Uma das diferenças positivas entre Lula e seus predecessores é a sensibilidade social, embora, como economistas já tenham sinalizado essa semana, o modelo econômico seja o mesmo e um dos piores. Além do mais é predador.
A sensibilidade social não se traduz apenas no Bolsa Família e no aumento do salário mínimo, fundamentais para a saída de milhões de brasileiros da linha da miséria, mas também em alguns programas estruturantes, poucos, mas de fundamental importância para a melhoria da vida dos brasileiros. Um deles foi a elaboração do marco regulatório para o saneamento ambiental brasileiro.
À época da Campanha da Fraternidade de 2004, "Água Fonte de Vida", em conversa com o então Ministro das Cidades, Olívio Dutra, na CNBB, já estava claro que haveria uma diferença fundamental entre os dois governos. Fernando Henrique, em acordo com o Banco Mundial e FMI, considerava o saneamento como despesa pública, ficando dessa forma, proibido o Brasil de investir em saneamento durante quase uma década. Mas saneamento não é despesa, é investimento. Para cada dólar investido em saneamento, se poupa quatro na área da saúde, segundo a ONU.
Uma vez estabelecido o marco regulatório, ainda que sujeito a todo tipo de corrupção e transtornos em sua operacionalidade, começa realmente um investimento planejado em saneamento no Brasil. A tese de Olívio era que o Brasil precisaria investir cerca de oito bilhões de reais por ano, durante vinte anos, para que o serviço de saneamento ambiental - abastecimento de água, coleta de esgoto, tratamento de esgoto, manejo de resíduos sólidos, controle das enchentes e controle de vetores - estive universalizado no Brasil.
Os investimentos começaram e o resultado também. Esses dias a boa notícia é que a mortalidade infantil começa diminuir com mais intensidade, fruto do acesso à água potável pelas populações que antes não tinham esse serviço essencial. Agora, os dados revelam que os brasileiros com acesso ao abastecimento de água saltaram de 82,3 para 83,2% em um ano. Portanto, se os investimentos forem firmes é possível sonhar um Brasil com água de qualidade para todos nas próximas duas décadas. As demais dimensões do saneamento ambiental precisariam ser muito mais cuidadas, sobretudo a coleta e tratamento dos esgotos. Atualmente, apenas 50% dos lares brasileiros têm coleta de esgotos e 80% dos esgotos coletados são jogados em bruto dentro de nossos rios. Claro, tudo ainda vai depender dos impactos do aquecimento global e da responsabilidade daqueles que ocuparem o poder.
Porém, é útil sinalizar que a população brasileira com mais dificuldade de acesso à água potável é a difusa no semi-árido. Mas aqui também os índices melhoraram graças às cisternas de captação de água de chuva. As duzentas mil construídas já têm efeito estatístico. Não há outra forma de abastecer essa população com água de qualidade. Se o governo trocasse a transposição pelo Atlas do Nordeste para o meio urbano e obras da Asa para o meio rural, o impacto seria fantástico.
Em meio a tantas notícias ruins e apreensões assustadoras em relação ao futuro da humanidade, o saneamento vem como a boa notícia.
(Por Roberto Malvezzi, Gogó*,
Adital, 20/09/2007)
* Agente Pastoral da Comissão Pastoral da Terra (CPT)