Segunda-feira (24/09), a Justiça Federal acatou a denúncia feita pelo Ministério Público Federal e irá processar os proprietários da Pagrisa - maior produtora de álcool no Pará - por manter 1064 trabalhadores em condição de escravidão.
Murilo, Fernão e Marcos Villela Zancaner serão responsabilizados com base em relatório feito pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho. Os trabalhadores - a maior parte deles, cortadores de cana - tinham condições de trabalho degradantes em instalações da empresa em Ulianópolis (417 km de Belém).
O grupo móvel afirma em seu relatório que os trabalhadores estavam presos à propriedade por terem contraído dívidas que não conseguiam pagar com os salários que recebiam.
No documento estão detalhadas as condições em que os trabalhadores eram mantidos: dormiam em alojamentos sem nenhuma estrutura; não recebiam água potável durante a jornada de trabalho e bebiam água quente e suja, tirada de um caminhão-pipa estacionado no canavial.
As instalações sanitárias eram precárias, sem qualquer higiene ou conservação. A baixa qualidade e estado de conservação dos alimentos e a preparação numa cozinha suja acarretou infecção gastrointestinal a muitos trabalhadores.
Para o MPF, a gravidade dos crimes cometidos pelos irmãos Zancaner justifica a aplicação da pena máxima de 15 anos de prisão. A análise de seis procuradores da República, pedida pelo MPF, considerou robustas as provas de "condições degradantes de trabalho e moradia, infligidas coletivamente aos trabalhadores braçais nas plantações de cana de açúcar".
De acordo com o advogado da empresa, entrevistado pelo jornal Folha de S. Paulo, não há provas concretas de trabalho escravo. Para ele, existiam problemas, como em qualquer empresa. A Pagrisa nega as acusações e diz que o MPF levou em conta apenas o relatório dos fiscais para fazer a denúncia.
FiscalizaçãoAs ações de fiscalização de combate ao trabalho escravo foram suspensas na última sexta-feira sob a alegação de pressão de senadores em favor da empresa. Ruth Vilela - secretária de Inspeção do Trabalho - em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, alegou "insegurança sobre as ações desenvolvidas pelo Ministério do Trabalho".
Na última quinta-feira (20), os senadores Jarbas Vasconcelos (PSDB-PE), Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Kátia Abreu (DEM-TO), Cícero Lucena (PSDB-PB) e Romeu Tuma (DEM-SP), integrantes da comissão externa formada para tratar do caso, visitaram as instalações da fazenda. Ao final da visita, porta-vozes do grupo declararam que as condições de trabalho na fazenda eram adequadas e colocaram em xeque o trabalho do grupo móvel.
Entidades do poder público e da sociedade civil envolvidas no combate ao trabalho escravo no Brasil reprovaram a manobra de um grupo de senadores que tenta deslegitimar a atuação do grupo móvel de fiscalização do trabalho do governo federal.
No próprio Senado, a postura do grupo de parlamentares foi criticada. Em comunicado oficial, o senador José Nery (PSol-PA), presidente da Subcomissão Temporária do Trabalho Escravo, foi incisivo: "Na contramão do esforço nacional contra o trabalho escravo, a Comissão Externa do Senado optou por um alinhamento incondicional aos interesses da empresa denunciada, sem que houvesse a pluralidade exigida pelo caso".
(Por Charles Nisz,
Amazonia.org.br, 25/09/2007)