O Irã permaneceu ontem o assunto central no primeiro dia de pronunciamentos na 62ª Assembléia Geral das Nações Unidas. Enquanto o presidente da França, Nicolas Sarkozy, e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, atacaram em seus discursos o programa nuclear do país, o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, anunciou que considera essa questão "encerrada". Ele se referia ao acordo fechado no mês passado entre o Irã e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), pelo qual Teerã se comprometeu a explicar os pontos obscuros do seu projeto nuclear.
"As potências arrogantes acusaram repetidamente o Irã, fizeram ameaças militares e impuseram sanções ilegais (...). Mas hoje, por causa da resistência da nação iraniana, a questão voltou à agência [nuclear da ONU] e eu anuncio oficialmente que, na nossa opinião, a questão nuclear do Irã está encerrada e se tornou um assunto ordinário", disse. Portanto, prosseguiu Ahmadinejad, o país decidiu "negociar a questão através do canal legal apropriado e não levará em conta as imposições ilegais e políticas" do Conselho de Segurança (CS) da ONU. Desde o ano passado, o Irã está sob sanções econômicas do CS, que exige que o país suspenda seu programa de enriquecimento de urânio.
Os EUA e a União Européia não deram, por enquanto, seu aval ao acordo entre o Irã e a AIEA, o que tem sido um motivo de fricções com o diretor da agência, o egípcio Mohamed El Baradei. Argumentam que Teerã pretende ganhar tempo até produzir urânio enriquecido para ser usado como combustível de bombas. O Irã diz que seu programa tem fins pacíficos. Antes de Ahmadinejad discursar, o francês Nicolas Sarkozy disse da tribuna da ONU que "não haverá paz no mundo se a comunidade internacional der provas de fraqueza diante da proliferação de armas nucleares". Referiu-se ao Irã e disse que, se aquele país construir a bomba, "deixaremos que a estabilidade da região e do mundo corra um risco inaceitável".
Para Sarkozy, "essa crise só será resolvida se combinar a firmeza e o diálogo". Horas depois, a alemã Angela Merkel disse que "ninguém pode ter a mínima dúvida sobre a natureza perigosa" do programa nuclear iraniano: "Se o Irã obtiver a bomba nuclear, as conseqüências serão desastrosas -primeiro e acima de tudo para a existência de Israel, depois para toda a região e em última instância para todos nós na Europa e no mundo". O Kuait, cujo representante não estava escalado para discursar, entrou indiretamente na discussão por meio do xeque Jaber Al Sabah, ministro da Defesa e do Interior. Afirmou que o emirado não permitirá que o seu território, onde há bases militares americanas, seja utilizado para atacar o Irã.
Só uma vez
Em seu discurso, Ahmadinejad não mencionou nenhuma vez os EUA. Referiu-se sardonicamente "a uma certa potência" e a acusou de todos os males -desde a dessacralização das mulheres até a instabilidade geral do Oriente Médio.
"Infelizmente os direitos humanos têm sido amplamente violados por certas potências, especialmente aquelas que fingem ser seus defensores", afirmou. Citou Guantánamo, sem dar o nome da prisão.
O presidente americano, George W. Bush, que fez o segundo dos 27 discursos programados, só citou uma vez o Irã, ao colocá-lo, ao lado da Belarus, Coréia do Norte, Síria e Cuba, como países em que "os povos sofrem debaixo de ditaduras". Não incluiu os aliados Paquistão e Arábia Saudita. A delegação americana fez o possível para ignorar a presença de Ahmadinejad na ONU.
(Folha de S.Paulo, 26/09/2007)