Raimunda Monteiro alerta para “explosão urbana” decorrente de aumento do preço da terra; assessor jurídico do Iterpa destaca importância do auto-reconhecimento para populações tradicionais
As ações governamentais de combate ao desmatamento está muito centrada nos efeitos, e pouco nas causas. É o que afirmou Raimunda Monteiro, Instituto Florestal do Pará (Ideflor), na quinta-feira (20/09) no II Encontro Nacional dos Povos das Florestas, em Brasília. Ainda segundo Raimunda, há hoje uma crise das áreas de conservação, com conseqüente encarecimento das terras que permanecem no mercado.
A pesquisadora explicou que, com o estabelecimento de áreas de reserva, os territórios que sobram de propriedade do pequeno agricultor começam a ser muito valorizados, pois são os únicos que podem ser vendidos. Essa valorização acaba gerando a mudança desse produtor para a cidade, e, para ela, em breve desencadeará uma “explosão urbana”.
Aliado a isso, Raimunda coloca as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, como grande atrativo para essas mãos-de-obra migradas do campo. E salienta: “Nós, sociedade, não conseguimos encontrar ainda uma estratégia produtiva”.
A pesquisadora também destaca que “a matriz de desenvolvimento da Amazônia ainda é uma modernização baseada na fronteira agropecuária e madeireira, alavancando setores da construção civil ou de serviços”, como as grandes empreiteiras presentes na região, por exemplo.
Outro problema é que as populações locais têm uma baixa produtividade, segundo Raimunda. “Os grandes produtores rurais do sul e do sudeste chegam cheios de maquinário e invadem a região onde os produtores ainda estavam de enxada”, detalha.
Por outro lado, a pesquisadora pondera que não se pode exigir que comunidades tradicionais tenham um empenho exigido pelo mercado: “temos que entender melhor do que estamos falando, se a comunidade realmente quer se projetar no mercado. Há um grande desconhecimento dos potenciais dos territórios ainda no Brasil, dos recursos, do capital social”, exemplifica.
“A gente pensa muito nas reservas extrativistas produzindo para os mercados dos Estados Unidos, da Europa. Temos de pensar nas reservas produzindo para as cidades e seus entornos”, conclui.
Auto-reconhecimentoNo mesmo debate, o assessor jurídico do Instituto de Terras do Pará (Iterpa), Girolamo Treccani, afirmou que a auto-reconhecimento é uma conquista dos indígenas e dos quilombolas na demarcação de suas terras. Para ele, é fundamental garantir aos povos e comunidades tradicionais acesso ao seu território.
Treccani também destaca a importância da mobilização da população para impedir a revogação desse direito constitucional, que, segundo ele, é cogitada por alguns membros do Poder Legislativo. O auto-reconhecimento está previsto no decreto 4887/2003.
O assessor também ressaltou que dos 1500 planos de manejo protocolados no governo até hoje, apenas 30% foram aprovados: “será que não dá para fazer uma força-tarefa em favor das populações tradicionais?”, questiona. Comentando a abordagem da mídia em relação aos quilombolas, o pesquisador afirma que “estamos presenciando um massacre do que é ser quilombo no Brasil”.
Território“O capital não precisa mais cercar nada. Ele diz “tudo é meu”. As comunidades é que estão cercadas”. A constatação é do pesquisador da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Jean Pierre Leroy. Para ele, há uma ligação vital entre os povos e os locais onde vivem: “O território dos povos é um território que cria raiz. Não é para o lucro, o crescimento, é para viver”.
O pesquisador destaca a importância de as políticas públicas não serem somente compensatórias, mas construídas a longo prazo, e finaliza: “de nada adianta investir muito dinheiro nas reservas de forma rápida. Será inútil se não for acompanhado de um processo de desenvolvimento sustentável.
(Por Eduardo Paschoal,
Amazonia.org.br, 20/09/2007)