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2007-09-20
Em uma simultaneidade vista como uma espécie de competição, a Organização das Nações Unidas e os Estados Unidos realizarão duas cúpulas sobre mudança climática no final deste mês. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, realizará um encontro de líderes mundiais no dia 24 em Nova Yorque, enquanto o presidente George W. Bush convidou 20 “dos países mais contaminadores do mundo” para uma reunião nos dias 27 e 28 em Washington.

“Creio que a decisão dos Estados Unidos está muito equivocada, porque debilitará o processo multilateral” relativo ao Protocolo de Kyoto, afirmou a ambientalista Sunita Narain, diretora do Centro para a Ciência e o Meio Ambiente, com sede em Nova Délhi. Esse tratado foi assinado em 1997 e está em vigor desde 2005. “Não creio que os Estados Unidos, o maior contaminador do mundo, que tem sido uma nação renegada, tenha o direito de convocar semelhante reunião. Não tem um papel de liderança neste jogo”, disse Narain à IPS.

Consultado se a cúpula patrocinada por Washington vai reduzir a importância da cúpula da ONU sobre o mesmo tema, Anwarul Karin Chowdhury, ex-subsecretario das Nações Unidas para os Países Menos Adiantados, disse que se a agenda sobre mudança climática pretende ser significativa, tem de haver “pleno compromisso dos Estados Unidos”. Mas, destacou que a iniciativa norte-americana pode contribuir com avanços na agenda caso esta cúpula mantenha uma perspectiva. Como da reunião em Washington participarão apenas alguns países, “teria sentido acontecer antes da reunião das Nações Unidas”, disse Chowdhury à IPS.

O resultado destas deliberações poderia ser um insumo substancial para as deliberações da ONU. “Inverter as datas seria uma boa idéia”, acrescentou Chowdhury, ex-embaixador de Bangladesh junto às Nações Unidas. Disse, também, que seria útil que estes assuntos estruturais, dos quais se espera implicações substanciais, sejam seriamente considerados na preparação destas duas iniciativas-chave sobre a mudança climática.

Embora os países convocados para a cúpula dos Estados Unidos sejam em sua maioria nações industrializadas, Bush também estendeu o convite à China e Índia, considerados dois dos maiores contaminadores do mundo. “Deixei muito claro que o governo indiano não deveria participar, porque dessa forma estaria dando credibilidade a um processo que é imoral, equivocado e ilegítimo”, disse Narain. Consultado se a Índia vai participar, respondeu: “Quem pode rejeitar um convite dos Estados Unidos? Iremos. É certo. Mas, somo suma democracia e tenho o direito de dizer ao meu governo que não concordo”.

A cúpula de Washington leva o nome de “Reunião das principais economias sobre segurança energética e mudança climática”, enquanto a da ONU é conhecida oficialmente como “O futuro em nossas mãos: Abordando o desafio da liderança na mudança climática”. Há duas semanas, 44 chefes de Estado e 26 chefes de governo (de um total de 192 membros da ONU) foram listados para falar nas Nações Unidas. A reunião foi convocada pelo secretário-geral, para quem a mudança climática será uma prioridade de sua agenda durante seu mandato de cinco anos à frente da instituição mundial.

Consultado se a reunião da ONU deveria acontecer só patrocínio da Assembléia Geral e não do secretariado geral, Chowdhury disse que, como único organismo global que em geral adota um enfoque integral na abordagem dos desafios que a humanidade enfrenta, é necessário o compromisso da ONU em matéria de mudança climática. Os Estados-membro têm de se unir para acertar uma ação individual, bem como coletiva, para curto e longo prazos, acrescentou.

“Embora tenha sido iniciada pelo secretário-geral, teria mais sentido se a reunião de alto nível ocorresse no formato da Assembléia Geral”, acrescentou Chowdhury. A Carta da ONU prevê tais acordos, prosseguiu, dizendo que, “no final, são os países-membros que adotarão e implementarão as decisões finais”. Em abril, o Grupo dos 77, formado por 130 países, que é a maior coalizão de nações em desenvolvimento, criticou uma decisão do Conselho de Segurança de realizar reunião de um dia sobre a mudança climática.

O embaixador do Paquistão, Munir Akram, atual presidente do G-77, disse que a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável 2002 atribuiu responsabilidades nesse tema à Assembléia Geral, ao Conselho Econômico e Social, à Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável, ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, à Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática e ao Protocolo de Kyoto. “Mas, “não se previu nenhum papel para o Conselho de Segurança”, disse Akram.

Essa reunião foi presidida pela então secretária de Relações Exteriores da Grã-Bretanha, Margaret Beckett, em um momento em que a presidência rotativa do Conselho de Segurança estava nas mãos desse país. “Freqüentemente, a Grã-Bretanha não estuda detidamente o que deseja. E é muito egoísta”, disse Narain. “Creio que foi um passo muito bobo remeter isto apressadamente ao Conselho de Segurança - sem nenhuma consulta, sem nenhuma compreensão das implicações políticas – simplesmente para que a chanceler britânica pudesse levar os méritos”, acrescentou.

“E o próprio governo britânico nunca cumpriu seus compromissos. Está se atrasando em relação ao Protocolo de Kyoto. Se o levar realmente a sério, deverá por em ordem sua própria casa”, ressaltou Narain, que também dirige a Sociedade para as Comunicações Ambientais na Índia e recebeu o Premio Internacional da Água de Estocolmo 2006. Narain disse que, na cúpula do Grupo dos Oito países mais poderosos realizada na cidade escocesa de Gleneagles, em julho de 2005, o governo britânico decidiu que assumiria a liderança em questões climáticas.

Mas,o que o ex-primeiro-ministro Tony Blair fez foi tentar que Índia e China assumissem compromissos vinculantes legalmente para que ele pudesse ser amigo dos Estados Unidos. A mudança climática nunca teve um perfil elevado devido à reticência de Washington em colocá-la na agenda, acrescentou Narain. Inclusive, durante as cúpulas do G-8 realizadas nos últimos anos, Washington deixou muito claro ao país anfitrião:” Se for mencionada a palavra (que começa com) C não viremos”.

Narain acredita que a cúpula da ONU é uma iniciativa muito boa de Ban Ki-moon para proporcionar uma liderança em matéria de mudança climática, embora o processo de negociações ocorra sobe a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática. Neste momento, “o que precisamos é de atenção de alto nível para o problema da mudança climática, e uma articulação de que o contexto de trabalho sobre o mesmo funcionará somente se for justo”, ressaltou.

Em sua carta a 20 chefes de Estado, Bush diz que os Estados Unidos estão comprometidos em colaborar com outras importantes economias para se acertar uma contribuição detalhada para um novo contexto de trabalho global até o final de 2008, o que contribuiria com um acordo global ao abrigo da Convenção das Nações Unidas sobre a Mudança Climática até 20099. Na reunião de Washington, “buscaremos um acordo sobre o processo pelo qual, até o final do próximo ano, as principais economias estabeleçam um contexto de trabalho para depois de 2012 que possa incluir um objetivo global de longo prazo, objetivos e estratégias definidas nacionalmente e enfoques baseados em setores para melhorar a segurança energética e reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa”, acrescentou.
(Por Thalif Deen, IPS, 19/09/2007)


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