Em março de 2008, o capitão Felipe Caire, 31 anos, e mais sete tripulantes entre educadores ambientais e engenheiros químicos esperam travar uma disputa contra a degradação no litoral brasileiro. A bordo de um veleiro de 15 metros, conhecido como Mistralis, a equipe passará nove meses e percorrerá 10.186km para promover conscientização ambiental em comunidades ribeirinhas e escolas públicas entre os Estados do Rio de Janeiro e do Ceará. O projeto inclui palestras, mostras de documentários sobre os efeitos do aquecimento global e oficinas de arte com materiais descartados, além de incentivo a fontes de energias renováveis.
Com essa expedição, Caire espera poder realizar mais do que em 2005, ano em que conseguiu colocar em prática um sonho de seu pai. A idéia da expedição Mistralis – Velejando e Conscientizando é falar para os povoados por onde passar sobre as conseqüências do aquecimento global na vida marinha e no próprio dia-a-dia das comunidades. Uma das causas principais da poluição e tema importante na viagem, é o lixo. "Em 2005, conseguíamos coletar 63 quilos de lixo , em 30 minutos de coleta num manguezal e com menos de 20 pessoas. Com esse material, os alunos das escolas da rede pública por onde passávamos, faziam murais e artesanatos. Dessa vez, além de fazermos os trabalhos realizados com sucesso há dois anos, iremos deixar em cada comunidade e escola visitada um agente multiplicador dos nossos ensinamentos que será monitorado pela nossa equipe", afirmou o capitão.
Para multiplicar o projeto, a equipe está formulando uma cartilha em parceria com as ONGs Supereco e Ondazul para formular uma cartilha que tratará das conseqüências do aquecimento global. "A maioria dos professores se mostra muito interessada em disseminar nossos ensinamentos, já que não há um estímulo do Estado. Nós iremos capacitá-lo e deixar com ele uma cartilha com dinâmicas de grupo a serem aplicadas nas turmas". Além disso, a equipe distribuirá o DVD do Greenpeace e do Inpe sobre as mudanças climáticas.
Mas a pesar de o programa de conscientização ser dirigido para as comunidades de pescadores, turistas inconscientes e condomínios de luxo são talvez a maior ameaça à preservação do ambiente marinho. Além do lixo deixado para trás por muitos visitantes das praias brasileiras, construções irregulares causam não apenas degradação, mas também exclusão social. " Os condomínios de luxo estão na maioria das vezes desrespeitando o limite entre a praia e o local próprio de construção. Isso é um absurdo! Em Morro de São Paulo (BA), por exemplo, os moradores locais foram praticamente obrigados a venderem suas casas e irem morar em Gamboa, um local afastado de Morro. Foram ameaçados por ricos que viram o potencial do turismo naquela região. Mas isso é apenas um exemplo do que acontece na costa do Brasil", relatou Caire. Apesar da triste constatação, e seguindo a regra de que os interesses dos mais fortes são mais fortes do que a necessidade dos pequenos, a equipe se torna um espectador dessa realidade e tenta fazer sua parte. "Não temos força política para resolver esse problema. O que podemos fazer é sensibilizar a população da possível ameaça de uma exploração do turismo", afirma o capitão da equipe.
Já para a engenheira química da expedição, Constance Pinheiro, 24 anos, a questão principal gira em torno do tratamento dispensado à água . "A principal causa da degradação marinha depende muito do local, mas o despejo de esgoto sem tratamento é agravante. O Brasil consegue tratar água com grande abrangência, mas o tratamento de esgoto é "esquecido" e ele vai direto aos rios. O próprio lençol freático consegue ser degradado por infiltração de biocidas na agricultura, por exemplo". Constance espera que com a expedição de 2008, ela e sua equipe possam levar não apenas conscientização para as comunidades ribeirinhas, mas também novos hábitos de consumo. "Acredito que as pessoas com quem iremos travar contato (comunidades ribeirinhas) podem evitar e muito as conseqüências do aquecimento global mudando pequenos hábitos. Não serão elas que vão reduzir emissões de CO2, mas são elas que não vão poluir. Elas não vão deixar outras pessoas que cheguem, poluam... Vão saber escolher seus consumos. Não que ali sejam locais com oferta extrema de produtos industrializados. Mas, por exemplo, pode-se reduzir o uso de plásticos, não aceitando sacolinhas plásticas no comércio e escolhendo produtos com menos embalagem". Além desses problemas, Caire e Constance apontam para a erosão costeira, o desequilíbrio no ecossistema marinho, a desertificação e o branqueamento dos corais. A partida do veleiro Mistralis será feita do Iate Clube do Rio de Janeiro, no bairro da Urca.
(Por Por Samira Menezes,
Envolverde, 14/09/2007)