O resfriamento do leite nas pequenas fazendas produtoras poderia ser feito usando como combustível o biogás resultante do gerenciamento dos detritos dos próprios animais. Pesquisadores da Escola Politécnica da USP fizeram a análise técnico-econômica de três tipos de sistemas para o resfriamento dos tanques e constataram que o modelo mais adequado é um ciclo de refrigeração convencional que utiliza energia produzida por gerador elétrico com motor de ciclo Otto modificado para utilizar 100% biogás.
“Esta seria a opção mais adequada tanto para o produtor que ainda não tem um sistema de refrigeração como para aquele que quer substituir o uso da energia da rede elétrica convencional pelo biogás”, afirma o professor Flávio Augusto Sanzovo Fiorelli, da Escola Politécnica (Poli) da USP, orientador da pesquisa de mestrado do engenheiro Giancarlo Obando Diaz, apresentada ao Departamento de Engenharia Mecânica. As análises foram realizadas pensando-se no pequeno e no médio produtor, com rebanhos de até 50 vacas.
“Projetos de instalação de biodigestores para o gerenciamento adequado dos detritos animais atendem às orientações do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto, visando à redução das emissões de gases causadores do efeito estufa (GEE)”, afirma Fiorelli.
Foram analisadas, além do gerador com motor de ciclo Otto, outras três alternativas para o sistema de refrigeração: acionamento por energia elétrica comprada da rede de distribuição (configuração de referência), gerador com motor de ciclo diesel modificado para trabalhar com 60% de biogás e 40% de diesel, e a queima direta do biogás em um ciclo de refrigeração por absorção.
Adubo e refrigeração
Na configuração estudada (rebanho de até 50 vacas, com cada uma produzindo aproximadamente 20 litros), a produção diária seria de mil litros de leite. “O leite sai da vaca em uma temperatura de 35 a 36 graus Celsius (°C). Para a produção do tipo B, segundo a Instrução Normativa 51 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o leite deve ser resfriado, na própria fazenda, a 4°C em até 3 horas após a ordenha”, explica Fiorelli.
Por dia, esse rebanho produziria cerca de 20 metros cúbicos (m³) de esterco, detrito que seria colocado no biodigestor. “O tamanho do biodigestor varia de acordo com o tamanho do rebanho”, esclarece Fiorelli. O esterco passaria por um processo de digestão anaeróbica que dura cerca de 50 a 55 dias. No final, haveria o biogás e o resíduo sólido do processo (efluente). “O efluente poderia ser usado como adubo pelo próprio fazendeiro em substituição a adubos químicos ou então vendido.” Já o biogás (basicamente uma mistura de metano e gás carbônico) ficaria armazenado na parte superior do biodigestor até sua utilização. A energia produzida seria suficiente para manter o tanque refrigerado por 48 horas.
Créditos de carbono
O custo do biodigestor ficaria em torno de R$15 mil. Para a implantação do projeto, Fiorelli sugere que o produtor faça uma parceria com algum investidor interessado em gerar créditos de carbono para comercialização. “A cotação desses créditos em agosto de 2006 era de €10,00 a tonelada. A estimativa de geração de créditos de carbono com essa cotação é de R$45.000,00 durante a duração do projeto MDL, que é de dez anos. É importante destacar que esse cenário está mudando, pois as estimativas para o final de 2008 indicam que os créditos de carbono estarão valendo cerca de €20,00.”
De acordo com o professor, a análise técnico-econômica do engenheiro Giancarlo Obando Diaz é o primeiro passo necessário para a implantação do projeto. “A próxima etapa agora é instalar uma planta piloto em parceria com empresas interessadas, para validar esse resultado e analisar também outros cenários, como por exemplo, rebanhos menores, ou com outras configurações, como no caso de gado semiconfinado, por exemplo.”
Mais informações: (0XX11) 3091-9661 ou e-mail fiorelli@usp.br, com o professor Flávio Augusto Sanzovo Fiorelli
(Por Valéria Dias, Agência USP, 08/10/2007)