A desertificação, que afeta territórios habitados por dois bilhões de pessoas, é um problema econômico além de ambiental, disse à IPS Kanayo Nwanze, vice-presidente do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida). Nwanze participou da oitava sessão da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas de Luta contra a Desertificação, iniciada no dia 3 e encerrada na sexta-feira passada em Madri, com participação de dois mil representantes dos 191 países-membros e de organizações não-governamentais.
A seu ver, e mais além da profundidade dos acordos específicos, este encontro mostra que a Convenção, com a aprovação de um Contexto de Atuação e um Plano Estratégico Decenal, reflete “grandes iniciativas políticas’ que possibilitam ações como a do Fida, que em 25 anos investiu US$ 3,5 bilhões em zonas de terras áridas. A desertificação – acrescentou Nwanze – ameaça 40% da superfície da Terra, prevendo-se que até 2025, se as coisas continuarem como estão, mais de 2,8 bilhões de pessoas de 48 países sofrerão escassez de água ou problemas relacionados com ela.
Fazendo eco a esse problema, a Conferência decidiu criar uma Secretaria Executiva da Convenção e designou como seu titular Luc Gnacadja, ex-ministro do Meio Ambiente de Benin. “Ter uma secretaria executiva dará vida nova à Convenção”, afirmou Nwanze. Mais problemática é a aprovação de um Plano Estratégico da Convenção para a próxima década pois, como disse a ministra de Meio Ambiente da Espanha, Cristina Narbona, “nas cúpulas das Nações Unidas só fica acordado aquilo que nenhum país vota contra”, por isso depois da aprovação nesta Conferência terão de trabalhar duro para consegui-lo.
A idéia é que o plano tenha um programa de atuações concretas, com objetivos que possam ser quantificados, medidas adequadas para cumpri-los e um acompanhamento transparente e participativo. Para conseguir essa maior participação da sociedade civil, revelou Narbona, a Espanha obteve um acordo na União Européia para incluir essa proposta na agenda da próxima Conferência da Convenção e que na estratégia da década se estabeleça claramente “a importância da participação da sociedade civil”.
Esse acordo recebeu o apoio de representantes do Parlamento Europeu, que destacaram “a falta de compromisso e de resultados” demonstrada pela Convenção “desde seu nascimento” e pediram urgência na elaboração de “estratégias integradas de coordenação”, indicadores “para medir a efetividade de suas iniciativas” e um financiamento “por metas” para suas ações. No rascunho da Declaração de Madri consta a “necessidade de sinergias entre acordos de meio ambiente internacionais: mudança climática, biodiversidade e desertificação” e uma exortação para “melhorar a cooperação em níveis nacional, regional e internacional”.
Por outro lado, as organizações não-governamentais, que se reuniram motivadas por esta oitava conferência, agradeceram o apoio das autoridades espanholas e, em especial, de seus pares espanhóis, como a Assembléia de Cooperação pela Paz, Ecologistas em Ação, Fundação Ipade e WWF/Adena. Também destacaram “a necessidade de cumprir todos os compromissos assumidos até agora e a importância de ser dado um impulso definitivo e certeiro ao processo de implementação de medidas em favor do desenvolvimento sustentável nos territórios desertificados ou possíveis de sofrerem desertificação”.
Essa reclamação – explicaram – se deve ao fato de, “até o momento, a passividade e a inexistência de intervenção ser uma constante e esta situação alimentar a desilusão e frustração de todas as pessoas que diariamente lutamos ativamente pela melhoria das condições de vida e pelo desenvolvimento ambiental, social e economicamente sustentável das populações afetadas pela desertificação”. Essa passividade dos Estados e organismos internacionais, acrescentaram, afeta a segurança alimentar, aumenta a pobreza, dispara as migrações internacionais em grande escala, os conflitos intra-regionais, agrava a instabilidade social e a desigualdade de gênero e coloca em risco a saúde e o bem-estar de 1,2 bilhão de pessoas em mais de cem países.
Durante a Conferência, os representantes da sociedade civil propuseram esses temas, insistindo em elementos básicos para avançar na luta contra a desertificação, a mudança climática e a pobreza, a participação da sociedade civil, a igualdade de gênero e a adaptação à mudança climática. O secretário-executivo da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática (CMNUCC), Yvo de Boer, sem tirar a importância da desertificação, considerou mais grave a mudança climática. Segundo de Boer, “embora a excessiva extensão de pastagens, a demanda de água, o desmatamento e outras atividades afetem negativamente o meio ambiente, a mudança climática é a principal ameaça”.
Germán Rojas, responsável do Escritório de Informação para Espanha e Andorra da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), destacou ações que considera “êxitos” da Convenção, como “fazer progredir notavelmente o conhecimento cientifico sobre as complexas questões da desertificação” e o impulso à coordenação de ações. “Graças à Convenção, o novo conceito de desenvolvimento chamado “Gestão Sustentável de Terras” foi lançado no cenário internacional e se beneficiou de novos mecanismos de financiamento”, acrescentou. A Espanha, que em 2004 destinava à Convenção 160 mil euros (US$ 222 mil no câmbio atual) foi aumentando sua contribuição até chegar a 5,6 milhões de euros (quase 7,8 milhões) em 2007.
(Por Tito Drago, IPS, 17/09/2007)