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derretimento das geleiras aumento da temperatura
2007-10-01

Olhando à distância, parece óbvio. Como os termômetros da península Antártica, região mais setentrional do continente gelado, registraram uma alta média de 5C nos últimos 50 anos, as geleiras que existem ali teriam mesmo que derreter. Mas o que os cientistas não esperavam era a velocidade das mudanças, que acaba de ser identificada por meio de imagens de satélite. Em apenas cinco anos -entre 2001 e 2005- um grupo de 30 geleiras existentes na península Antártica, por exemplo, chegou a perder 4.000 m2 de área por ano em sua linha de frente, em média.

No total, o trabalho ainda inédito do glaciólogo Jorge Arigony-Neto, pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), analisou 184 geleiras da península Antártica entre 1986 e 2005. Elas foram divididas, geograficamente, em seis conjuntos. "Os dados mostram uma mudança grande de comportamento dentro do período de estudo. Era até certo ponto esperado, mas não tínhamos idéia de que as geleiras demorassem um tempo tão curto para mudar o comportamento", disse Arigony-Neto à Folha.

Entre as seis regiões geográficas analisadas, apenas uma registrou um aumento médio na linha de frente das geleiras entre 2001 até 2005. Mas, desde 1986, a perda de área de gelo, na mesma região, supera em muito o ganho registrado pelo sistema de análise desenvolvido pela UFRGS. Em todas as seis áreas, o balanço pró-aquecimento foi maior. As outras duas regiões que também registraram uma perda significativa de gelo têm, juntas, 54 geleiras. O decréscimo médio anual de área de neve nesses glaciares está próximo dos 100 m2.

"Existe mais gelo derretendo mesmo, por causa do aumento da temperatura", explica o pesquisador, que é do mesmo laboratório de Jefferson Simões, outro gaúcho que resolveu se voltar mais para o sul do que para o norte. Afinal, é mais perto. A estação brasileira na península Antártica está a 3.172 km do Chuí que, por sinal, está a 4.121 km de Boa Vista, em Roraima.

A dupla, entretanto, é categórica. Usar o termo "aquecimento global" para descrever o que ocorre no local não explica o tamanho da diferença regional no aumento de temperatura, em relação à média mundial. O que se pode extrair dos dados é que a península Antártica, uma parte pequena da Antártida, está mais quente. Nas contas de Simões, apenas 0,7% do gelo do planeta está derretendo, e a Antártida tem uma participação muito pequena nesse processo.

"Desse total, 0,08% é de gelo antártico", diz. Ele lembra também que o derretimento de gelo que já está sobre o mar não contribui em nada para o tão amaldiçoado aumento do nível médio do mar. "Não podemos esquecer o Princípio de Arquimedes", diz. "Icebergs gigantes [soltos], ao contrário do que diz o mito, não são evidências do aquecimento global."

Altitudes mais altas
Um outro parâmetro medido por Arigony-Neto também mostra que a produção de neve na península Antártica tem se reduzido bastante nos últimos 50 anos. Para isso, ele analisou a chamada linha de "neve seca" dos glaciares -a parte mais consolidada, que fica no alto das geleiras de formato tradicional, na costa, onde costuma cair a neve. O cientista percebeu que, em grande parte dos casos, essa marca está sempre mais alta.

Nessa análise específica ele estudou, também por meio de imagens de satélites, 97 geleiras, entre 1992 e 2005. Em 38 casos, apenas nos últimos cinco anos de análises, a linha seca chegou a subir mais de 10 metros a cada ano. "Existe todo um fluxo [de neve] que está maior", explica Arigony-Neto. Diante desse quadro, nem mesmo os dois glaciólogos gaúchos -que dizem ser os únicos do Brasil- conseguem fugir da obviedade manifestada pelo consenso global entre climatologistas. Até 2100, o nível médio do mar pode subir até 1 metro. Assim como o que ocorre na península Antártica, isso pode ter sérias conseqüências.

(Por Eduardo Geraque, Folha de S.Paulo, 01/10/2007)

 


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