a crer uma mudança, pois a cada três segundos nascem três crianças no mundo", disse. O cientista mexicano Mario Molina, Prêmio Nobel de Química em 1995 por seus trabalhos sobre a camada de ozônio, constatou que a mudança climática é um fenômeno global que requer uma resposta global. "Os países em desenvolvimento têm que assumir responsabilidades e o mundo industrializado tem a obrigação de ajudá-los por meio de uma verdadeira política de transferência de tecnologia e de mais espaço no mercado internacional de emissões", disse Molina.
A vencedora do prêmio Nobel da Paz em 2004, a queniana Wangari Muta Maathai, participou por videoconferência e criticou a falta de condições dos países em desenvolvimento para lutar contra o impacto da mudança climática. Maathai reconheceu que essa carência vem acompanhada de uma falta de vontade política dos líderes africanos, apesar de a "África ser o continente mais vulnerável aos impactos ambientais" relacionados ao clima. Ela também defendeu ações eficazes contra o desmatamento e uma política de carbono "justa" e que respeite o direito "de todos" ao crescimento econômico.
O diretor do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC), Rajendra Pachauri, informou que divulgará no mês que vem o quarto relatório do painel, com informações novas e mais detalhadas sobre o impacto da mudança climática em regiões e setores econômicos. Robert Watson, ex-vice-presidente do Banco Mundial, disse que nenhuma das medidas em andamento contra a mudança climática será eficaz se os problemas estruturais não forem resolvidos.
"O mercado internacional de compra e venda de emissões - do qual só a União Européia (UE) participa por enquanto - não funciona porque é volátil demais e carece de incentivos", afirmou. Merkel, por sua vez, lembrou os compromissos da UE quanto à redução de emissões de CO2 e defendeu a urgência de chegar a um acordo internacional que substitua o Protocolo de Kioto.
A chanceler lembrou também que o G8 (grupo dos sete países mais industrializados do mundo e a Rússia) considerou na recente cúpula de Heiligendamm uma redução de 50% de suas emissões até o ano 2050. Entretanto, tal promessa foi considerada pomposa, mas irrelevante por alguns cientistas reunidos em Potsdam. "Quando os políticos querem fugir de um problema, montam estratégias a longo prazo, quando do que precisamos é exatamente o contrário: medidas a curto prazo com efeitos a médio e longo prazo", disse o professor de Oxford.
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EFE, 09/10/2007)