Em termos de política pública de ciência, o Proantar (Programa Antártico Brasileiro) está longe de ser uma prioridade. A constatação vem de uma avaliação ainda preliminar patrocinada pelo próprio governo. O documento, obtido pela Folha, mostra que o Brasil, nos seus primeiros 23 anos de atuação na Antártida, entre 1983 e 2005, investiu apenas R$ 25 milhões em projetos de ciência.
Isso é praticamente a mesma coisa que o Chile investe, apesar de a economia daquele país andino ter ainda uma dimensão diferente da brasileira --pela lista do FMI, o Brasil é o 10º PIB do mundo e o Chile o 43º. Ou bem menos que os chineses investem: R$ 11 milhões por ano só em ciência.
"Este é um estudo inicial, que será complementado nos próximos meses. O que foi feito, com base em documentos oficiais, foi um grande banco de dados sobre o programa antártico", disse Antonio Teixeira, do CGEE (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos), órgão de economia mista responsável por estudos e avaliações de grande vulto. O estudo sobre o Proantar foi encomendado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Na rubrica projetos de pesquisa costumam entrar gastos com pessoal, inclusive bolsas de estudo, com a viagem em si e com equipamentos e material de trabalho usados no dia-a-dia. A logística das campanhas brasileiras --gastos com navio, por exemplo, ou com a Estação Antártica Comandante Ferraz-- ficaram fora do cálculo.
O montante de R$ 25 milhões fica ainda mais real quando colocado lado a lado com um outro número. De acordo com a mesma avaliação, nesses 23 anos, que tiveram 22 expedições à Antártida, foram financiados 540 projetos.
Caso a divisão anual do orçamento fosse feita de forma eqüitativa entre os trabalhos, cada equipe científica teria recebido apenas R$ 2.012 para trabalhar.
Como uma onda Os gráficos do CGEE --o relatório, apesar de ainda não estar finalizado, foi recebido pelo ministro de Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende-- também mostra que a distribuição de verbas não seguiu um fluxo constante desde 1983.
Depois de um aporte importante de recursos nos dois primeiros anos do programa, da ordem de R$ 6 milhões, o orçamento ficou bastante baixo no período entre 1985 e 1990 (menos de R$ 500 mil por ano), quando ele voltou a subir.
Permaneceu abaixo de R$ 1 milhão nos anos 1990 e apenas mais recentemente entrou novamente na pauta governamental. Entre 2000 e 2005, foram investidos na ciência antártica quase R$ 10 milhões, na maior parte oriundos de um projeto do Ministério do Meio Ambiente para montar redes de pesquisa ambiental. Nos próximos dois anos, por causa do Ano Polar Internacional, outros R$ 8,5 milhões serão colocados no programa.
A análise do CGEE, por mais que mostre valores subnotificados --colaborações internacionais de grupos específicos, por exemplo, não foram rastreadas-, apresenta uma dimensão real dos recursos investidos na ciência antártica. Ela também mediu a produção científica gerada nas 22 campanhas. Diretamente, 1.300 trabalhos foram redigidos.
A biologia é a área mais beneficiada (48% da verba) e, por isso, a mais produtiva: tem 57% dos trabalhos, contra 30% das geociências, segunda colocada.
(Por Eduardo Geraque,
Folha de S.Paulo, 03/10/2007)