As relações entre biocombustíveis e o meio ambiente nortearam os debates da manhã dessa sexta-feira (28/09) da Conferência Nacional de Bioenergia (Bioconfe), promovida pela USP. Cientistas, representantes do setor industrial e do governo debateram os efeitos da bioenergia na prevenção do aquecimento global e estratégias para garantir que as novas fontes energéticas sejam sustentáveis e não tenham impactos negativos na saúde da população.
"O biocombustível é uma resposta rápida para reduzir as emissões de gás carbônico (CO2), pela disponibilidade agrícola, tecnológica e custo compatíveis com os do petróleo", afirmou o professor Emilio La Rovere, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. "Para estabilizar em 2,5 graus centígrados o aumento da temperatura global, será necessário reduzir as emissões de gases do efeito estufa à metade até 2050", alertou. Segundo ele, o Brasil tem potencial para reduzir entre 18% e 36% das emissões de poluentes com biocombustíveis até 2020, mas deve associar sua expansão a uma postura social e ambiental responsável. "Essa atitude pode superar inclusive as barreiras impostas ao etanol brasileiro no exterior".
Os efeitos do Programa de Redução de Emissões Veiculares (Proconve), do Governo Federal, na diminuição da mortalidade por doenças cardiovasculares e respiratórias foram ressaltados por Paulo Saldiva, professor da Faculdade de Medicina (FM) da USP. "Ainda há o desafio de reduzir as emissões causadas pelos veículos, responsáveis por 55% do material particulado emitido na atmosfera." Saldiva, coordenador do Laboratório de Poluição Ambiental da FM, lembrou que as populações mais pobres são mais vulneráveis aos efeitos da poluição nas grandes cidades. "O biocombustível não emite metais pesados e lança uma concentração menor de hidrocarbonetos aromáticos na atmosfera, evitando efeitos crônicos na saúde, mas há problemas como a queima dos canaviais, que deve acabar em São Paulo, mas não em outros estados".
ImpactosO programa de bionergia do Governo Federal prevê a ampliação da produção de biocombustível e a co-geração de 12.300 a 35.00 Megawatts de eletrecidade a partir do bagaço de cana nos próximos anos. O anúncio foi feito pelo diretor da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Clayton Campanhola, "Mas entre os problemas sócio-econômicos estão a falta de um zoneamento econômico-ambiental, a especulação em torno de terras para o cultivo de cana e as condições de trabalho envolvidas no corte manual da cana", disse Campahola, enfatizando que a coleta mecanizada eliminou 150 mil empregos, gerando apenas 30 em funções especializadas.
"A expansão da produção de biocombustíveis pode ajudar a regularizar a situação das propriedades rurais, mas há problemas como o excesso de resíduos da produção de álcool nos solos e as emissões ligadas ao transporte de álcool e implantação de plantas industriais", observou o diretor da ABDI, órgão do Governo Federal. Até 2017 as queimadas no estado de São Paulo deverão ser eliminadas. Segundo Alfred Szwarc, assessor da presidência da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), os produtores e o governo de São Paulo assinaram em agosto um Protocolo Agroambiental visando esse procedimento, que irá preservar matas ciliares e recursos hídricos.
Ônibus a etanolSzwarc também defendeu a utilização de ônibus movidos a etanol, uma tecnologia desenvolvida na Suécia. "Uma frota de 1.000 ônibus movidos a álcool eliminaria a emissão de 96 mil toneladas de CO2 por ano", calculou. Em outubro, um modelo do ônibus começará a ser testado pelo Centro Nacional de Referência em Biomassa (Cenbio), sediado na USP, com apoio da Unica, Petrobrás, produtoras de aditivos para álcool e montadoras de veículos.
O presidente da Bioconfe, Wanderley Messias da Costa, que coordenou o painel de debates, lembrou que a Amazônia não pode ser excluída do debate sobre os efeitos da expansão agrícola ligada à produção de biocombustível. "Existem grandes áreas com potencial agrícola na região, e o ecossistema local pode ser ameaçado pela ampliação de cultivos que deixarem as áreas da expansão da cana-de-açúcar", disse. "Há necessidade do zoneamento ecológico-econômico para disciplinar as atividades agrícolas, por enquanto só adotado nos estados de Rondônia e Mato Grosso".
(Por Julio Bernardes, da Agência USP/
Eco Agência, 28/09/2007)