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transposição do são francisco
2007-09-27
Teólogo e escritor precursor da Teologia da Libertação aponta falhas no projeto
   
“Não é o povo que precisa da transposição do São Francisco, e sim, o grande agronegócio”. A crítica, feita ontem pelo teólogo e escritor Leonardo Boff, antes da cerimônia de posse do Conselho de Segurança Alimentar da Bahia (Consea-Ba), no Instituto Anísio Teixeira (Paralela), poderia entrar e sair dos ouvidos, caso viesse de um dos adversários obstinados do governo Lula. Mas saiu da boca de um entusiasta. Não um qualquer, daqueles para quem a ideologia partidária pode se sobrepor aos ideais. 

Aos 69 anos, Leonardo Boff ainda mantém em alto grau a mesma lucidez que o tornou famoso nos anos 80, quando peitou o Vaticano em nome de suas crenças. Hoje, após mais de 60 livros publicados e depois do rompimento formal com a Igreja Católica em 1992, o ex-frade da Ordem dos Franciscanos, figura de proa da Teologia da Libertação, não tem mais sobre sua sombra a ameaça papal do voto de silêncio imposto em 1985 e tentado durante outras tantas vezes. E por isso continua fazendo o que mais sabe: falar.

Cabelos brancos, tão fartos quanto a grande barba que lhe toma parte da face, Leonardo Boff veio a Salvador palestrar para representantes das 24 entidades da sociedade civil que passaram a compor o Consea-BA. Entre eles, membros de comunidades rurais e de pescadores, povos quilombolas e indígenas. Antes de discursar para a platéia no auditório do instituto, porém, falou a jornalistas sobre o que pensa acerca da fome, da indústria da seca, dos paradigmas da Igreja Católica, dos virtudes e de defeitos do governo Lula e, claro, da transposição do São Francisco.

Para o agora teólogo leigo, o projeto possui dois grandes defeitos. “Primeiro, não ter escutado as organizações sociais envolvidas, e sobretudo, as populações ribeirinhas, que conhecem o ecossistema local, o rio e suas possibilidades”, avaliou. Depois, critica Leonardo Boff, por ter ignorado pesquisas científicas que indicavam outras probabilidades, que não o desvio do curso do rio, para resolver os problemas gerados pela seca, que aflige o Nordeste brasileiro há muitas décadas. “O principal de tudo seria a revitalização”, salientou.




‘O próprio Vaticano me deu trégua’

Correio da Bahia - Falando em desenvolvimento sustentável em tempos de seca, nunca é demais lembrar algo que vem sendo vendido pelo governo federal como um grande propulsor para o semi-árido do Nordeste. O que o senhor acha da transposição do São Francisco? 

Leonardo Boff - Esta é uma discussão ampla. O governo tomou uma posição clara, mas creio que há uma insuficiência de base por parte dos que organizaram esse projeto. Primeiro, de não ter escutado as organizações sociais envolvidas, e sobretudo, as populações ribeirinhas, que conhecem o ecossistema, o rio e suas possibilidades, e que não foram suficientemente ouvidas nesse processo. Segundo, grande parte da comunidade científica, seja dos centros de pesquisa do Sul ou do nordeste, mostram que há alternativas muito mais baratas, que envolvem mais municípios e beneficiam mais pessoas, sem tocar no Rio São Francisco. Isso tudo foi praticamente desconhecido.


CB - Mesmo diante de críticas, porque o governo ainda aposta muito nessa idéia?

LB - Acho que o propósito do projeto é bom, mas as maneiras de se fazer isso podem ser muito mais eficazes e envolver mais gente. Ao mesmo tempo, é preciso submeter determinados assuntos a uma ampla discussão crítica. Por exemplo, quais são os principais favorecidos desse projeto? Na verdade, não é o povo que precisa da transposição do São Francisco, é o grande agronegócio. O primeiro de tudo seria revitalização. Acho que o foco principal dos empenhados na bacia é tratar o rio. O próprio bispo dom Luiz Cappio não é contra a transposição, e sim contra a maneira com que as coisas foram feitas e o destino que se dará a essas águas. Por isso, ele decidiu entrar em greve de fome.


