A Polícia Federal vai investigar os responsáveis pelo alto índice de queimadas em Mato Grosso, estado que registrou 9.259 focos de incêndios somente em setembro. Nesta semana, os incêndios florestais cobriram de fumaça várias cidades, inclusive a capital Cuiabá, cujo aeroporto internacional precisou ser fechado quatro vezes ao longo de dois dias seguidos em razão da baixa visibilidade. No interior, motoristas de cidades como Sinop e Alta Floresta precisam dirigir com os faróis acesos durante o dia.
A determinação para abertura de inquérito partiu do juiz federal Julier Sebastião da Silva. Ele entende que os dirigentes de órgãos ambientais podem ter cometido crime ao liberar antecipadamente as queimadas autorizadas na zona rural, o que teria provocado uma elevação descontrolada no número de focos de calor. Os produtores rurais usam as queimadas autorizadas como forma de preparar o solo para o plantio.
As queimadas estavam proibidas até o dia 25 de setembro, quando foram liberadas pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) com base em uma previsão de chuva que acabou não se confirmando, segundo a assessoria de imprensa do órgão. A partir da liberação, os incêndios florestais voltaram com força, culminando no último fim de semana, quando houve 1.498 mil focos no sábado e 1.100 no domingo. Com o agravamento do quadro, a Sema decidiu revalidar a proibição das queimadas até o dia 15 de outubro.
Os incêndios florestais estão ganhando força em razão da seca prolongada que atingiu o estado este ano. Durante todo o mês de setembro, choveu apenas cinco milímetros. No mesmo período do ano passado, as precipitações totalizaram 112 milímetros. A umidade relativa do ar tem permanecido abaixo de 30%.
Para o juiz, a omissão dos órgãos ambientais, principalmente a Sema, caracteriza crimes previstos no Código Penal e na Lei de Crimes Ambientais, como colocar em perigo a vida de terceiros, causar incêndio, prevaricação e omissão no cumprimento de obrigações relativas ao interesse ambiental. O juiz quer que a PF identifique quem, dentro da estrutura destes órgãos, cometeu tais crimes.
Para Julier da Silva, o estado "vive um desastre ambiental nunca antes visto", sem que o poder público tenha tomado qualquer providência para coibir os incêndios. Segundo o magistrado, ao liberar a queima controlada antes do início das chuvas, a Sema agiu com "deboche" com a população que sofre com a qualidade do ar.
A densa fumaça fez aumentar em 30% a procura por atendimento médico no pronto-socorro e nas policlínicas de Cuiabá. A maioria dos pacientes apresenta problemas respiratórios. Uma pesquisa do governo estadual mostra que a concentração de microorganismos em suspensão no ar está o dobro do que preconiza o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).
O secretário de Meio Ambiente, Luiz Henrique Daldegan, informou que não irá comentar a investigação da Polícia Federal. Ele disse que só irá se pronunciar depois de ser oficialmente notificado do inquérito.
(Por Anselmo Carvalho Pinto,
O Globo, 03/10/2007)