Belo Horizonte será sede, até sábado (22/09), de um festival nacional que tem como tema o lixo e a cidadania. Ao lado de discussões, debates e palestras na Estação do Conde, no Centro da capital, serão apresentadas iniciativas e propostas importantes para ajudar a resolver alguns dos principais desafios urbanos, entre eles a destinação dos resíduos sólidos, a conscientização das comunidades sobre coleta seletiva e o papel dos catadores nesse processo. A partir de quinta-feira, uma intensa programação cultural, com apresentações musicais e oficinas artísticas, promete animar a sexta edição do evento, aberta terça-feira.
A primeira conferência de desta quarta-feira – Desafios para o desenvolvimento com emancipaçã – analisa as questões relacionadas aos resíduos sólidos urbanos, entre eles a terceirização dos serviços de coleta porta a porta, a inclusão social dos catadores de materiais recicláveis e o contexto socioeconômico brasileiro no qual estão inseridos. À tarde, serão debatidos os direitos da população de rua nas grandes cidades e a necessidade de revitalização urbana, como forma de garantir o acesso e a permanência das pessoas nos espaços.
Segundo o coordenador do 6º Festival Lixo e Cidadania, José Aparecido Gonçalves, o objetivo do encontro é reunir representantes de diversos setores para, juntos, debaterem a destinação do lixo nas cidades. “Vão se sentar à mesa integrantes do poder público, de universidades, da sociedade civil, de movimentos sociais que defendem os catadores de papel e os moradores de rua, empresários e pessoas do terceiro setor para uma discussão ampla sobre as alternativas à atual política de gestão dos resíduos sólidos. Esse intercâmbio de experiências, aliado a oficinas práticas, exposições e feiras, fortalece o diálogo entre as partes e funciona como ponto de partida para vivermos num mundo mais sustentável”, disse Aparecido.
O Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis prepara, ainda para este ano, um estudo para identificar quantas pessoas vivem da coleta de lixo no estado, mas um levantamento feito pela regional Minas do movimento apontou que só na Região Centro-Sul da capital há cerca de 2 mil catadores. “Desde 1993, BH tem um diferencial que é ouvir as reivindicações da categoria. Precisamos estreitar esse diálogo com a preocupação de encontrar caminhos que ajudem no desenvolvimento das cidades e no crescimento profissional dessas pessoas”, afirmou um dos coordenadores do movimento, Luiz Henrique da Silva.
Superação
Com os 800 quilos de papel que carrega nas costas todos os dias, Valdeci da Silva, de 38 anos, sustenta a família de nove filhos e descobre sempre um novo sentido para a palavra cidadania. Depois de viver 18 anos como morador de rua, o catador comemora a compra da casa própria e deposita na profissão a esperança de um futuro diferente. “O trabalho é muito pesado e cansativo, mas é isso que dá dignidade à minha vida. Hoje, me considero um profissional como qualquer outro e tenho orgulho de ter esse reconhecimento por parte da sociedade. Cidadania para mim é não precisar roubar e saber que o meu sustento sai do meu próprio suor”, disse.
Integrante da Associação de Catadores de Papel, Papelão e Material Reaproveitável (Asmare), desde a sua fundação, em 1990, Valdeci começa a sua rotina antes mesmo de amanhecer e, num carrinho de madeira, recolhe o que consegue de lixo reciclável. No galpão da Asmare, no Bairro Barro Preto, na Região Centro-Sul de BH, ele separa sete tipos de materiais que são repassados à associação. “Não conheci meus pais e vivi até os 14 anos de idade com uma família que me adotou. Depois disso, fui morar na rua e tive meu primeiro filho aos 15. Nessa época, comecei a catar papel como forma de sustentar a criança e hoje tenho na coleta para reciclagem a minha profissão”, contou.
(Por Glória Tupinambás, Estado de Minas, 19/09/2007)