CB - A Igreja católica retrocedeu ou avançou nos últimos anos?

LB - Acho que em termos internos, doutrinários, de certa maneira a Igreja retrocedeu. Ficou mais conservadora, voltada para dentro. Agora, em questões sociais, ela sempre foi atenta e extremamente sensível. Uma das teses básicas da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), desde o anos 50, é postular e exigir a reforma agrária, e apoiar todo movimento social que vem de baixo. Os sinais são claros. O MST nasceu da igreja, assim como os sem-teto e o Grito dos Excluídos, que hoje envolve milhões de pessoas nas ruas. As pastorais sociais também são exemplos. Nesses termos, a Igreja é bastante progressista, eu diria até libertadora, em nível mundial. Mas em termos de doutrina, não. Sobretudo em questões de disciplina, sexualidade, família e celibato, ela é conservadora e segue a linha mais internacional. 


CB - Qual o papel da Teologia da Libertação na consolidação da Igreja frente a questões sociais e aos pobres?

LB - Ela é uma teologia de referência para todas as igrejas que levam a sério as questões de justiça e dos pobres. As pastorais sociais têm como referência a Teologia da Libertação. Ela já não é mais tão visível como era antigamente, pois não está mais envolta em polêmica. Hoje, é um corpo normal, um dado da realidade, aceito e incorporado. Tanto assim que o papa (Bento XVI), quando veio ao Brasil, nem fez crítica à teologia. Ela, inclusive, continua viva e presente em todo o terceiro mundo, especialmente no Brasil, e orientou muitas das posições da Igreja a partir dos anos 60.


CB - Como o senhor absorve, hoje, a saída da Igreja?

LB - Participando de celebrações populares, de comunidades de base, grupos bíblicos, encontros e muitas das chamadas “místicas” que o MST faz sempre antes de uma grande reunião, trazendo aspectos religiosos e artísticos. Lamento, inclusive, que a Igreja oficial não reconheça essas expressões populares religiosas como verdadeiras expressões do catolicismo. Consideram coisas marginais, diferentes do que é prescrito por Roma. Acho que a Igreja oficial tem pouca flexibilidade, e essa é uma das razões pela qual está perdendo mais e mais fiéis.


CB - Tal participação religiosa nas comunidades de base lhe deixa muito próximo de seu trabalho enquanto sacerdote...

LB - Nunca deixei de fazer aquilo que fazia. No nível das bases, continuo batizando, casando, celebrando nas comunidades, quando falta padre, evidentemente, mas os padres são poucos hoje. Contudo, procuro fazer as coisas de forma mais comunitária, inserindo outras pessoas, e não apenas substituindo padres.


CB - O senhor ainda pensa no processo que sofreu no Vaticano?

LB - Considero isso coisa do século passado (risos). O próprio Vaticano me deu trégua, nunca mais prejudicou minha atividade teológica, minhas palestras e aulas que dou em universidades. O Vaticano considera o assunto fato encerrado. Nos respeitamos e não me sinto perseguido.


CB - Como o senhor vê a posição da Igreja frente a questões polêmicas, como legalização do aborto e contraceptivos. Há diálogo?

LB - A Igreja é muito rígida nessas doutrinas. Acho que ela devia ser menos mestra e mais pastora. O pastor sente a dificuldade do povo e se compadece com a dor alheia, em vez de insistir em doutrinas rígidas. A Igreja deveria formar consciência, criar pessoas espiritualmente adultas. Mas isso ela não faz. Tem uma atitude centralizadora, autoritária, patriarcal, machista.

(Por Jairo Costa Júnior, Correio da Bahia, 27/09/2007)


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